Etapa 03 da Mineradora Anglo American Minério de Ferro Brasil S.A continua violando direitos humanos e constitucionais no Brasil

Movimentos sociais, ambientalistas e pesquisadores independentes denunciam a violação de direitos humanos, assim como impactos sociais, culturais e ambientais irreversíveis, causados pela empresa multinacional Anglo American Minério de Ferro Brasil S.A. O empreendimento Minas-Rio é composto por uma mina para extração de minério de ferro em uma extensão contínua de 12,25km, afetando uma área de cerca de 3.888 hectares nos municípios de Conceição do Mato Dentro, Alvorada de Minas e Dom Joaquim, no estado de Minas Gerais, Brasil.

O complexo minerário também abarca uma linha independente de transmissão de energia que percorre 10 municípios por cerca de 90Km, de Itabira à Conceição do Mato Dentro/MG; e uma adutora de água com captação no Rio do Peixe, no município de Dom Joaquim/MG. Encontra-se associado a um mineroduto de 525 km, que corta 33 municípios até o porto marítimo construído no município de São João da Barra, na localidade conhecida como Barra do Açu, Rio de Janeiro. Segundo informações do empreendedor, as outorgas de uso da água do empreendimento somam 5.957,67 m³/h, o que equivale ao abastecimento de 714.921 habitantes por dia, considerando a média de 200 litros/pessoa/dia- segundo dados de empresas públicas.

O empreendimento da Mineradora Anglo American Minério de Ferro Brasil S.A desde a sua concepção vem ameaçando os modos de vida de inúmeros grupos tradicionais. Além disso, impacta remanescentes de alto valor ecológico pertences ao Bioma Mata Atlântica, considerado um hot spot de biodiversidade abundante, do qual restam apenas 6% da sua extensão original no Brasil. A região afetada no Estado de Minas Gerais possui rico patrimônio natural, arqueológico e espeleológico, além de sítios urbanos, conjuntos arquitetônicos e paisagísticos, bem como significativo patrimônio imaterial, que se constituem em importantes referências culturais e atrativos turísticos.

Atualmente, encontra-se em processo de licenciamento a terceira etapa do empreendimento, referente ao Projeto de Expansão da Mina do Sapo, cujas Licenças Prévia – LP e de Instalação – LI serão votadas na próxima sexta-feira, dia 22 de dezembro. Movimentos sociais, ambientalistas e parte da população local denunciam as irregularidades e falhas no processo, também perpetuados nas etapas anteriores. As principais denúncias correspondem à desconsideração do universo dos atingidos, degradação e contaminação dos recursos hídricos, o não cumprimento de condicionantes e as ações de repressão, ameaças e violações de direitos da população afetada.

Processo de Licenciamento

Os vícios do licenciamento do empreendimento Minas-Rio remetem, primeiramente, à fragmentação do processo, licenciado em instâncias administrativas distintas: o complexo minerário em órgão colegiado do Estado de Minas Gerais; o mineroduto no órgão federal; o porto do Açu no órgão ambiental do Estado do Rio de Janeiro; o que subdimensiona os efeitos do projeto como um todo.

A concessão da Licença Prévia do complexo minerário foi dada em dezembro de 2008, apesar das graves falhas e da insuficiência dos estudos de impacto ambiental, sendo atrelada à centenas de medidas condicionantes, cuja execução nunca foi devidamente observada. A concessão da Licença de Instalação “Fase I” e “Fase II”, em dezembro de 2009 e 2010, respectivamente, evidenciou outra manobra de adequação do licenciamento às demandas da empresa: o alto número e a complexidade das condicionantes da LP ensejaram a fragmentação ilegal da LI em duas fases, sendo que primeira compreendia um conjunto menor e mais simples de medidas, o que permitiu à empresa acessar a licença de instalação ainda com centenas de condicionantes não cumpridas da licença prévia.

Em 2014, a Licença de Operação – LO foi concedida sem que o universo dos atingidos, tal como previsto na condicionante 45/2008 (fase da LP), fosse reconhecido. Condicionantes determinadas ao longo do processo não tiveram seu cumprimento efetivamente avaliado. Em outubro de 2015 e outubro de 2016 foram concedidas, respectivamente, a LP, concomitante com a LI, e a LO da segunda etapa do empreendimento (Otimização da Mina), a despeito das inúmeras condicionantes não cumpridas, negligenciadas em todo o processo.

