Povos indígenas de RR cobram do ministro da Justiça cumprimento dos direitos indígenas e repudiam nomeação do atual coordenador regional da Funai em Roraima

Do Cir

Com o posicionamento de não aceitar mais nenhum retrocesso sobre os direitos indígenas e repudiando firmemente a nomeação do atual coordenador regional da Coordenação Regional da FUNAI em Roraima, Armando do Carmo Araújo, nomeado ao cargo no dia 6 de julho, lideranças indígenas, organizações indígenas, entidades indigenistas e sociais receberam na manhã de sábado, 8 de julho, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Torquato Jardim e o presidente [interino] da Fundação Nacional do Índio(FUNAI), o general Franklimberg de Freitas. O encontro ocorreu no auditório Lindalva Macuxi, na sede do Conselho Indígena de Roraima (CIR), em Boa Vista/RR.

Um encontro que durou três horas, serviu para que as lideranças indígenas de forma, precisa, cobrassem do Governo Federal mais respeito e cumprimento dos direitos indígenas conquistados na Constituição Federal de 1988, direitos garantidos na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e outras instâncias internacionais que garantem o direito dos povos indígenas.

Durante o encontro, lideranças indígenas regionais, professores, mulheres, Tuxauas, cobraram do ministro da Justiça, Torquato Jardim e do presidente [interino] da FUNAI, Franklimberg de Freitas, atenção especial aos povos indígenas de Roraima, sobretudo atenção aos povos indígenas do Brasil que tem vivido dias de pressão e insegurança com os direitos ameaçados.

Entre as lideranças indígenas, Dionito José de Souza, que pediu punição aos crimes e destruições cometidos pelo ex-ocupante da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, o vice-governador Paulo César Quartieiro. Como exemplo, citou o Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol (CIFCRSS), até hoje, com paredes destruídas e que aos poucos são reconstruídas pelas próprias comunidades indígenas, assim como a morte do líder indígena Aldo da Silva Mota, morto em 2003, tendo os acusados de assassinato absolvido no julgamento realizado em maio de 2012, pela Justiça Federal em Roraima.

O Tuxaua Pedro Macuxi, da comunidade indígena Guariba, região da Raposa, Terra Indígena Raposa Serra do Sol, falou sobre o direito de consulta que precisa ser respeitado pelas autoridades públicas, parlamentares, que entram nas comunidades indígenas com propostas de projetos sem respeitar o procedimento de consulta, bem como aprovando medidas sem ao mínimo de conhecimento dos povos indígenas.

Citou como exemplo, a recente nomeação do atual coordenador regional da Coordenação Regional da FUNAI/RR, Armando do Carmo de Araújo, um ato que demonstra total afronta e desrespeito aos povos indígenas de Roraima por parte do Governo Federal que acaba de nomear um coordenador regional sem o consentimento das comunidades indígenas de Roraima. A nomeação, publicada no Diário Oficial no dia 6 de julho, por meio da Portaria nº 1.032 não é aceita pelos indígenas.

“Nós temos direito de cobrar da justiça brasileira, porque nós também fazemos parte”, reforçou o Tuxaua, ao lembrar aos representantes do Executivo a atribuição de ouvir os povos indígenas e respeitar o direito à consulta.

A Secretária do Movimento de Mulheres Indígenas, Maria Betânia Mota de Jesus e o professor Zelandes Patamona, da região das Serras, também pediram atenção ao direito a seguridade social e educação através de uma carta destinada aos representantes Executivos. “Na oportunidade queremos dizer que o Estado brasileiro possui uma dívida imensurável junto a nós povos indígenas”, assim iniciaram a leitura pedindo que o Estado brasileiro não deixe e nem aceite a violação dos direitos indígenas duramente conquistados há 27 anos na Constituição Federal Brasileira.

“O legislativo brasileiro nos últimos vem atropelando de todas as formas os direitos indígenas, com projetos de leis, emendas constitucionais e demais proposições legislativas lideradas pela bancada ruralista, que só visam o interesse das empresas, do poder, do lucro e a ganância em benefício próprio”, trecho da carta lida pelos representantes indígenas, mencionando a PEC 215, PEC 187, PL 1610/96, PL 3729, PEC 287 e outras iniciativas declaradas anti-indígenas.

Após falas das lideranças indígenas, o presidente [interino] da FUNAI, o general Franklimberg de Freitas, também lembrado pelas lideranças indígenas que assumiu o órgão sem consulta aos povos indígenas, inicialmente, falou sobre o processo de transição do órgão indigenista, segundo ele. “Inicialmente, a nossa FUNAI está em uma transição, uma reestruturação que ainda não foi cumprida”, declarou o Presidente ao considerar que nesse processo houve perdas de condições para a atuação do órgão que atualmente atende uma população de aproximadamente 1 milhão de indígenas, conforme última estatística do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE).

A perda é no quadro de pessoal que na década de 1970, o órgão tinha 4.500 servidores e hoje, conta com um quadro de 2.142 servidores, número que dificulta o atendimento das demandas, principalmente, da demarcação de terras indígenas, segundo Franklimberg, também foi questionado pela demora na demarcação das terras indígenas.

Atualmente, são 438 terras indígenas demarcadas no Brasil, 110 em processo de estudo, além de 114 terras indígenas, que receberam determinação da Justiça para fazer “imediatamente” a demarcação, informou o Presidente [interino], alegando que não há recurso para tal ação devido os cortes Governo, inclusive, na FUNAI de 44% do orçamento.

