Corrupção e violência. Por Vladimir Safatle

O que esperar de alguém cujo símbolo de campanha é uma arma apontada?

Na Folha

“Não importa o que Bolsonaro fale, desde que ele garanta segurança e o fim da roubalheira.” Essa afirmação de um de seu eleitores talvez expresse com clareza o que move muitos dos brasileiros e brasileiras a optarem por sua candidatura. No entanto, a crença de que Bolsonaro seria alguma espécie de resposta milagrosa à violência da sociedade brasileira e à corrupção de seu Estado é baseada em equívoco tão evidente quanto aquele que levou vários eleitores a verem em Fernando Collor um caçador de marajás.

Bolsonaro gosta de se vender como um homem incorruptível e incansável no combate à corrupção. Mas Bolsonaro é aquele mesmo político que passou 20 dos 27 anos de sua vida pública em um partido notoriamente corrupto (PP), comandado por ninguém menos do que Paulo Maluf.

Em momento algum, alguém ouviu declaração indignada a respeito da corrupção de seu partido e suas figuras de proa. Nada disto o incomodou durante 20 anos. Ao contrário, quando questionado sobre a propina que seu partido recebeu da JBS e direcionada a ele, apenas afirmou: “Que partido não recebe propina?”.

Hoje, sua campanha é comandada por Onyx Lorenzoni, que deve ser seu chefe da Casa Civil. O mesmo que admitiu ter recebido R$ 100 mil de caixa dois da mesma JBS para sua campanha. Sua campanha é entusiasticamente apoiada por pilares da moralidade como o pastor e ex-presidiário Edir Macedo, que terá certamente influência e ascendência em seu governo.

Enquanto isto, o senhor Bolsonaro louva um regime corrupto, como a ditadura militar brasileira. Ninguém nunca ouviu o deputado indignado com casos de corrupção que fizeram a história da ditadura, como Coroa Brastel, Capemi, Jari, Brasilinvest e Paulipetro, entre tantos outros. Não é por acaso. O que incomoda Bolsonaro não é a corrupção, mas simplesmente a corrupção feita por aqueles que não são seus amigos, aliados ou ídolos, como sempre foi em terras pátrias.

Agora, aparecem histórias sobre omissão de patrimônio, uso indevido de verbas e estruturas funcionais, funcionários fantasmas e enriquecimento vertiginoso que o deputado responde com sua contumaz violência. Isso além de sua campanha ser marcada por uma circulação inacreditável de fake news, o nome contemporâneo para a pura e simples mentira. Imaginar que alguém dessa natureza será o destinado a “varrer a corrupção” do país é da ordem do simples delírio.

Sobre o pretenso combate à violência, o país viu o que significará seu governo nos últimos dias. Um de seus apoiadores matou o capoerista Moa do Katendê em uma discussão política. Outros espancaram um estudante na frente da UFPR por usar um boné do MST. Mulheres têm medo atualmente de serem importunadas por seus seguidores em bando na rua.

Diante da morte hedionda do capoeirista não ouvimos Bolsonaro sequer se solidarizar honestamente, dizendo, como era de se esperar, que estava profundamente indignado com o fato, que prestava seu apoio à família em momento difícil, que isso era algo que ele nunca poderia aceitar. Falando um protocolar “eu lamento”, ele logo afirmou, “quem levou a facada fui eu”, preferindo agir como um chefe de gangue em vez de agir como um possível presidente.

Mas o que esperar de alguém cujo símbolo de campanha é uma arma apontada? Que volte a colocar esquadrões da morte na periferia, como em sua amada ditadura? Que permaneça igualmente indiferente quando seus seguidores organizarem grupos para “caçar comunistas” e “corrigir homossexuais”? É esse o homem que age em nome da ordem e do progresso?

Seus seguidores dizem que a violência é direcionada apenas a bandidos. O problema é que “bandido” para o senhor Bolsonaro é, no final das contas, todos aqueles que não pensam como ele e recusam os pretensos valores que esse senhor defende. Ou seja, sua “união do país” será feita sob os cadáveres dos oponentes e sob a violência contra os descontentes como, não podia deixar de ser, em sua amada ditadura.

Moa do Katandê, morto na segunda, 8 de outubro, de madrugada. Foto: Facebook

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