Ainda em 2015 iniciou-se a apresentação de estudos para o licenciamento da terceira fase do empreendimento (Expansão da Mina). Em abril de 2017, cinco lideranças locais realizaram uma ação popular solicitando a suspensão de audiência pública referente à “etapa 3”, devido às poucas informações disponibilizadas sobre o projeto. Após a ação popular, esses atingidos sofreram agressões e ameaças diversas e passaram a integrar o Programa de Proteção dos Defensores de Direitos Humanos a pedido do Ministério Público do Estado de Minas Gerais – MPMG, tendo sido instaurado Procedimento Investigatório Criminal na Promotoria de Justiça da Comarca de Conceição do Mato Dentro, para apurar o caso. Além disso,  somente ao longo deste ano foram registrados 3 episódios de mortandade de peixes no Córrego Passa Sete, à jusante da barragem de rejeitos, que se somam a outros ocorridos nos anos de 2014 e 2015.

Atualmente está em processo de votação a concessão da LP + LI da “etapa 3” e permanecem, cumulativamente, a falta de respostas quanto ao universo dos atingidos e ao cumprimento de condicionantes, quanto à segurança da barragem de rejeitos, as ações de repressão, violação de direitos, ameaças à população atingida, e os sérios impactos no universo socioeconômico e cultural das comunidades situadas no entorno do empreendimento.

Para fundamentar a atuação do Ministério Público Estadual e do Ministério Público Federal – MPF no processo de licenciamento da “etapa 3”, pesquisadores de universidades públicas brasileiras – UFMG, UFJF e UERJ – consolidaram um estudo técnico acerca dos impactos socioambientais e violações de direitos em curso na região, e evidenciaram falhas, inconsistências e lacunas metodológicas no Estudo de Impacto Ambiental relativo à expansão da Mina, o que impossibilita uma avaliação tecnicamente fundamentada e responsável acerca da viabilidade do licenciamento da “etapa 3”. A construção teórico-metodológica do EIA cria mecanismos de desresponsabilização da empresa face aos efeitos do empreendimento, perpetuando irregularidades exaustivamente denunciadas nos processos de licenciamento anteriores.

As principais denúncias  são:

 1) A não identificação efetiva do conjunto de proprietários de terras, posseiros, arrendatários, trabalhadores, moradores e herdeiros atingidos pelo empreendimento e a desconsideração das características socioculturais das comunidades diretamente afetadas, que vêm embasando processos de negociação desiguais, realizados de forma individual e voluntária ao largo do licenciamento ambiental. Reivindica-se o reconhecimento de todas as comunidades atingidas em seu modo de vida e produção, considerando suas especificidades como grupo social e cultural, como condição para o prosseguimento do licenciamento;

2) O não cumprimento efetivo de condicionantes, em específico, aquelas relativas à reestruturação produtiva e fundiária, ao reassentamento e às indenizações cabíveis;

3) As ameaças,  constrangimentos, perturbações do sossego e do modo de vida das comunidades atingidas, devido ao trânsito intenso de veículos; ao barulho e às vibrações causadas pelo funcionamento do mineroduto e/ou por explosões nas obras de expansão; à presença de pessoas estranhas e de prostíbulos nas circunvizinhanças; a espoliação de propriedades, com a dissolução de vínculos sociais, econômicos e culturais entre as comunidades, gerando, além de insegurança, sérios obstáculos à sua reprodução sociocultural;

