Deputado que exporta eucalipto é quem defende lei para relaxar licenciamento de eucalipto

Newton Cardoso Jr (MDB-MG) representa uma offshore investigada, parceira de firma alemã para cultivo do produto; ele defende terras para estrangeiros

Por Bruno Stankevicius Bassi, em De Olho nos Ruralistas

Os negócios da família do deputado federal Newton Cardoso Junior (MDB-MG) estão na mira da Polícia Federal, que tem feito busca e apreensão nas empresas dele e de seu pai, o ex-governador Newton Cardoso. Ele é representante legal da Danin Enterprises Ltd, empresa com sede no paraíso fiscal das Ilhas Virgens Britânicas. A empresa é alvo do Inquérito 3.069, de 2013, que corre sob sigilo.

O político é um dos destaques da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), que pretende reeleger 26 parlamentares mineiros: “Minas: maior bancada ruralista do Congresso tem 26 integrantes tentando reeleição”. A série De Olho nas Eleições retrata candidatos ruralistas e histórias de conflitos de interesses em cada Unidade da Federação.

A Danin Enterprises é uma das donas da Florestal Vale do Jequitinhonha Ltda (Florevale), projeto de cultivo de eucalipto que incluía, entre os sócios, um importador alemão e uma das grandes madeireiras do Brasil: a Tarobex,  dos irmãos capixabas Miguel Ângelo e Norival Ângelo Scaramussa. Os aliados de Newton têm empresas de extração e comércio de madeira no Pará, Rondônia e Rio de Janeiro. Somente a Fazenda Bonita, em Paragominas (PA), possui 1.500 hectares.

Outro parceiro do político era o alemão Peter Klaus Witzel, dono da WZ International, empresa exportadora no Espírito Santo com interface para importação de madeira na Europa. A sociedade prometia, em 2002, vender 2 mil metros cúbicos de madeira para a Alemanha. Mas foi desfeita.

Parte dos documentos que vieram a público no inquérito da PF mostra inconsistência no depoimento dos sócios sobre quem realmente comandava a empresa: o irmão de Newton Junior ou o próprio Witzel.

Essa é parte da vida privada do político. A parte pública também tem o eucalipto como protagonista. Ou a defesa do capital estrangeiro.

NA CÂMARA, DEFESA DO SETOR

Como deputado, Newton Cardoso Junior tentou facilitar a monocultura do eucalipto, ao propor retirada de licenciamento. Ele é autor do Projeto de Lei nº 6411/2016, em tramitação no Congresso, que visa dispensar as atividades de silvicultura e reflorestamento do licenciamento ambiental. Assim como a Florevale, outra empresa do grupo Newton Cardoso – a Rio Rancho Agropecuária S/A – também planta eucalipto e é alvo da investigação.

Um dos parlamentares que integraram a CPI da Funai e do Incra, como suplente, o deputado é coordenador da Frente Parlamentar da Silvicultura, voltada exatamente para a defesa desse setor: “Deputado ruralista prevê até 100 mil hectares de terras para cada estrangeiro“.

Em novembro de 2016, ele foi escolhido para relatar o PL 4.059/2012, que pretende liberar a aquisição de terras por estrangeiros no Brasil, contrariando parecer LA-01/2010 da Advocacia-Geral da União. Alvo de protestos, o projeto foi congelado pela bancada ruralista, que aguarda as eleições de outubro para retomar as discussões.

No ano anterior, 300 famílias pertencentes ao Movimento Geraizeiro Guardião de Cerrado ocuparam uma das fazendas vinculadas à Rio Rancho Agropecuária, em Grão Mogol (MG). Os geraizeiros – uma população tradicional de camponeses do Norte de Minas Gerais – acusam a família Cardoso de grilagem de 6.452 hectares, por meio de uma escritura falsa.

HERDEIRO DO “TRATOR”

Com 38 anos, Newton Cardoso Junior é o deputado federal mais jovem do MDB. A fortuna e a trajetória política foram herdadas do pai, o ex-governador Newton Cardoso, o Newtão. Ele governou Minas entre 1987 e 1991 e foi três vezes deputado federal. Era chamado de “trator”, pelo seu estilo agressivo. Acusado em 2009 pela ex-mulher, a então deputada Maria Lúcia Cardoso (MDB-MG) de ter cem fazendas, ele respondeu da seguinte forma à revista Veja: “Tenho 145”.

