Órgão tem se recusado a assumir atribuição; insalubridade e falta de assistência são desafios para comunidade Filhos dessa Terra
O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação civil pública para que a União seja obrigada a incluir a aldeia multiétnica Filhos dessa Terra, em Guarulhos (SP), no Subsistema de Atenção à Saúde Indígena. A medida permitirá o acesso da comunidade ao atendimento prestado pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), vinculada ao Ministério da Saúde. Hoje, os moradores da aldeia enfrentam várias dificuldades para obter assistência médica e vivem em permanente risco de contrair doenças devido às péssimas condições sanitárias no local.
Além da inclusão formal da aldeia no subsistema de saúde, o MPF pede que a União, por meio da Sesai, seja obrigada a disponibilizar, imediatamente, um agente indígena de saúde e um de saneamento para atendimento exclusivo da comunidade. A ação requer ainda que a Justiça Federal imponha à União o dever de implementar serviços de água e esgoto na aldeia, com conexão à rede pública de abastecimento, coleta e tratamento ou instalação de módulos sanitários.
A aldeia Filhos dessa Terra localiza-se em uma área de mata fechada próxima ao bairro Cabuçu, em Guarulhos. O local reúne mais de 20 famílias de seis etnias diferentes – Kaimbé, Pankararé, Pankararu, Tupi-Guarani, Fulni-ô e Wassu Cocal. Desde o período da pandemia de covid-19, o MPF vem buscando soluções extrajudiciais para o abandono da comunidade. No entanto, o ajuizamento da ação tornou-se inevitável diante da resistência da Sesai em assumir suas atribuições para atuar na aldeia.
Conforme argumenta o MPF, a Sesai tem procurado se eximir da responsabilidade com base em alegações inconstitucionais e ilegais. Segundo a secretaria, o atendimento à Filhos dessa Terra seria uma incumbência da Prefeitura de Guarulhos, porque a comunidade está inserida em uma área urbana, abrangida por serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) vinculados à administração municipal. A justificativa, porém, desconsidera que o ordenamento jurídico brasileiro não faz nenhuma distinção entre indígenas de acordo com a área onde vivem. Independentemente da localização das aldeias, todas têm direito ao atendimento diferenciado que a Sesai deve prestar, levando-se em conta as especificidades culturais e epidemiológicas para essa assistência.
“O entendimento da Sesai de fazer a distinção entre indígenas em área urbana (excluindo-os do subsistema de saúde) pode transmitir a ideia de que indígenas só mantêm sua identidade cultural se viverem longe das áreas urbanas, em aldeias e comunidades distantes, preferencialmente com pouco ou nenhum contato com a chamada ‘civilização’. O posicionamento transmite uma mensagem inadequada e em desacordo com os preceitos constitucionais”, destacou o procurador da República Guilherme Rocha Göpfert, autor da ação do MPF.
O número da ação é 5006849-14.2024.4.03.6119. A tramitação pode ser consultada em https://pje1g.trf3.jus.br/pje/ConsultaPublica/listView.seam.
Leia a íntegra da ação civil pública
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Arte: Secom/PGR