Comunidade destaca que a reintegração geraria graves violações de direitos humanos.
Comunicação e assessoria jurídica Terra de Direitos, no Brasil de Fato
Na sexta-feira (06), o juiz de direito da Comarca de Pinhão-PR, Gabriel Leão de Oliveira, revogou a decisão liminar de reintegração de posse que havia concedido contra a comunidade quilombola Paiol de Telha, localizada em Reserva do Iguaçu, Centro-Sul do estado. Na decisão, o magistrado ainda determinou a remessa dos autos à Justiça Federal, em função do interesse do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no caso, uma vez que a área objeto da ação de reintegração de posse está dentro do território tradicional da comunidade quilombola Paiol de Telha.
A ação de reintegração de posse foi ajuizada em abril de 2018, por arrendatário com contrato junto à Cooperativa Agrária. Os arrendatários alegam que a comunidade quilombola teria ocupado uma porção de terras de forma irregular e pediram a reintegração de posse com o uso da força policial. De início, e sem que a comunidade quilombola tivesse ciência da reintegração de posse, a liminar de foi concedida, mas sem a possibilidade de utilização da força policial.
Assim que a comunidade quilombola tomou ciência da ação, a Associação Quilombola, em parceria com a Terra de Direitos, organização de Direitos Humanos, peticionou nos autos informando que a competência para processamento da ação é da Justiça Federal, pois há decreto declarando a área de interesse social para fins de titulação de território quilombola. A Associação sustentou ainda que a efetivação da reintegração de posse geraria graves violações de direitos humanos, uma vez que a comunidade dispõe de poucas terras para tentar sobreviver com dignidade, entre outros argumentos.
Com a decisão, a Justiça Federal deverá decidir sobre o destino da ação de reintegração de posse.
Reconhecimento
A comunidade quilombola do Paiol de Telha teve seu território reconhecido pelo Incra no ano de 2014, e o decreto de desapropriação de parte das terras foi assinado pela presidenta Dilma Rousseff no ano seguinte, em 2015. Contudo, até o momento o Incra não finalizou a titulação do território.
De acordo com o Incra, a autarquia agrária e a Cooperativa Agrária – atual proprietária das terras que pertencem à comunidade quilombola, estão realizando acordo para que seja possível titular, num primeiro momento, pouco mais de 300 hectares em benefício da Associação Quilombola. Contudo, até o momento a titulação ainda não ocorreu, apesar do superintendente do Incra ter prometido à comunidade, em fevereiro deste ano, que a primeira titulação sairia até o mês de abril.
Obstáculos
A continuidade do processo de titulação depende principalmente de orçamento. O principal obstáculo para que o Incra adquira as propriedades e faça a titulação completa do território da comunidade Paiol de Telha é a falta de orçamento. O orçamento do órgão referente ao ano de 2018 para fins de titulação é inferior a um milhão de reais, um valor muito pequeno para atender o conjunto de áreas a serem tituladas no país.
A área de trezentos hectares do Paiol de Telha que está em processo de titulação foi avaliada pelo Incra em pouco menos de dez milhões de reais. Assim, para a titulação dos demais dois mil e seiscentos hectares, o Instituto Nacional deverá ter seu orçamento recomposto. Em um passado recente, em 2012, o orçamento chegou a 50 milhões de reais.
Enquanto o Governo Federal e o Congresso Nacional não recompuserem o orçamento do Incra, conflitos como o exposto na reintegração de posse do Paiol de Telha continuarão, marcando racismo institucional que precisa ser superado, para que políticas destinadas à população negra, como a de titulação dos territórios quilombolas, possam avançar.
Nesse intervalo até a efetiva titulaçao, o Poder Judiciário deve garantir às comunidades quilombolas acesso à terra, pois sem tal condição a vida das comunidades está severamente ameaçada. Que prevaleça o direito à vida das comunidades quilombolas ante ao direito de propriedade de pessoas e grupos econômicos que historicamente se apropriaram das terras, do trabalho e da natureza quilombola.
Edição: Laís Melo.