As desventuras do Super Moro e o Robim Hood de Jundiaí

Por Lucas Ribeiro Prado, no Justificando

Em uma época em que a realidade se confunde com a ficção e fazer uma análise de conjuntura se tornou árdua tarefa para cientistas políticos e economistas, se sobressai o papel do indivíduo na história. Nesse contexto, seres humanos se tornam super-heróis, dignos de histórias em quadrinhos e dois juízes expressam as contradições de uma sociedade caricata.

De um lado temos o Juiz do Trabalho Souto Maior, apelidado por seus críticos de Robim Hood, e tal qual a lenda, paira sobre ele a incógnita se seria um herói ou vilão. Este magistrado tem assumido a bastante tempo uma postura crítica em relação ao modo de produção capitalista, não no sentido de negá-lo, mas sim de reivindicar os fundamentos do Estado de Bem Estar Social como condição indispensável para elevação do patamar civilizatório.

Seguindo essa diretriz, tem introduzido novos conceitos na jurisprudência, atualizando a defasada, retrograda e ultrapassada Consolidação das Leis do Trabalho, como por exemplo o “dumping social”, mas inovações no sentido de ampliar a proteção dos trabalhadores são frequentemente taxadas de paternalistas.

Em geral são aceitas pelo mercado somente as modernizações que sirvam para flexibilizar direitos, como a incrível terceirização, uma verdadeira criptonita para os direitos trabalhistas. A CLT é vista pelos empregadores como uma grande ameaça, um catástrofe para o desenvolvimento econômico, um arco e flecha nas mãos de juízes como Souto Maior. Juízes que buscam consolidar o valor social do trabalho e a função social da propriedade privada como princípios fundamentais em nossa sociedade causam incômodo em parcelas significativas do empresariado nacional, que se vê afrontado por um magistrado de primeira instância que aplica sentenças fartamente fundamentadas, algumas até famosas, como a sentença em desfavor da Coca-Cola e do McDonalds, por exemplo.

Um juiz que se orienta sobretudo pelos postulados de direito internacional ratificados pela OIT, como seu horizonte utópico de um capitalismo mais humanizado. O Robim Hood britânico era um clandestino fazendo justiça com as próprias mãos, já o brasileiro é um juiz togado, buscando justiça social através da própria lei.

De outro lado, temos a figura de um salvador da pátria, o consagrado Juiz Sérgio Moro, estampado em bonecos como o Super Moro. Juiz coordenador da operação Lava-Jato, a maior operação de investigação de crimes de corrupção da história do país, inspirada na Operação Mãos-Limpas, da Itália, que teve como desfecho a eleição do Presidente Sílvio Berlusconi, um gangster típico dos quadrinhos de Frank Miller.

Depois de Joaquim Barbosa, único ministro negro na história do STF, que condenou a cúpula do PT na Operação Mensalão, o juiz Sérgio Moro foi proclamado o novo símbolo de moralidade do país, e melhor, um juiz branco, identificado com o perfil racial da elite brasileira. Bravamente engajado contra a corja de políticos corruptos, tem inspirado milhões de brasileiros a acreditar em um mundo mais justo e honesto.

Como não idolatrar um juiz que colocou no xadrez os empresários das maiores empreiteiras do país? Esse sim deveria ser o temor da elite brasileira! Um juiz honesto, com apoio irrestrito das massas, quase um stalinista. Entretanto, ele tem sido patrocinado por grupos empresariais que frequentemente são reclamadas na Justiça do Trabalho por inadimplência de dívidas de natureza alimentar, a exemplo da Editora Abril, Banco Itaú e Shell Brasil.

Estariam estas entidades realmente comprometidas com os interesses do povo brasileiro, ou apenas interesses de uma minoria plutocrata? Sérgio Moro transformou o judiciário num ringue, estilo WWF, em que vale tudo, para colocar fim na corrupção, uma missão hercúlea sem precedentes na história da humanidade.

Ocorre que tal qual nos quadrinhos, enquanto muitos consideram o Superman como um novo deus, há aqueles que consideram extremamente perigoso que haja um ser tão poderoso sem qualquer tipo de controle. Quem pode parar o Super Moro e a Lava-Jato, com suas indiscriminadas e seletivas quebras de sigilo bancários e telefônicos, vazamentos de delações premiadas e todo aparato investigativo dos Batmans da Polícia Federal? E se como na ficção o herói bonzinho estiver sendo manipulado pelo vilão, nesse caso, empresas petroleiras estrangeiras que promovem a corrupção em escala global, quem poderá nos salvar?

Por fim, cabe uma reflexão sobre a imparcialidade do Superpoder Judiciário, fantasiado de Liga da Justiça… Se a 3ª Vara do Trabalho de Jundiaí começasse a adotar os mesmos métodos que vêm sendo aplicados na 13ª Vara Federal de Curitiba contra empresas devedoras e seus sócios, quais seriam as reações? Afinal, um empregador que frauda verbas trabalhistas é tão corrupto quanto os investigados pelo Operação Lava-Jato.

Estamos vivendo uma perigosa inversão de valores: todos são iguais, mas uns são mais iguais que outros, a culpa passou a ser presumida, as redes sociais se tornaram verdadeiros Tribunais do Júri Popular, onde a mídia investiga, processa e julga pessoas arbitrariamente, e na ausência de provas, aplica-se de forma distorcida a teoria do domínio do fato. Ficou difícil saber quem são os verdadeiros vilões da história, somente a mobilização de cidadãos X-Men poderá mudar os rumos do país.

Lucas Ribeiro Prado é servidor público, bacharel em direito com atuação em movimentos sociais, militante da Consulta Popular.

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