Povos indígenas do Médio Solimões realizam ato público em Tefé (AM) na defesa do direito à terra

No Cimi

Centenas de indígenas de povos do Médio Rio Solimões e afluentes, no Amazonas, realizaram um protesto no final da última semana como parte das ações da Mobilização Nacional Indígena contra os retrocessos apresentados pelo interino Michel Temer no trato com a política indigenista estatal. O ato ocorreu na praça Remanso do Boto, município de Tefé. Entre discursos e danças rituais, os indígenas recolheram assinaturas para um abaixo-assinado pedindo às autoridades federais que os direitos aos povos conferidos sejam garantidos.

Faixas e cartazes traziam palavras de ordem contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que prevê a transferência das demarcações de terras indígenas do Executivo para o Legislativo, além do Marco Temporal. Essa última tese entende que só podem ser demarcadas terras cujo o povo que a reivindica esteja sobre ela, ou em disputa, a partir da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988.

As lideranças indígenas demonstraram em seus discursos o entendimento de que as violações aos direitos originários tomaram uma proporção ainda mais preocupante com a tomada do poder da presidente Dilma Rousseff pelo seu vice, Michel Temer. A bancada ruralista fiou o processo de impeachment em aberto, e agora cobra a conta de Temer que sinaliza para atender as demandas do latifúndio. Entre elas está a mudança no procedimento de demarcação tal como desejam os ruralistas. Os indígenas foram diretos: caso seus direitos não sejam garantidos, eles irão declarar guerra até que sejam respeitados.

A mobilização foi organizada pela União dos Povos Indígenas do Médio Rio Solimões e Afluentes, que representa mais de 14 mil indígenas de 17 povos distintos e distribuídos em nove municípios da região. Lideranças indígenas mais concentradas em Tefé, Alvarães e Uarini, dos povos Kambeba, Kokama, Tikuna, Kaixana e Madjá também contribuíram para a realização do ato ao lado de organizações indigenistas, caso do Conselho indigenista Missionário (Cimi).

Semanas antes, as lideranças indígenas, caciques e pajés se reuniram em Tefé para um encontro sobre os problemas locais enfrentados pelas aldeias. Muito do discutido nessa reunião serviu de base para o ato público. Leia o Documento Final do encontro na íntegra:

DOCUMENTO FINAL

Nós, lideranças indígenas dos povos Kokama, Kambeba, Miranha e Tikuna, localizadas nas aldeias Porto Praia de Baixo, Nossa Senhora de Fátima do Lago do Catuá, Boará de Cima, Boarazinho, Barreira do Meio, Barreira de Cima e Nova Esperança do Arauiri, das terras indígenas Boará/Boarazinho, Porto Praia de Baixo, Nossa Senhora de Fátima do Lago do Catuá e Barreira da Missão, reunidos nos dias 24 e 25 de junho de 2016, na aldeia Porto Praia de Baixo, Terra Indígena Porta Praia de Baixo, Tefé, Amazonas, com o objetivo de discutir os principais temas relacionados as questões indígenas e políticas públicas de maior relevância para os povos indígenas do município de Tefé.

Em vista do cenário de retrocesso e de ataques sistemáticos aos direitos dos povos indígenas naquilo que diz respeito as políticas públicas e principalmente aos direitos originários, os povos fazem resistência e buscam se articular e fortalecer em sua luta, proporcionando momentos de debates, encontros e assembleias.

Tendo em vista a morosidade do Governo lidar e efetivar as políticas públicas, principalmente a demarcação das terras indígenas, colocando as comunidade sujeitas a todo e qualquer tipo de violência, como perseguição, ameaças, invasão e conflitos com madeireiros, coletores, pescadores e caçadores.

Contudo, a partir das discussões e socializações, apresentamos nossas demandas e reivindicações as instituições/órgãos responsáveis.