Sobre o assunto da exploração de Turismo em terras indígenas, o Presidente [interino] informou que existe mais de 100 pedidos de comunidades indígenas de todo o Brasil, baseado na Nota Técnica da FUNAI, que regulamenta a exploração mínima para a geração de renda aos indígenas. Na ocasião, o presidente orientou que, se tiver comunidades indígenas com interesse na ação, pode procurar a coordenação de etnodesenvolvimento do órgão indigenista e apresentar o projeto de desenvolvimento sustentável, inclusive, o de exploração mineral, pois são projetos que a instituição “enxerga com bons olhos”.

Vale lembrar que a exploração mineral em terras indígenas é um assunto repudiado pelos povos indígenas do Brasil que lutam contra a proposta de lei 1610/96 de autoria do Senador Romero Jucá (PMDB/RR) e o relator, o deputado Federal, Édio Lopes (PR/RR) que a todo custo tentam aprovar o projeto que visa à exploração e aproveitamento dos recursos minerais em terras indígenas.

Também questionado sobre a fragilidade da FUNAI, bem como as extinções das Coordenações Técnicas Locais (CTLs), que tem desassistido as terras indígenas, principalmente, com a falta de fiscalização e monitoramento, atraso nas demarcações das terras indígenas, Franklimberg esclareceu que estão resolvendo a situação para tentar atender as demandas dos povos indígenas. Foram extintas 51 CTLs em todo o Brasil, e no estado de Roraima, a extinção das CTLs da Terra indígena Wai-Wai, Yanomami e Raposa Serra do Sol, no município de Uiramutã.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Torquato Jardim, um “advogado, professor de direito constitucional e cidadão”, como se identificou no início da fala, considerou como a primeira condicionante, a Constituição Federal Brasileira. “Os índios ganharam a Constituição, população original do Brasil, ganhou na constituição de 1988 uma proteção muito particular, essencialmente, o reconhecimento da sua historia, da sua ancestralidade, o seu direito inalienável de conviver, viver e transmitir a sua cultura ancestral, sua história, tradição oral, tradição de vida, a sua convivência íntima com o próprio meio ambiente”, considerou o Ministro, como primeira e grande condicionante dos povos indígenas garantidos na Constituição.

Torquato informou que em menos de 40 dias no Ministério na companhia do presidente [interino] da FUNAI já recebeu várias lideranças indígenas de 15 etnias diferentes e na ocasião, conhecendo as demandas do estado de Roraima. Como primeira percepção, viu a diversidade cultural, segundo Torquato.

 “Não estamos falando de uma cultura única, estamos falando de muitas culturas indígenas, pela peculiaridade cultural decorrente da sua ancestralidade, mas também, talvez, principalmente, em razão da geografia, do lugar onde vivem”, considerou o Ministro, lembrando os povos de Rondônia que, segundo ele, chamaram lhe atenção quanto à relevância de tornar efetiva a cláusula da Constituição que garante a eles a exploração da riqueza mineral do seu subsolo.

“Mas este é um trabalho técnico, cientifico, um trabalho empresarial, então a ajuda que eles precisam é certamente diferente de outras regiões, onde não há exploração mineral do subsolo a ser feita”, pontuou  o Ministro, tocando, novamente, no assunto da exploração mineral em terras indígenas e que, segundo ele,  “eles(povos de Rondônia) não querem que a exploração mineral seja feita por não índios”.

Sobre demarcação das terras indígenas, questionado em relação à demora das demarcações, disse que o processo é competência do Pode Judiciário e o Ministério não tem gerência sobre tal Poder muito menos sobre o Supremo Tribunal Federal (STF). “O que podemos fazer, em diálogo com vocês, apresentar algum estudo, memorial, ou manifestação, informal, porque o MJ não é parte do processo sobre a necessidades de vocês(indígenas)”, disse Torquato, alegando também que, muitas vezes, o que falta no Judiciário é informação.

Torquato disse que o direito à consulta está garantida na atual gerência do Ministério da Justiça e segundo ele, “é um direito universal e nem precisava da Convenção 169 da OIT”, porque é um direito do cidadão brasileiro.

Como desafio operacional da FUNAI e que reflete no MJ, o Ministrou pontuou que “precisam equilibrar as demandas e juntos, construir o que é de uso do direito ancestral a terra para se opor a sua vontade e aos que pensam de outra maneira”, enfatizou Torquato, dizendo que opor é convencer e em última instância ir ao Pode Judiciário.

O coordenador geral do CIR, Enock Barroso Tenente, manifestou o posicionamento do Conselho Indígena de Roraima (CIR) em relação à nomeação do atual coordenador regional da CR/RR. “O posicionamento do CIR é contrário a essa nomeação, não fomos consultados e temos isso como um jogo político, nada mais”.

Enock cobrou o cumprimento dos direitos conquistados na Constituição, como os mesmos, afirmaram em suas falas, mas que vem sendo desrespeitado pelo Estado brasileiro. “Vocês aqui, afirmaram que tudo é assegurado na Constituição e por que não cumprem”, questionou o coordenador.

Em relação a FUNAI, o coordenador questionou a demora do período de transição do órgão que, segundo Enock, “um período que nunca passa” e pediu “basta”. “Vamos começar a trabalhar, fazer as coisas de fato acontecerem nas comunidades indígenas”, reforçou o coordenador.

“O Governo Temer fala sempre que não tem verba, mas tem verba para dar emenda a parlamentares em de troca de apoio a ele”, lembrou Enock as últimas notícias de que o Presidente Michel Temer irá liberar emenda à parlamentares que votarem a favor da Reforma da Previdência e Trabalhista.

No encerramento, a Carta com as reivindicações foi entregue ao Ministro e Presidente da FUNAI. Confira a Carta ao MJ e Funai 08-07-2017.

Destaque: Tuxaua Pedro Macuxi pede ao ministro da Justiça, Torquato Jardim, e ao presidente interino da Funai, Franklimberg de Freitas. respeito ao direito à consulta dos povos indígenas. Foto: Mayra Wapichana

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