Parlamentares ligados ao agronegócio buscam boicotar e enfraquecer leis ambientais com a velha desculpa do desenvolvimento; movimentação põe em risco meta federal do desmatamento zero.
A investida de parlamentares contra leis ambientais segue de Norte a Sul do país. Em nova reportagem, a agência de notícia Associated Press destacou os esforços de pecuaristas e produtores de soja para se livrar das proteções legais do bioma amazônico. Ações podem colocar em risco as metas climáticas do governo Lula, como a redução das emissões de gases do efeito estufa e a meta do desmatamento zero até 2030.
No Acre, por exemplo, a Lei nº 4.396/2024, aprovada por unanimidade em agosto, permite a privatização de quase 900 km² de floresta protegida – uma área do tamanho da cidade de Nova York. O objetivo declarado é legalizar o status de pessoas que se mudaram ilegalmente para cinco unidades de conservação florestais, destaca a AP.
A nova legislação recebeu forte apoio do agronegócio. Assuero Veronez, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Acre, afirmou, durante um discurso no parlamento estadual, que “quanto mais floresta, mais pobreza”. Apenas a perspectiva das Áreas Protegidas (APs) virarem privatizadas fez com que os números de destruição disparassem no estado: de agosto a outubro, o desmatamento ilegal em quatro APs aumentou mais de três vezes em relação ao ano anterior.
Na vizinha Rondônia, Assembleia e governos locais buscam anular 11 Unidades de Conservação (UCs) e reduzir outras duas. Em Mato Grosso, autoridades têm dificultado a viabilização da Moratória da Soja. Em uma declaração, o governo estadual disse que encerrou os incentivos sob a moratória da soja porque o estado já aplica “as regulamentações ambientais mais rigorosas do mundo” e as empresas que violarem as leis nacionais enfrentarão penalidades, assim como aconteceria em outros países.
Outro projeto de alto impacto ambiental que tem ganhado força – inclusive do governo federal – é o Ferrogrão, uma malha de 933 km, prevista para ligar Sinop (MT), o berço nacional da soja, a Itaituba (PA), às margens do rio Tapajós.
Dez anos depois de ser oficialmente apresentada, com o maior projeto de infraestrutura de transportes do governo federal – estimado em mais de R$ 25 bilhões – “só serviu para produzir, até hoje, um comboio de impasses ambientais e administrativos, questionamentos jurídicos, pilhas de documentos, relatórios e teses sobre a abertura de uma nova ferrovia na Amazônia”, aponta O Eco.
O governo federal tentou buscar entendimento entre todas as partes: em outubro do ano passado, foi criado um grupo de trabalho para discutir o projeto com organizações civis, lideranças indígenas e comunidades impactadas pelo empreendimento. Mas, em julho, por meio de uma carta enviada ao Ministério dos Transportes, elas anunciaram a saída do GT.
“O que deveria ser um espaço de diálogo transversal e interministerial terminou esvaziado, sem que a Casa Civil enviasse sequer um representante a uma única reunião. E o que deveria ser um espaço de debates profundos terminou sendo um ambiente secundarizado e sem ressonância nos processos de tomada de decisão”, afirmaram as organizações.
A movimentação parlamentar para o enfraquecimento das leis ambientais também está a todo vapor no Paraná, com o Projeto de Lei 662/2024 do governador Ratinho Junior (PSD). O Estadão detalha que o texto retira o poder de deliberação do Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONSEMA), que tem participação da sociedade civil, e atribui a um órgão ou instituto estadual a competência para licenciar obras e empreendimentos com potencial de degradar o meio ambiente.
Ratinho Junior defende que o objetivo é “modernizar o trâmite dos processos de licenciamento ambiental por meio da redução dos entraves burocráticos e da uniformização de procedimentos administrativos”; enquanto ambientalistas falam em um “passar a boiada” estadual.
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Tom Vanhoof/Unsplash