TERRA INDÍGENA

1. Informação e capacitação sobre legislação para as lideranças;

2. Realizar capacitações para os indígenas sobre fiscalização;

3. Presença mais constante e efetiva da Funai na Terra Indígena/aldeias;

4. Colocar placas identificando as Terras Indígenas, principalmente naquelas de maior conflito.

5. Gestão compartilhada da área da RESEX Catuá – Ipixuna, com a aldeia Nossa Senhora de Fátima do lago do Catuá, mediando o conflito entre moradores das comunidades da RESEX, com os indígenas;

6. Mediação dos conflitos internos em algumas aldeias em processo de reconhecimento étnico e territorial;

7. Que a CTL Funai de Tefé, articule junto a CR Funai de Tabatinga a constituição do GT para dar continuidade ao processo de estudo daquelas terras indígenas que iniciaram o processo de demarcação, como também aquelas que solicitaram o pedido de reconhecimento étnico e territorial;

8. Queremos que, de forma imediata, os procedimentos de demarcação das nossas terras sejam iniciados e/ou retomados. Naqueles ainda sem providência, sejam nomeados Grupos Técnicos (GTs) para Identificação e delimitação. No caso dos procedimentos já instaurados, sejam retomados, respeitando os prazos definidos pelo Decreto 1.775/96, levando-se em conta os critérios que priorizam a ordem dos procedimentos de demarcação em relação ao contexto vivido pelas comunidades indígenas.

9. Exigimos medidas urgentes em relação à fiscalização de nossos territórios, para a desintrusão dos invasores e a consequente responsabilização destes por eventuais danos socioambientais.

10. Denunciamos a invasão de nossas terras por caçadores, coletores (açaizeiros e castanheiros), barcos pesqueiros e madeireiros, que argumentam que a área invadida não é terra indígena por não possui placas identificando a mesma.

EDUCAÇÃO

1. Exigimos a conclusão da construção da escola indígena da aldeia Porto Praia de Baixo;

2. Que a Coordenação de Educação Escolar Indígena de Tefé em parceria com os professores indígenas, elaborem um projeto para a FORMAÇÃO DOS PROFESSORES INDÍGENAS BILÍNGUE;

3. Elaboração do calendário especifico e diferenciado das escolas indígenas do município de Tefé;

4. Contratação de professores indígenas para atender as demandas nas salas de aulas das escolas indígenas de Tefé;

5. Dá continuidade na Construção do Projeto Politico Pedagógico (PPP) das escolas indígenas de Tefé;

6. Construção de escolas naquelas aldeias onde ainda não possuem, levando em consideração a demanda do povo;

SAÚDE

1. Que as reuniões do Conselho Local de Saúde Indígena – Polo Base da Barreira da Missão seja respeitada;

2. Que as politicas partidária não interfira nos trabalhos do Conselho Local de Saúde Indígena;

3. Que o regimento interno do CLSI Polo Base Barreira da Missão seja reorganizado/reestruturado com o apoio do CONDISI e das lideranças indígenas;

4. Que a equipe Itinerante cumpra corretamente o calendário de viagem e atenda a demanda daquelas aldeias ao qual é de sua responsabilidade;

5. Que a equipe Itinerante esteja com sua equipe multidisciplinar completa (médico e dentista), para atender as demandas das aldeias quando em suas viagens;

6. Que sejam realizadas formação e/ou capacitação para os Agentes Indígenas de Saúde – AIS;

7. Que o tema sobre droga e alcoolismo continue sendo trabalhado pela equipe de saúde, em parceria com as lideranças indígenas das aldeias;

8. Que as lideranças indígenas participem das reuniões do CLSI Polo Base Barreira da Missão;

9. Que as lideranças indígenas motivem e apoiem seus conselheiros locais de saúde indígena;

10. Que o CONDISI – MRSA apoie as reuniões e atenda as demandas encaminhadas pelo CLSI e pelas lideranças das aldeias do município de Tefé;

11. Parceria do CLSI Polo Base Barreira da Missão com a equipe da Coordenação de Educação Escola Indígena de Tefé nas viagens de articulações;

Nesse sentido, manifestamos que nossos direitos devem ser respeitados e que buscaremos forças e nos manteremos apostos para reivindicar a efetivação desses direitos legais, garantidos na Constituição Federal de 1988. Por fim, pedimos que nossas demandas sejam atendidas.

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