“No dia 28/06/19 foi divulgada a informação (1) de que o atual Diretor de Pesquisa, Avaliação e Monitoramento da Biodiversidade do Instituto Chico Mendes (ICMBio), Marcos Aurélio Venâncio, solicitou a comandantes de batalhões militares ambientais a indicação de policiais militares inativos para gerir as unidades de conservação federais. Essa solicitação se justificaria na opinião do Capitão de que policiais militares têm “caráter técnico-pragmático”, o que, além de ao menos dois anos de experiência em atividades ambientais, os habilitaria à função. Mas é bom lembrar que as atribuições dos servidores da carreira de especialista em meio ambiente vão muito além do exercício do poder de polícia, função precípua das forças policiais.
A carreira de Especialista em Meio Ambiente foi criada em janeiro de 2002, por meio da Lei nº 10.410/02 (2). Essa Lei criou os cargos para atuação nos órgãos ambientais federal: Gestor Ambiental, Gestor Administrativo, Analista Ambiental, Analista Administrativo, Técnico Ambiental, Técnico Administrativo e Auxiliar Administrativo.
O artigo 4º da lei que criou a carreira, define como atribuições dos Analistas Ambientais as seguintes atividades:
“I – regulação, controle, fiscalização, licenciamento e auditoria ambiental;
- – monitoramento ambiental;
- – gestão, proteção e controle da qualidade ambiental;
- – ordenamento dos recursos florestais e pesqueiros;
- – conservação dos ecossistemas e das espécies neles inseridas, incluindo seu manejo e proteção; e
- – estímulo e difusão de tecnologias, informação e educação ambientais.”
Importante ressaltar que atualmente os Analistas Ambientais constituem a maior parte dos servidores responsáveis pela gestão de Unidades de Conservação (UCs) federais. Essas atividades desenvolvidas pelos Analistas são necessárias para a implementação de políticas públicas (portanto políticas de Estado e não somente deste ou daquele mandato) e afetam a educação ambiental, licenciamento e qualidade ambiental, uso público (visitação), pesquisa, planejamento e gestão de UCs, prevenção e combate a incêndios florestais, manejo de fauna, flora, pesca, participação social, povos e comunidades tradicionais, uso sustentável da biodiversidade, além de exercício do poder administrativo de polícia ambiental, em uma área correspondente a 10% das terras e 25% do mar brasileiros.
O conjunto de servidores ora atuante no ICMBio, compõe-se de servidores públicos que ingressaram na carreira na época da sua criação (jan/2002) e em concursos posteriores que ocorreram até 2014. Além da experiência profissional na instituição, diversos servidores já atuavam na área de meio ambiente antes de ingressarem na carreira. Portanto, aqueles com menos experiência em nosso quadro têm ao menos 5 anos de exercício no ICMBio.
Outro aspecto importante a destacar é a criação, em 2009, da Academia Nacional da Biodiversidade – ACADEBio (3), escola corporativa que capacitou o quadro de funcionários do ICMBio, além de contribuir com a formação de servidores de outras instituições e também de representantes da sociedade civil. As diversas formações oferecidas buscam fortalecer a instituição no exercício das atribuições definidas para a carreira que, por sua vez, são decorrentes de normas que compõem o arcabouço legal da gestão ambiental brasileira e definem o escopo e limites do trabalho dos gestores e dos servidores.
Ao solicitar a indicação de policiais militares com esse perfil, depreende-se que os servidores atualmente em exercício nas UCs não têm “caráter técnico – pragmático”. Em que se embasaria tal argumento? Na dificuldade para se fazer cumprir a legislação e alcançar resultados na gestão ou numa suposta “militância” dos servidores públicos da área ambiental?
Ambas as ideias são falaciosas: 1. para cuidar de 10% das terras e 25% do mar brasileiros no país que guarda a maior biodiversidade do planeta, o ICMBio dispõe de 1.540 servidores; 2. o orçamento da pasta de meio ambiente no governo federal vem sendo historicamente reduzido (4), o que dificulta sobremaneira ou impossibilita que se cumpra a missão institucional do órgão que vem sendo entendida como “militância” por aqueles que querem agir ao arrepio da lei.
Além disso, o atual governo vem colecionando exemplos de arbitrariedades na pasta ambiental. Inúmeras unidades de conservação tiveram servidores da casa, com anos de dedicação e expertise, exonerados de suas chefias sem qualquer justificativa. O ministro visita municípios de Unidades de Conservação reunindo-se com ruralistas, madeireiros e políticos locais representantes de grupos interessados na predação das unidades, mas sequer dialoga com os próprios servidores que se dedicam à gestão das Unidades; e por onde passa vai exonerando chefias sem conhecer o trabalho que fazem – como no caso dos Parques Nacionais da Lagoa do Peixe, dos Lençóis Maranhenses e do Núcleo de Gestão Integrada Chico Mendes. Pra piorar, faz indicações de pessoas ligadas a interesses partidários para chefias de UCs, como na Resex Arraial do Cabo, ou de ruralistas contrários à própria existência da Unidade, como na Lagoa do Peixe (5). E agora proibiu servidores de participar de eventos (6) e de dar entrevistas para jornalistas (7). É com grande preocupação que a Associação Nacional dos Servidores Ambientais (Ascema) observa a marcha do autoritarismo em uma pasta tão importante como a do meio ambiente.
Portanto, cabe perguntar: Qual o real objetivo do aparelhamento do Instituto Chico Mendes com policiais militares e as recentes arbitrariedades contra os servidores ambientais?
Brasília, 12 de julho de 2019
Diretoria Executiva.”
–