Povos tradicionais e originários são as principais vítimas do uso abusivo de agrotóxico
Por Nadine Nascimento, em Brasil de Fato / MST
“Com o avanço da produção de soja apareceram muitas doenças. Febre, dor de cabeça, as crianças passaram a ficar doentes, e até mesmo a coceira está aparecendo nas pessoas. O que vale para nós é a vida do nosso povo. A gente sabe que os fazendeiros não vão parar de fazer isso”.
Quem conta é o líder indígena Winti Suya, do povo Kisêdjê. O que vem causando problemas de saúde são os agrotóxicos pulverizados nas proximidades da reserva do Xingu, no Mato Grosso, o estado brasileiro que mais produz soja.
Em outubro, a pulverização indiscriminada de agrotóxicos perto das casas e plantações dos Kisêdjê os obrigaram a migrar de sua antiga aldeia para uma nova.
Suya se preocupa com a expansão do agronegócio e com a possibilidade de redução das terras. Ele teme os riscos do uso massivo e irregular de agrotóxicos na região:
“Eles pulverizam com avião, com muita intensidade e em grande quantidade. O povo desde 2005 vem enfrentando esse problema”, comenta Suya, “a gente tem medo disso prejudicar a nossa saúde. A gente pode ficar doente”, continua.
Assim como os indígenas, o povo quilombola também trava uma luta histórica contra o agronegócio pelo direito de ter seus territórios reconhecidos e respeitados. No cerrado de Tocantins, o quilombo da Ilha de São Vicente sofre com a especulação das terras.
“Somos de uma terra de resistência, um território de luta. Vivemos pequenos conflitos com fazendeiros até grandes conflitos com a ameaça de hidrelétricas, de grande empreendimentos como de hidrovias.”
A denúncia é de Fátima Barros, liderança quilombola da ilha ocupada pelos povos tradicionais há cerca de 150 anos.
Ela conta que desde 2010, após um conflito violento com um fazendeiro da região, sua comunidade vive em estado permanente de alerta.
Tanto o indígena como a quilombola entendem que o respeito aos direitos territoriais está intimamente ligado à preservação ambiental e a práticas de produção mais sustentáveis e saudáveis de alimentos.
“Desde sempre minha família tem como base a agroecologia, um processo de produção que a gente traz de África dos remanescentes do meu povo, que foi traficado, espoliado, mas que não perdeu a nossa cultura. A terra para a gente é sagrada”, afirma Barros.
“Ele [o agronegócio] vai acabar destruindo o meio ambiente, a natureza, o ar e os alimentos. Nem o governo, nem os órgãos responsáveis pela fiscalização tem poder para parar isso. Eles [os fazendeiros] têm cada vez mais força e ninguém chega nas fazendas para fiscalizar”.
Winti Suya e Fátima Barros participam do “I Seminário Internacional – III Seminário Nacional: Agrotóxicos, Impactos Socioambientais”, realizado na Cidade de Goiás (GO). O evento tem o objetivo divulgar trabalhos científicos nacionais e internacionais sobre o tema e conecta os impactos dos agrotóxicos às violações aos direitos humanos.
Edição: Daniela Stefano
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Fátima Barros, liderança quilombola da ilha de São Vicente, em Tocantins / Fotos: Matheus Alves