Seu filho adota estilo similar na defesa do agronegócio e dos interesses de seus sócios e empresas. Por meio do Grupo Newton Cardoso, a família possui fazendas dedicadas ao plantio de eucalipto e à pecuária bovina. O conglomerado empresarial tem ainda a Companhia Siderúrgica Pitangui, maior produtora de ferro-gusa de Minas, a fábrica de sucos Goody, a empresa de logística RR e a Rio Rancho Granitos e Mármores.

Em 2009, em entrevista à imprensa para rebater as acusações de Maria Lúcia, Newtão estimou seu patrimônio em R$ 2,5 bilhões: além das empresas, o ex-governador possuía 150 carros, apartamentos em Nova York e Paris, e duas ilhas, uma em Angra dos Reis (RJ) e outra na Bahia, onde também comprou uma praia particular.

Newton Cardoso Junior declarou em 2018 um patrimônio mais tímido, de R$ 2 milhões. O bem mais valioso é um apartamento no valor de R$ 1,5 milhão.

O Grupo Newton Cardoso tem problemas com o Fisco.

DEFENSOR DO REFIS, ELE DEVE R$ 100 MILHÕES

Somadas as dívidas tributárias das quatro empresas onde o deputado consta como presidente ou sócio-administrador, elas chegam a R$ 83,5 milhões. A cifra não inclui os R$ 10,7 milhões devidos pela Pitangui Agro-Florestal, outra empresa do grupo, onde ele não aparece como sócio. No total, R$ 100 milhões.

Mesmo endividadas, as empresas da família aportaram R$ 678 mil à campanha de Newton Cardoso Júnior em 2014. Não foram as únicas: com dívidas de R$ 41,7 milhões, a Mercantil do Brasil Financeira S/A doou R$ 35 mil ao filho do ex-governador.

Líder da “bancada do Refis”, o deputado tem como uma de suas bandeiras a redução da dívida de empresas. Essa bancada foi formada durante a comissão que analisou a Medida Provisoria nº 783/2017, que instituía o Programa de Regularização Tributária (PRT). O grupo venceu a queda de braço com o Executivo e, além de estender o prazo de adesão ao PRT, aprovou a redução de até 90% dos juros de mora e 70% das multas.

O grupo empresarial do deputado chegou a ter outros negócios, como a produção de uvas e abacaxis em Santo Sé, o terceiro município da Bahia com maior número de pessoas em situação de miséria. A justificativa? A má qualidade das estradas atrapalhava as exportações. Com mais de mil hectares improdutivos, a fazenda foi ocupada em março por 400 militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), que solicitavam a disponibilização imediata das terras para a reforma agrária.

DEPUTADO FOI CITADO NA LAVA-JATO

Newton Cardoso Júnior teve o nome citado na Operação Lava-Jato em 2016, por causa da compra de um helicóptero em 2007, no valor de US$ 1,9 milhão. Para a transação ele utilizou outra empresa offshore registrada nos Estados Unidos, conforme vazamento veiculado nos Panama Papers.

A Polícia Federal cumpriu em abril mandado de busca e apreensão na sede da Rio Rancho Agropecuária, em Belo Horizonte e em uma das unidades no norte de Minas, em Grão Mogol. A operação era parte do Inquérito 3.069, referente à lavagem e ocultação de bens, que corre sob sigilo no Supremo Tribunal Federal (STF).

Em outra denúncia, pai e filho foram alvo da Ação Penal 987, que investigava a falsificação de notas fiscais para o recebimento de carvão vegetal sem licença ambiental pela Companhia Siderúrgica Pitangui. Havia a suspeita de que fosse proveniente de mata nativa. Em resposta a uma apuração da Repórter Brasil, a assessoria do deputado informou que ele havia sido inocentado. No entanto, a ação ainda corre no Supremo Tribunal Federal (STF).

Segundo levantamento da Comissão Pastoral da Terra de Minas Gerais, a Rio Rancho teria 71.493 hectares, dos quais 24.907 não estão legalizados. Em 21 de junho, policiais militares – acompanhados de dois funcionários da empresa – expulsaram e demoliram a casa de uma família de camponeses, pertencente ao Território Geraizeiro de Curral de Varas II, em Padre Carvalho, município vizinho de Grão Mogol.

O tio do deputado, Manoel Cardoso Neto, o Nelito, foi condenado como mandante do assassinato do advogado Gabriel Sales Pimenta, ocorrido em 1982 em Marabá (PA). Pimenta vinha impedindo as investidas de Nelito contra o Castanhal Pau Seco, onde viviam 158 famílias camponesas. Foragido, Nelito se refugiou na fazenda do irmão Newtão, em Pitangui (MG). O crime prescreveu em 2006.

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