Mais de 75% das crianças e jovens migrantes para Europa sofrem abusos

No Diário de Notícias

Mais de 75% das crianças e jovens adultos que tentam migrar para a Europa atravessando o Mediterrâneo central são vítimas de abusos durante a viagem, denunciaram duas agências da ONU num relatório hoje divulgado.

A UNICEF, especializada nos direitos das crianças, e a Organização Internacional para as Migrações (OIM) estão particularmente preocupadas com o que acontece aos migrantes originários da África subsariana, neste relatório baseado em testemunhos de “cerca de 22.000 migrantes e refugiados, incluindo cerca de 11.000 crianças e jovens”.

“A pura realidade é que é agora comum as crianças que atravessam o Mediterrâneo serem vítimas de abusos, tráfico, espancamento e discriminação”, concluiu a diretora regional da UNICEF na Europa, Afshan Khan, em comunicado.

Segundo o relatório das duas agências especializadas das Nações Unidas, mais de três quartos (77%) das crianças e jovens migrantes que tentam chegar à Europa via Mediterrâneo central dão conta de “experiências diretas de abuso, exploração e práticas semelhantes a tráfico de seres humanos”.

“Eles utilizam palavras como ‘tortura, espancamento, assassínio, esclavagismo, tráfico, violação’, não como conceitos abstratos, mas como a sua realidade”, relatou a diretora da UNICEF em Bruxelas, Sandie Blanchet, em conferência de imprensa.

Aqueles que são originários da África subsariana “são muito mais suscetíveis a serem submetidos a exploração e tráfico humano do que os que vêm de outros pontos do mundo”, sublinha-se no relatório, que aponta “o racismo” como provável “fator subjacente” a esse tratamento diferenciado em função da cor da pele.

“A rota migratória do Mediterrâneo central é particularmente perigosa, com a maioria dos migrantes e dos refugiados a atravessar a Líbia, que continua a ser devastada pela ausência de lei, pelas milícias e pela criminalidade”, realça-se no documento.

Em média, os jovens migrantes pagam pela viagem “entre 1.000 e 5.000 dólares” (entre 835 e 4.170 euros) “e muitas vezes chegam à Europa endividados, o que os expõe a novos riscos”, precisam as agências da ONU.

A UNICEF e a OIM apelam a “todas as partes envolvidas”, tanto aos países de origem como àqueles por que os migrantes transitam e aos de destino na Europa, para que adotem medidas específicas para proteger estes migrantes particularmente vulneráveis.

As duas agências instam, nomeadamente, a que sejam criadas “vias seguras e regulares” para as crianças, a que “se encontrem alternativas à detenção” de crianças migrantes e a que “se combata a xenofobia, o racismo e a discriminação de que são alvo todos os migrantes e refugiados”.

“Devemos continuar a ficar chocados, tristes e revoltados”, defendeu o diretor da OIM para a Europa, Eugenio Ambrosi, alertando para um aumento do “cinismo” em relação aos repetidos relatos sobre os maus tratos sofridos pelos jovens migrantes.

Ambrosi exigiu também aos europeus uma melhor gestão das fronteiras, com especialistas com formação na área de guarda de menores, em vez de os tratar como “um inimigo potencial que atravessa ilegalmente a ‘sagrada fronteira'” da Europa.

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