Os estudos de impacto ambiental e a economia de visibilidades do desenvolvimento

A realização de grandes projetos de infraestrutura é fomentada e justificada por meio da retórica do desenvolvimento, categoria que produz efeitos de sentidos que atribuem aos projetos uma inexorabilidade frente às “exigências” do mercado. Contudo, embora tratada sob a rubrica  impactos no âmbito do licenciamento ambiental das grandes obras, a produção de violências diversas, e da expropriação em particular, é inerente a tais projetos. A partir de pesquisas de campo que analisam as políticas das afetações provocadas por duas barragens no Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais, e da análise do EIA-RIMA de um complexo minerário na bacia do Rio Santo Antônio, sub-bacia do rio Doce, este texto aborda os limites e implicações das categorias tradicionalmente mobilizadas nas Avaliações de Impacto Ambiental. Discutimos a economia de visibilidades produzida no âmbito dos licenciamentos e como ela elide a multiplicidade de deslocamentos compulsórios e a violência rotinizada no âmbito da gestão técnica dos impactos.

Por Raquel Oliveira Santos Teixeira, Andréa Luisa Zhouri Laschefski e Luana Dias Motta, na Revista Brasileira de Ciências Sociais/Scielo

INTRODUÇÃO

A realização de grandes projetos de infraestrutura – hidrelétricas, hidrovias, rodovias, portos –, assim como de plantas industriais e extrativas, é fomentada e justificada, sobretudo por gestores públicos, técnicos e agentes corporativos, por meio do uso da retórica do desenvolvimento. Tal categoria produz efeitos de sentidos que atribuem aos projetos uma certa inexorabilidade frente às ‘exigências’ do mercado. Na gramática do desenvolvimento,(1) conforme assinalaram criticamente Zhouri, Laschefski e Paiva (2005), as consequências sociais e ambientais dessas intervenções são consideradas externalidades, ou seja, efeitos colaterais dos projetos que podem, nesta concepção, ser identificados, mensurados e eficientemente administrados por meio de programas de mitigação e de compensação. Segundo os autores, essa perspectiva constitui uma crença técnica e gerencial que compõe o cerne da “modernização ecológica”, sustentando a visão hegemônica do desenvolvimento sustentável.(2) Conforme procuramos discutir, embora tratada sob a rubrica impactos, no âmbito do licenciamento ambiental das grandes obras, a produção de violências diversas, e da expropriação em particular, é inerente à implementação dos projetos de desenvolvimento. Estes produzem, de fato, uma crescente vulnerabilização de grupos sociais que têm suas formas de ser, fazer e viver territorializadas. Desta forma, a partir das diferentes experiências de deslocamento compulsório analisadas ao longo dos anos, observamos um processo que pode ser identificado como reprodução de padrões históricos de “injustiça ambiental” (Martinez-Alier, 1999Acselrad, 2004) na implantação de complexos minerários e projetos energéticos no Brasil, a exemplo do que ocorreu na implantação das hidrelétricas de Sobradinho (Sigaud et al, 1987) e Tucuruí (Santos, 2007), na mina Morro do Ouro, em Paracatu (MG), e no complexo minerário Minas-Rio (Santos, 2014). Os estudos sobre barragens hidrelétricas, sobretudo, evidenciam deslocamentos múltiplos provocados por essas obras, situações e processos que estão estrategicamente ausentes da avaliação de gestores, técnicos e agentes corporativos.

