Bancada do PSOL na Câmara protocola representação contra Weintraub na PGR: nota divulgada ontem pelo ministro viola a Constituição

Tania Pacheco

A bancada do PSOL na Câmara dos Deputados protocolou ontem, na Procuradoria Geral da República (PGR), representação contra Abraham Weintraub, pela nota divulgada na qual chega ao absurdo de querer impedir até mesmo os pais de “divulgar e estimular protestos”. Diz a nota dp ministro da Educação: “professores, servidores, funcionários, alunos, pais e responsáveis não são autorizados a divulgar e estimular protestos durante o horário escolar”.

“É um ataque à própria Constituição Federal, naquilo que representa a sua essência, a liberdade dos brasileiros”, afirma a representação, assinada pel@s deputad@s Ivan Valente, Fernanda Melchionna, Áurea Carolina, David Miranda, Edmilson Rodrigues, Glauber Braga, Luiza Erundina, Marcelo Freixo, Sâmia Bomfim e Talíria Petrone.

Parte da argumentação do documento pode ser lida parcialmente abaixo, seguida de link para a íntegra.

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“A Constituição Federal estabelece que o ensino deve ter por base, entre outros princípios, o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas (art. 205, inciso III). Além disso, a Constituição garante que as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial (art. 207).  

Além disso, a liberdade de manifestação pacífica é um direito fundamental da Constituição. No seu artigo 5º, inciso XVI está escrito que “todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente”.

Contra as disposições do pacto constitucional, o Ministro da educação resolveu ameaçar estudantes, professores e técnicos das escolas públicas de todo o Brasil. Hoje, dia 30 de maio, no momento em que ocorriam as manifestações em inúmeras cidades brasileiras contra os cortes na educação promovidos pelo governo Bolsonaro, foi publicado uma nota no site oficial do Ministério da Educação com conteúdo claramente intimatório e contrário aos princípios constitucionais. 

Transcrevemos a íntegra da nota publicada no site oficial do Ministério:

O Ministério da Educação (MEC) esclarece que nenhuma instituição de ensino pública tem prerrogativa legal para incentivar movimentos político-partidários e promover a participação de alunos em manifestações.

Com isso, professores, servidores, funcionários, alunos, pais e responsáveis não são autorizados a divulgar e estimular protestos durante o horário escolar. Caso a população identifique a promoção de eventos desse cunho, basta fazer a denúncia pela ouvidoria do MEC por meio do sistema e-Ouv.

Vale ressaltar que os servidores públicos têm a obrigatoriedade de cumprir a carga horária de trabalho, conforme os regimes jurídicos federais e estaduais e podem ter o ponto cortado em caso de falta injustificada. Ou seja, os servidores não podem deixar de desempenhar suas atividades nas instituições de ensino para participarem desses movimentos.

Cabe destacar também que a saída de estudantes, menores de idade, no período letivo precisa de permissão prévia de pais e/ou responsáveis e que estes devem estar de acordo com a atividade a ser realizada fora do ambiente escolar.’

Este comunicado faz parte da guerra ideológica que se tornou a única política pública implementada pelo Ministério da Educação na atual gestão. Estudantes, professores, técnicos e pais estão resguardados pela Carta magna para ocupar as ruas e protestar. Uma manifestação em defesa da instituição, como no caso da defesa do bom funcionamento das universidades ou das escolas públicas, na verdade, realiza os princípios Constitucionais. 

No caso, os protestos contra os cortes nas universidades e institutos federais são pacíficos e representam o exercício do direito acima descrito, o qual faz parte das conquistas cidadãs de 1988.

Se temos o direito de promover manifestações pacíficas, obviamente temos o direito de convidar as pessoas para que delas participem. Assim, é totalmente descabida a tentativa de proibir que tais atos sejam divulgados nos ambientes de trabalho e de estudo dos cidadãos brasileiros. 

Além disso, o direito a greve também está consagrado na Constituição. A CF de 1988 dispõe em seu art. 9º: “É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender”. Ou seja, a nota oficial do MEC representa uma tentativa de constranger este direito e, ao mesmo tempo, desinformar pais e responsáveis sobre as garantias dos trabalhadores vinculados ao MEC. 

Ou seja, o conjunto dos elementos apresentados na Nota não deixam dúvidas. É uma peça destinada a intimidar o livre exercício do pensamento (garantido no artigo 5º, IV), de expressão (artigo 5º, IX), de manifestação pacífica (artigo 5º, XVI) e ao direito de greve (artigo 9º) e da autonomia universitária (art. 207). É um ataque a própria Constituição Federal, naquilo que representa a sua essência, a liberdade dos brasileiros. 

