Inicialmente, quero clarificar os conceitos de cidadania que uso e seu sentido. Em democracia políticas reais sempre acaba sendo estabelecido, em suas constituições, um conceito político de cidadania, como sua única força instituinte e constituinte, base legal e jurídica dos direitos políticos iguais, em especial o de votar e com isto definir mandatos temporários para chefes de governos e legisladores, como seus representantes no Congresso. Fundamental, sem dúvida, mas insuficiente. Sempre é possível ter cidadania legítima clamando por democracia, sem ter nenhum reconhecimento constitucional/legal, como é o caso predominante de quem luta contra ditaduras e fascismos. E sempre haverá cidadania política para além do voto legalmente definido em democracias de qualquer tipo, das meramente eleitoreiras até aquelas de alta intensidade, de mais e mais democracia. Aliás, nunca podemos esquecer que o que diferencia democracias transformadoras de democracias de baixa intensidade é a cidadania ativa e se ela está em ação para buscar mais direitos iguais na diversidade, contra negações, exclusões, violações e invisibilidades existentes, assim como para não abdicar de seu direito intransferível de força instituinte e constituinte de votar e lutar por direitos e por políticas públicas voltadas aos direitos. (mais…)
conjuntura
Davos, Kiev e Brasília – o ocaso de um projeto. Por José Luís Fiori
A desconstrução de uma crença, um projeto e uma estratégia que se transformaram na bússola da política internacional dos EUA
“The institutions of the neoliberal project were designed not to liberate markets but to encase them, to inoculate capitalism against the threat of democracy, to create a framework to contains often-irrational human behavior” (Faroohar, R. After Neoliberalism, Nov/Dec 2022 https://www.foreignaffairs.com)
À primeira vista, o título deste artigo mistura coisas muito diferentes entre si, mas seu objetivo é demonstrar exatamente o contrário: que os acontecimentos das primeiras semanas de 2023, ocorridos nessas três cidades do “mundo ocidental”, têm uma relação muito grande entre si. Ou, pelo menos, têm tudo a ver com a desconstrução de uma crença, um projeto e uma estratégia que se transformaram na bússola da política internacional dos Estados Unidos, depois da sua crise no início dos anos 1970, em particular após o fim do Sistema de Bretton Woods e da derrota na Guerra do Vietnã, em 1973. (mais…)
O futuro chegou depressa. Por Boaventura de Sousa Santos
A convivência democrática vai ter de viver em paralelo com uma pulsão antidemocrática sob a forma de um golpe de Estado continuado, ora dormente ora ativo. Assim será até 2024, data das eleições norte-americanas, devido ao pacto de sangue entre a extrema-direita brasileira e a norte-americana. (mais…)
Crise climática e alienação. Por Michael Löwy
Ainda podemos sair do círculo infernal da alienação e retomar o controle da navegação e evitar uma tragédia
Somos passageiros de um novo Titanic. No entanto, ao contrário daquele de 1912, os oficiais e a maioria dos passageiros deste magnífico navio transatlântico estão cientes. Eles sabem que, se o novo Titanic continuar em seu curso atual, atingirá inevitavelmente um iceberg e afundará. O iceberg chama-se “Mudança Climática”. (mais…)
Entre Adversários e Inimigos. Por Cândido Grzybowski
Os graves atos de invasão e destruição dos espaços políticos centrais, símbolos de nossa institucionalidade democrática e de seus três poderes, no dia 8 de janeiro, em Brasília, precisam ser vistos no que são: uma afronta à democracia. Foi um choque que exigiu tomada de decisões firmes do Governo Lula e das instituições do Estado, sem hesitações, mesmo contra os seus tentáculos no próprio Estado. Afinal, o intolerável foi franqueado por inimigos da democracia. Tem que ser enfrentado como tal: um ataque à democracia. E o poder Judiciário precisa investigar e julgar, tanto os que agiram se autofotografando, o seu líder declarado, hoje “fugitivo” na Florida, como os coniventes ou omissos nas instituições do Estado e os muitos instigadores e financiadores da destruição. A justiça precisa ser justa, célere e até exemplar para dissuadir e desencorajar, pois democracia ameaçada se vive sempre no presente, julgando e condenando segundo a lei, sem conciliação. (mais…)
Aviso à navegação democrática. Por Boaventura de Sousa Santos
É de prever que se pretenda criar uma situação de ingovernabilidade que dificulte ao máximo a atuação do Presidente Lula
Ocorreu em Brasília no dia 8 deste mês, uma semana depois da posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um acontecimento que só tomou de surpresa quem não quis ou não pôde informar-se sobre os seus preparativos amplamente difundidos nas redes sociais. A ocupação violenta dos edifícios do poder legislativo, executivo e judicial e dos espaços circundantes, bem como a depredação de bens públicos existentes nestes edifícios por parte de manifestantes de extrema direita, configuram atos de terrorismo planejados e minuciosamente organizados pelos seus comandantes. (mais…)
A esperança exige ainda mais ação cidadã. Por Cândido Grzybowski
A democracia brasileira estava necessitando de um momento assim, carregado de esperança e energia democrática, como foi a festa da posse no dia 1º de janeiro e todo o processo vivido ao longo da semana que passou. Quase esquecemos que o inominável, um tipo novo de “fugitivo”, está escondido nos EUA. Até que foi bom. Com a sua vergonhosa ausência, abriu-se a possibilidade de criar a cena mais emblemática da posse. Um grupo pequeno representando o heterogêneo povão brasileiro subiu a rampa do Palácio da Alvorada com Lula e passou a faixa presidencial para ele, ao lado de Janja com a cachorra nos braços. Foi uma sinalização emocionante de mudança de rumo em direção da centralidade do cuidado com o povo em sua diversidade, como tarefa fundamental da democracia. (mais…)