Carta do I encontro da Juventude Xakriabá

“Não deixaremos que nos roubem a esperança.”

Na Apib

Nós, caciques, lideranças, pajés e juventude do Povo Xakriabá, juntamente com lideranças jovens dos povos Tupinambá e Pataxó da Bahia, comunidades Geraizeiras, quilombolas, catingueiros e apanhadores de flores, organizações aliadas CIMI, CAA-NM, IFET, UFMG e Articulação Rosalino Gomes de Povos e Comunidades Tradicionais , estivemos reunimos durante três dias no I Encontro da Juventude Xakriabá realizado na aldeia Imbaúba na Terra Indígena Xakriabá nos dias 17, 18 e 19 de outubro de 2017. Com o tema “Juventude Xakriabá: um pé na aldeia e um pé no mundo”, debatemos sobre temas como identidade, cultura, terra e território e protagonismo da juventude indígena com o objetivo de construir caminhos para o fortalecimento do projeto do Bem Viver.

Neste tempo, que reflete uma desconjuntura histórica de desestruturação das políticas indigenistas e sociais do Brasil, dedicamos um tempo para analisar e pensar nossas estratégias de luta e resistência frente a este contexto. Enfrentamos um contexto que revela uma estratégia perversa de desconstrução de nossa identidade, de dizimação dos povos indígenas e povos e comunidades tradicionais do Brasil.

Nestes dias reafirmamos:

– Nossos mais velhos, caciques, lideranças e pajés como pilares de nossa identidade, nossos livros vivos.

– A defesa de nossa identidade como resistência a um projeto de dizimação de um país multicultural.

– A manutenção e garantia de todo o nosso território ancestral, como condição de sobrevivência e sustentação de nosso modo de vida.

– A força de nossa ancestralidade, dos guerreiros que tombaram cujo sangue viraram adubo de nossa terra, sementes de luta, verdadeiros guias da nossa espiritualidade.

Denunciamos:

– A extrema morosidade e falta de interesse político com o processo de regularização dos territórios indígenas e quilombolas que geram clima de insegurança e medo para os povos.

– Diante do governo ilegítimo e golpista Michel Temer e  do congresso mais conservador após a ditadura miliar, repudiamos as 33  medidas anti-indigenas que tramitam na câmara e no senado, que incidem diretamente na nossa vida.

– A perversidade da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que atribui ao Congresso Nacional, grande parte financiado por aqueles que nos perseguem, o dever de demarcação dos nossos territórios originários;

– Repudiamos a tese do marco temporal que deseja limitar nossa história a data da promulgação da Constituição Federal. O marco temporal é uma proposta inconstitucional que afronta o nosso direito tradicional.

– Repudiamos as incursões da bancada ruralista para legalizar arrendamentos em terras indígenas, permitindo a exploração privada e o avanço do agronegócio sobre os territórios tradicionais.

– As ameaças e agressões sofridas por lideranças e famílias indígenas na área de retomada das Aldeias Várzea Grande e Caraíbas e a violência sofrida pela jovem Juvana Xakriabá durante o Grito dos Excluídos em setembro de 2015, até hoje impunes, tentativa de criminalizar e impedir a nossa luta pelo território.

– As constantes tentativas de enfraquecer nossos direitos a saúde e educação indígena, duramente conquistado a custa de muito suor e sangue dos nossos mais velhos e antepassados.

– A continuidade de vultosos subsídios para o avanço dos grandes projetos de criação de gado, monoculturas, mineração, associados com grandes obras de infraestrutura como a de barragens e hidrelétricas, provocando uma contínua desestruturação das economias e dos territórios das Comunidades Tradicionais, em particular nos cerrados brasileiros como o Projeto Matopiba, o que pressupõe um verdadeiro assalto contra a rica agrobiodiversidade e sociodiversidade brasileiras;

– A crescente criminalização de lideranças indígenas e de povos e comunidades tradicionais como forma de intimidar a luta.

– A lentidão da regularização dos territórios quilombolas e a ação em curso de desconstrução do decreto 4887, dispositivo que regulamenta a regularização do território das comunidades quilombolas.

– O fato de que, até hoje, as Comunidades Tradicionais não foram contempladas com um marco jurídico que reconheça e regularize os seus territórios;

– A criação de unidades de conservação de proteção integral, como os parques, sobrepostos a territórios tradicionais provocando a expulsão das famílias e povos de que sempre souberam conviver com a natureza de forma harmônica e sustentável;

Comprometemos:

– Em passos firmes, de mãos dadas e com a proteção dos nossos encantados, dar continuidade as lutas dos nossos antepassados pela demarcação e respeito aos nossos territórios tradicionais.

– Reafirmar a identidade e cultura Xakriabá, nossas armas de luta, como ferramentas de resistência a projetos que desrespeitam a autonomia dos povos indígenas.

– Cuidar da Mão Terra, como filhas e filhos que compreendem a relação fraterna e harmônica com a Natureza.

– Trabalhar pelo reinvolvimento sustentável na nossa terra, reafirmando nossa agricultura indígena, que resgata o paladar alimentar Xakriabá.

– Fortalecer a aliança de juventude dos povos e comunidades tradicionais, como espaço de construção coletiva que estreita os laços de solidariedade, unificação de lutas e sonhos para o Bem Viver

Aldeia Imbaúba, Terra Indígena Xakriabá, 19 de outubro de 2017

Comments (1)

  1. Esta preocupação com os jovens indigenas é muito importante.Voces fizeram algum documentario que a gente possa usar noutros encontros aqui?

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