4) A piora significativa da qualidade das águas nos córregos à jusante do empreendimento, com assoreamentos, contaminações, mortandade de peixes e forte odor; diminuição da vazão e secamento das nascentes locaisinviabilizando o acesso e os usos fundamentais para o cotidiano doméstico e as atividades tradicionais que caracterizam o modo de vida das comunidades atingidas, como a  dessedentação de animais, a irrigação de hortas e plantios, a pesca e o lazer.  O nexo causal do Projeto Minas Rio na  profunda alteração na qualidades das águas foi objeto de destaque do  Parecer Ùnico do SISEMA 1375747/2017  (disponível na reunião do dia 11/12/2017- Pág.104) que informou a existência de laudo  técnico de mortandade de peixes ocorrida em 28/08/2014, fazendo referência também às análises de qualidade da água do córrego Passa Sete. O laudo aponta que:  “A morte de peixes foi causada por intoxicação, devido à introdução gradual de substâncias tóxicas no ambiente aquático pelo Projeto Minas-Rio, com a extração de minério de ferro e a formação de lagoa de rejeitos pelo represamento das cabeceiras do córrego Passa-Sete, agravada pela baixa vazão do curso d’água devido a um período de estiagem e desencadeada pela ocorrência de uma pancada de chuva no dia precedente”. O laudo relata que os monitoramentos realizados no córrego Passa-Sete mostram profundas alterações nas características físico-químicas da água à medida em que o empreendimento foi implementado;

5) As péssimas condições do ar, gerando problemas de saúde e impactos em atividades econômicas e de subsistência tradicionais, como a produção de polvilho, plantios e hortas;

6) O não-reconhecimento do risco ao qual estão submetidas as comunidades do Passa Sete, Água Quente e São José do Jassém, localizadas a 1,5 Km, 3 Km e 8 Km, respectivamente, à jusante da barragem de rejeitos. Ainda em relação às comunidades situadas à jusante da barragem, merece destaque o fato de o Parecer Ùnico do SISEMA 1375747/2017  (disponível na reunião do dia 11/12/2017- Pág. 282)  reconhecer  “a profunda alteração da qualidade das águas identificadas à jusante da barragem de rejeitos, no curso d’água denominado “Córrego Passa Sete”, que compromete os usos múltiplos do recurso hídrico de comunidades abaixo do barramento.”  O parecer ainda destaca que “Não se pode tolerar a extrapolação frequente dos limites legais estabelecidos na legislação vigente, que podem resultar em danos à saúde humana e à biota local”, situação que “tem repercussão na tutela ambiental administrativa, e até mesmo na civil e penal” (pag. 282).

7) As violações de direitos humanos, com pressões e formas de coação que implicam no exercício de uma violência difusa contra aqueles que reivindicam seus direitos, ou seus apoiadores.

 

Diante de tudo isso , exigimos que :

1.  O processo de licenciamento da Etapa 3 do Projeto de Expansão da Mina do Sapo, da Anglo American Minério de Ferro Brasil S.A. seja retirado de pauta e que todas as pendências de informações, estudos, controle ambiental e condicionantes sejam devidamente sanadas.

2.  Haja o reconhecimento de todas as comunidades atingidas em seu modo de vida e produção, considerando suas especificidades como grupo social e cultural, como condição para o prosseguimento do licenciamento.

3. Seja reconhecido como obrigação do empreendedor, garantido e realizado o reassentamento de todos aqueles que, diante da situação de risco e  insustentabilidade de suas vidas em razão do empreendimento minerário, terão que deixar seus territórios, segundo parâmetros estabelecidos no processo de licenciamento ambiental, única  medida e ação concreta capaz de efetivar o seu direito à continuidade e à recomposição de seu modo de vida.

4.  Sejam realizadas novas audiências públicas em Conceição do Mato Dentro, Dom Joaquim, Alvorada de Minas  após o processo de licenciamento ser devidamente instruído.

REAJA – REDE DE ARTICULAÇÃO E JUSTIÇA AMBIENTAL DO PROJETO MINAS-RIO

 

Apoiam :

Academia de Ciências Letras e Artes de Congonhas – ACLAC

Ação Franciscana de Ecologia e Solidariedade – AFES

Associação Alternativa Terrazul

Associação Brasileira de Antropologia- ABA

Associação de Conservação Ambiental Orgânica – ACAO’

Associação dos Acionistas Críticos, Alemanha

Articulação Internacional das Atingidas e Atingidos pela Vale

Associação Nacional de Ação Indigenista –ANAI

Brigadas Populares

Centro de Pesquisas em Etmologia Indígena CPE/UNICAMP

Coletivo Margarida Alves de Assessoria Popular

Comitê Nacional em Defesa dos Territórios Frente a Mineração

Comitê Povos Tradicionais Meio Ambiente e Grandes Projetos da Associação Brasileira de Antropologia/ABA

