Por Flávio Aguiar, no blog da Boitempo
Já tivemos 1968, o ano que não terminou (Zunir Ventura), 1958, o ano que não deveria terminar (Joaquim Ferreira dos Santos), 1958, o ano em que o mundo descobriu o Brasil (filme de José Carlos Asberg) e agora temos “2016, o ano que não deveria ter começado”, de Flávio Aguiar, com vários coadjuvantes: Eduardo Cunha, Michel Temer, José Serra, Sérgio Moro, Deltan Dallagnol, Aécio Neves, Rede Globo, coxinhas coiós, e muitos mais etcéteras, que assim vão ficar para a história.
2016 está sendo pior do que 1964. Quando há um golpe militar, os tanques vão na frente, atrás vem a tigrada (como se chamavam os repressores/torturadores de DOPS, DEOPS, DOI-CODIS, CENIMARES, etc.) e depois vem a caterva dos civis.
Nesta nova modalidade de golpe, inaugurada entre nós depois dos ensaios de 2000 em Washington (votação de 5 x 4 na Suprema Corte Norte-Americana elegendo Bush, the Second), Honduras e Paraguai, é a caterva que vai na frente.
Resultado: a confusão é total. Uma hora Renan cai, outra hora sobe, Moro é flagrado em convescote particular com Aécio Neves, revista diz que Temer é o homem do ano, Serra dá shows de gafes internacionais, policiais federais se orgulham de seu partidarismo, com ajuda de promotores e juízes, a presidenta do Supremo telefona ao presidente para acertar os relógios da quebra constitucional… Enfim, é o inferno astral do país. 1964 foi o ano dos gorilas, este é o ano dos macacos de fogo (calendário chinês). Já tivemos o ano (1978) dos Marimbondos de fogo, de José Sarney… segundo Millôr, um livro que quando você larga, não consegue pegar mais. Agora temos Anônima intimidade (2013), de Michel Temer, um livro que quando você quer largar, não consegue: ele não desgruda, é como pixe no sapato. “Incêndios/Tomam conta de mim/Minha mente? Minha alma/Tudo meu/ Em brasas/Meu corpo/Incendiado” – E o pior é que o Brasil vai queimando junto…
Como se não bastasse o golpe, a Leva Jeito de Fascio, o Temer, o Cunha, o FHC choramingando, o Serra de cotovelos afiados, o Aécio vomitando sorrisos, o Alckmin temperando seu xuxu, o Sartori degolando o Rio Grande, vieram o Brexit, o Trump, a morte do Fidel, e o Doria em São Paulo com seu sorriso Colgate/Palmolive…
Quando o Papa Gregório XIII instituiu seu novo calendário em 1582, o mundo pulou magicamente de 4 de outubro para 15 do mesmo mês. 10 dias (de 5 a 14 de outubro) foram simplesmente suprimidos. Fico assaltado por uma dúvida: me refugiar nestes dias que não existiram, o que equivaleria a um exílio para sempre, ou pedir ao Papa Francisco I que cancele o ano de 2016, fazendo-nos pular de 2015 para 2017, o ano do centenário da Gloriosa Revolução.
Como estou pensando seriamente em pedir asilo ao Vaticano (já que sou coroa posso me tornar coroinha), levarei a questão ao Sumo Pontífice que, nesta altura, é o mais proeminente governante de esquerda de todo o planeta. O temporal, o mores!
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Flávio Aguiar nasceu em Porto Alegre (RS), em 1947, e reside atualmente na Alemanha, onde atua como correspondente para publicações brasileiras.