MPF denuncia fazendeiro por aliciar e manter 21 trabalhadores em condição análoga à de escravo em MG

Vítimas nordestinas foram submetidas a alojamentos desumanos, jornadas exaustivas e servidão por dívida na colheita de feijão, batata e cebola

Ministério Público Federal em Minas Gerais

O Ministério Público Federal (MPF) apresentou denúncia à Justiça Federal contra um produtor rural da região do Triângulo Mineiro pelos crimes de aliciamento fraudulento de trabalhadores e redução de pessoas à condição análoga à de escravo. De acordo com a denúncia, pelo menos 21 trabalhadores foram recrutados com falsas promessas de emprego e submetidos a condições degradantes e servidão por dívida, entre maio e julho de 2017, na colheita de feijão, batata e cebola, em fazendas da zona rural de Santa Juliana (MG) e região. Os trabalhadores foram aliciados em estados do Nordeste do Brasil, como Bahia, Maranhão e Pernambuco.

O fazendeiro é acusado de aliciar e recrutar os trabalhadores mediante fraude, oferecendo falsas promessas de bons salários, alojamentos dignos e ressarcimento dos custos de transporte. No entanto, ao chegarem em Minas Gerais, o acusado não cumpriu as condições de trabalho prometidas, nem quitou o deslocamento entre os estados. As investigações apontam que a distância significativa entre o local de trabalho e as cidades de origem dos trabalhadores, com deslocamentos que poderiam passar de 24 horas, tornava o retorno inviável, especialmente diante da cobrança de valores por alimentação e equipamentos, o que dificultava o acúmulo de recursos e mantinha o ciclo de dependência.

Condições precárias – De acordo com o MPF, o denunciado submeteu os 21 trabalhadores a condições degradantes e jornada exaustiva de trabalho. A denúncia relata que as vítimas eram alojadas em barracos precários, sem higiene ou estrutura adequada, tendo que dormir no chão, em cômodos superlotados. As condições eram consideradas desumanas, visto que o banheiro estava estragado, com dejetos expostos, forçando os trabalhadores a lavar utensílios e roupas no mesmo lugar.

Além das condições de moradia insalubres, o labor era exigido em jornadas exaustivas, variando entre 11 e 13 horas diárias, sem folga, inclusive nos finais de semana. Também não eram fornecidos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), e luvas, quando solicitadas, eram vendidas e descontadas diretamente do salário dos trabalhadores.

Dívidas – Para o procurador da República Onésio Soares Amaral, autor da denúncia, o principal mecanismo para reter as vítimas e impedir sua locomoção foi o sistema de servidão por dívida, conhecido como “truck system”. A remuneração era realizada exclusivamente por meio de “vales” emitidos pelo próprio fazendeiro, sem valor monetário fora do seu controle. Esses vales deveriam ser obrigatoriamente utilizados em um mercado pertencente ao acusado, localizado “escondido” em sua residência, onde os produtos eram vendidos a preços superfaturados.

Como o denunciado se recusava a trocar os vales por dinheiro, esse sistema criou um ciclo de endividamento e dependência econômica que impedia o retorno dos trabalhadores às suas cidades. Depoimentos coletados pela Polícia Civil de Minas Gerais indicam que as vítimas, endividadas, chegaram a passar fome por dias.

O MPF denunciou o fazendeiro pelos crimes de aliciamento de trabalhadores (Art. 207, § 1º do Código Penal) e redução à condição análoga à de escravo (Art. 149, caput e § 1º, I e II do Código Penal), requerendo a condenação do acusado por 21 vezes em concurso material, de forma a serem somadas as penas, dada a quantidade de vítimas. O MPF também requereu a fixação de um valor mínimo para a reparação dos danos morais, solicitando cem mil reais para cada uma das 21 vítimas.

Arte: Secom/PGR

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