Dessa forma, o Ministro se valeu do cargo para retaliar e intimidar manifestações políticas. Houve uma clara orientação ideológica que configura desvio de finalidade e, portanto, um ato completamente inconstitucional e ilegal do Ministro. Ou seja, houve o uso de recursos públicos, publicado numa página oficial do Ministério, com o intuito de perseguir e intimidar as manifestações democráticas que estão sendo realizadas hoje e eventuais manifestações que ocorrerão em defesa da educação. 

II – DO DIREITO

De acordo com os princípios Constitucionais, a o Ministro deve utilizar o sítio oficial do Ministério para informar e esclarecer à população, e não fomentar perseguições e censuras. Trata-se de uma grave ilegalidade e imoralidade. 

Há uma clara violação do princípio da moralidade, da legalidade e da impessoalidade (art. 37 da Constituição Federal). O representado utilizou a página oficial do Ministério para incentivar uma perseguição política aos atos ocorridos hoje em todo o país. No fundo, é uma promoção pessoal, de cunho personalíssimo, com orientação contrária à Constituição Federal, sem nenhum tipo de interesse público envolvido. 

De acordo com a Carta Magna: 

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 

§ 1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

§ 2º A não observância do disposto nos incisos II e III implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, nos termos da lei.

Resta evidente que a postura do Ministro se enquadra na lei de improbidade administrativa, conforme se observa:

Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.

(…)

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

A lei nº 1.079/50 também estabelece que Ministro de Estado comete crime de responsabilidade quando atentam contra a probidade administrativa. 

Houve uma clara orientação ideológica que configura desvio de finalidade e, portanto, um ato completamente inconstitucional do Ministro. Como dito, o ensino deve ter por base, entre outros princípios, o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas (art. 206 da CF), além de assegurar a autonomia universitária (art. 207 da CF). 

Aliás, a liberdade de expressão no ambiente acadêmico foi reafirmada recentemente pelo Supremo Tribunal Federal. O Tribunal reafirmou os princípios constitucionais da liberdade de cátedra, expressão e não ingerência na autonomia universitário por parte do Estado: 

“Em qualquer espaço no qual se imponham algemas à liberdade de manifestação há nulidade a ser desfeita. Quando esta imposição emana de ato do Estado (no caso do Estado-juiz ou de atividade administrativa policial) mais afrontoso é por ser ele o responsável por assegurar o pleno exercício das liberdades, responsável juridicamente por impedir sejam elas indevidamente tolhidas.

Fazendo incidir restrição no ambiente de informação, ensino e aprendizagem como é o universitário, que tem o reforço constitucional da garantia de autonomia, assegurado de maneira específica e expressa constitucionalmente, para se blindar esse espaço de investidas indevidas restritivas de direitos, a  demonstração da nulidade faz-se mais patente e também mais séria.” 

(STF – ADPF: 548 DF – Distrito Federal, Relator: Min. Cármen Lúcia.  Data de Julgamento: 31/10/2018. Data de publicação: DJe- 235 06/11/2018)

As violações aos princípios constitucionais são recorrentes por parte do atual Ministro da Educação. Não à toa, no dia de hoje, o Ministério Público Federal denunciou o Ministro ABRAHAM WEINTRAUB. O MPF pede que a União pague indenização de R$ 5 milhões por causa das declarações do ministro da Educação sobre estudantes e professores[1]

Em entrevista coletiva, o ministro acusou os estudantes e professores de fazer “balbúrdia com dinheiro público”. A ação argumenta que: “gravidade que é um ministro de Estado da Educação atuar para denegrir a imagem das próprias instituições de ensino superior e, no contexto dessa ação, a dos próprios alunos e professores, quando postura oposta era a esperada”.  

Dessa forma, a orientação veiculada pelo Ministro no site oficial exorbita os limites legais, tendo em vista que se trata de uma atuação do administrador claramente inconstitucional. A não observância da estrita legalidade pode ocasionar, como parece ser o caso, abuso de autoridade e improbidade administrativa. 


[1] Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-mai-29/mpf-acusa-ministro-educacao-danomoral-estudantes”

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Para ler o texto completo da representação, clique aqui.

Manifestantes se reúnem em frente ao Prédio Histórico da UFPR, em 30 de maio de 2019, com a faixa substituindo a que foi removida no ato bolsonarista de domingo, 26. Foto: Franklin de Freitas /Estadão Conteúdo

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