Comitê Quilombos da Associação Brasileira de Antropologia /ABA

Comissão Pastoral da Terra – CPT/ Regional Bahia

Comissão Pastoral da Terra-  CPT / Regional Minas

Ecologia e Observação de Aves – ECOAVIS

Federação de órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE

Food First Information and Action Network – FIAN Internacional

Grupo de Estudos Amazônicos – GEAM – UFF

Grupo de Estudos com Povos Indígenas – Unilab

Grupo de Estudos Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente da UniversidadeFederal do Maranhão (GEDMMA/UFMA).

Grupo de Estudos e Pesquisas em Etnicidade /UECE

Grupo de Estudos em Ética Ambiental de Volta Redonda

Grupo de Estudos em Tematicas Ambientais – GESTA/UFMG

Grupo de Estudos em Territórios e Identidade – GETI/UFPB

Grupo de Estudos e Pesquisas Socioambientais – GEPSA

Grupo de Pesquisa Memórias, Processos Identitáros e Territorialidade no Recôncavo da Bahia – MITO/UFRB

Grupo Rede Congonhas

Intersindical – Centro de Classe Trabalhadora

Instituto de Permacultura EcoVida São Miguel

Instituto Pacs

Jubileu Sul Brasil

Justiça Global

Juventude Franciscana- JUFRA

Laboratório de Antropologia Política e Comunicação – LAPA/UFPB, com Pesquisadores da UFRN

Latorarório de Estudos e Pesqusias sobre Etniciade, Cultura e Desenvolvimento – LACED – Museu Nacional/UFRJ

Laboratório Estado, Trabalho, Território e Natureza – ETTERN/IPPUR/UFRJ

Laboratório de Estudos Sobre Ação Coletiva e Cultura/UPE

Laboratório Nova Cartografia Social, Processos de Territorialização Identidades Coletivas e Movimentos Sociais – CNPq

Movimento de Defesa da Serra do Rola Moça Sempre Viva

Movimento pela Preservação da Serra do Gandarela

Movimento pelas Serras e Águas de Minas (MovSAM)

Movimento pela Soberania Popular na Mineração – MAM  

Núcleo de Antropologia da Arte – UERJ

Núcleo de Estudo em Agroecologia e Nova Cartografia Social /UFRB

Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Etnicidade  – PPGA/UFPE

Núcleo de Estudos de Povos Indígenas – UFSC

Núcleo de Família, Gênero e Sexualidade – FAGES/UFPE

Ong Aguas do Acuruí

Ong Abrace a Serra

PoEMAS – Grupo de Pesquisa e Extensão Política, Economia, Mineração, Ambiente e Sociedade

Programa de Pós-graduação em Cartografia Social e Política da Amazônia – PPGCSPA/UEMA

Rede Iglesias y Minería no Brasil

Rede Justiça nos Trilhos

Rede de Pesquisa em Memória, Identidade, Poder, Ambiente e Território – RAMA

Serviço Interfranciscano de Justiça, Paz e Ecologia – SINFRAJUPE

SOS Serra da Piedade

União das Associações Comunitárias de Congonhas – UNACOM

Unidos dos Conceição – UNICON

 

Profissionais, Pesquisadores e Pesquisadoras:

Ana Costa,  Professora e Pesquisadora da Universidade Federal Fluminense – UFF

Denise de Castro Pereira, Professora aposentada e Pesquisadora independente

Liliane Oliveira Guimarães, Pprofessora e Pesquisadora do PPGA Administração, PUC Minas

Roberto Moraes Pessanha, Professor e Pesquisador do IFF Fluminense

Élcio Pacheco – Advocacia Popular Agrária-Ambiental Coletiva

Para quem desejar aderir, por favor enviar assinaturas para Ana Flavia no e-mail  [email protected]m ou para Reaja no e-mail [email protected]

Imagem: Projeto Minas-Rio, em Conceição do Mato Dentro (MG) / Divulgação/Anglo American

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