Comentários até em tom de ameaça foram classificados pela polícia como criminosos
Por G1 MA — São Luís
A missa do quilombo realizada em São Luís na última terça (20), dia da Consciência Negra, foi alvo de várias ofensas nas redes sociais e já virou caso de polícia. A missa é realizada há oito anos no mês de novembro e é uma forma de reforçar o combate ao racismo, à intolerância e ao preconceito.
Os ataques começaram depois que um vídeo da missa foi divulgado pela Catedral da Sé nas redes sociais e mostrou dança e a manifestação cultural dos negros durante a celebração dentro da igreja. Assim que o vídeo foi publicado vieram comentários como “Nojo”, “Malditos”. Um homem diz “Deixem a santa igreja em paz, saiam e levem consigo os seus demônios”.
Outras pessoas fizeram ameaças, como “palhaçada”. Em outra postagem, uma pessoa disse: “Quero trombar com o organizador dessa vergonha na rua e chutar a cara dele até o cérebro virar um patê”.
Como reação, uma mulher disse que “a igreja é do povo e o povo é negro”, enquanto outra postagem diz que “isso é lindo de ver, o respeito à cultura e história dos negros”.
Os comentários surpreenderam o Padre Ribamar Nascimento, que celebrou a missa. Ele usava um turbante como uma forma de homenagear a cultura negra e diz que o objetivo sempre foi aproximar culturas e religiões.
“O que se usou foram instrumentos da nossa cultura brasileira, que incluía não só instrumentos de matriz africana, como também outros instrumentos do dia-a-dia, profanos, e que nós usamos nas mais variadas liturgias. O que teve a mais que eu usei, e que padre não usa, foi um turbante em sinal de comunhão com aquele momento que nós estávamos celebrando”, contou o Padre Ribamar. “Eu conclamo justamente a gente a viver nessa tolerância, na paz, na felicidade e de lutarmos para que, de fato, o mundo possa caminhar na concórdia, sem ódio”.
As críticas também assustaram lideranças religiosas ligadas à cultura negra. A Elisandra Rocha, viúva do Pai Neto de Nanã, falou sobre o respeito dentre as religiões e que os negros sofreram ao chegar no Brasil, muito por conta da rejeição à sua raiz cultural.
“As religiões afro só conseguiram… o povo afrodescendente só conseguiu sobreviver a esse país porque conseguiu ressignificar a sua cultura e a sua fé. Ressignificou a sua religião. Então a partir de elementos ligados ao catolicismo, ao cristianismo, ela encontrou e sincretizou. Ligou os seus elementos ao cristianismo. (…) Mas a fé é só uma, as religiões celebram o amor e isso é que é o sentido porque Deus, ele é o amor”, declarou Elisandra.
A igreja católica informou que vai continuar apoiando a missa do quilombo, que vai continuar sendo realizada todos os anos. Outras entidades religiosas também se manifestaram.
“Não tinha nenhum elemento de umbanda. Ninguém que foi na missa viu que o ofertório eram todos alimentos que a cultura negra foi colocando, como batata doce, a macaxeira, o bolo de milho… essas coisa. A pipoca… Então foi coisas que eram alimento e tinha uma pessoa que representava o corpo marcado da história, de todo o sofrimento dos negros. A única coisa que teve”, disse Sílvia Cristina Sá, coordenadora das Comunidades Eclesiais de Base da Igreja Católica.
Já a Polícia Civil diz que houve crime nos comentários, que alguns tiveram cunho racista e que os autores podem ser identificados, responsabilizados e punidos. O delegado de Crimes Virtuais no Maranhão, Odilardo Martins, listou alguns crimes cometidos nas postagens.
“Nós estamos tratando de difamação, injúria… crimes contra a honra e até crimes com preconceito com a religião, que são utilizados no meio informático. São delitos que podem acontecer na rua e hoje em dia acontece no meio informático”, afirmou o delegado Odilardo.
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Padre Ribamar Nascimento usava turbante no dia da Missa do Quilombo e foi alvo de críticas — Foto: Reprodução/TV Mirante