A partir do exame das afetações provocadas por duas barragens no Vale do Jequitinhonha, Minas Gerais, bem como da análise do EIA-RIMA de um complexo minerário projetado para a bacia do rio Santo Antônio, sub-bacia do rio Doce, onde estão previstas outras 22 barragens hidrelétricas, este texto oferece uma análise crítica do licenciamento de grandes obras de infraestrura, com ênfase nos procedimentos técnico-burocráticos tradicionalmente mobilizados como estudos de impacto ambiental. Vale precisar que os Estudos de Impacto Ambiental (EIA) são centrais para os processos de licenciamento ambiental, na medida em que as categorias mobilizadas nesses estudos frequentemente permeiam os sucessivos procedimentos no âmbito dos licenciamentos. Para os propósitos desse artigo em particular, elas são reveladoras de uma “economia de visibilidades” organizada na esfera do planejamento territorial realizado pelo Estado e pelas corporações. Dito de maneira mais específica, essa economia de visibilidades é evidenciada na Estudo de Impacto Ambiental que, por seu turno, constitui eixo estruturante das medidas de reparação, com o delineamento de fronteiras entre áreas e sujeitos afetados e a transformação das violências sofridas por estes, por meio das politicas mitigadoras e indemnizatórias, em algo potencialmente admissível. É uma análise desta economia de visibilidades que trazemos neste texto, destacando seus modos de elisão, não apenas da multiplicidade que assumem os deslocamentos compulsórios, mas da violência rotinizada no âmbito dessa gestão técnica dos impactos.

Como panorama de fundo que antecede a etapa do licenciamento ambiental das grandes obras, é preciso considerar que a organização da matriz energética brasileira, força motriz do desenvolvimento, concentra sua capacidade geradora, primordialmente, na exploração do potencial hídrico. Componente estratégico do plano de crescimento da economia nacional, a expansão do parque gerador busca atender à demanda crescente de setores eletrointensivos, em particular daqueles associados ao extrativismo, entendidos aqui como os setores minerários, petroleiros e monocultivos de exportação (Gudynas, 2015). Tais projetos surpreendem não apenas pelo volume de capital mobilizado, mas também por suas expressivas consequências socioambientais, fartamente analisadas ao longo das últimas quatro décadas (Sigaud et al, 1987Najar, 1990Costa, 1991Couto, 1999Bloemer, 2001Santos, 2007Rothman, 2008Vainer, 1993Zhouri; Laschefski; Paiva, 2005, entre outros). Os problemas são agravados, ainda, pela execução sequencial de projetos no mesmo rio ou bacia, algo que produz efeitos cumulativos e sinérgicos ainda pouco explorados pela literatura, e estrategicamente ignorados pela regulação ambiental. Em Minas Gerais, o Sistema de Informações do Potencial Hidrelétrico Brasileiro apresenta ao menos quinze projetos inventariados para o Vale do Jequitinhonha. Já na Bacia do rio Santo Antônio, afluente de importância considerável para a recuperação do rio Doce – este recentemente afetado por um dos maiores desastres sociotécnicos de nossa história (Zhouri et al, 2016) –, está prevista a implantação de 22 projetos hidrelétricos (vinte PCHs e duas UHEs), que se somam a duas plantas minerárias de larga escala: os projetos Minas-Rio (já em operação) e MLog (ex-Manabi, em licenciamento), ambos compreendendo o transporte do minério de ferro através dos extensos minerodutos que ligam o interior de Minas ao litoral do país, conforme pode ser observado na figura 1. Tal sistema de dutos, destinado ao escoamento da polpa de minério impulsionada através do bombeamento de grande volume de água em jato contínuo, mostrou-se uma opção técnica com mais vantagens econômicas que as alternativas ferroviária e rodoviária.

Figura 1 Mapa dos projetos minerários e hidrelétricos na Bacia do Rio Santo Antônio. Fonte: Movimento pelas Serras e Águas de Minas (MovSAM). Mapa divulgado em 11 fev. 2014.

Assim, por meio das situações examinadas nessas duas bacias hidrográficas do sudeste brasileiro – a bacia do rio Jequitinhonha e a bacia do rio Santo Antônio –, pretendemos analisar a produção de deslocamentos múltiplos, seus pressupostos e efeitos, bem como as práticas estatais e corporativas de planejamento e reordenamento territorial envolvidas. Aqui, vale sublinhar como essas práticas, e os efeitos delas decorrentes, constituem o que Ferguson (1994) chamou de funcionamento de uma máquina antipolítica. Para o autor, isso significa que os projetos de desenvolvimento e sua implementação têm como cerne a transmutação de processos e decisões essencialmente políticas em procedimentos técnicos destinados à solução de problemas técnicos e gerenciais. Assim, na sua concepção, os projetos de desenvolvimento realizam a suspensão ou contenção dos desafios políticos, ao mesmo tempo que exigem a expansão ou incremento do poder administrativo.

No intuito de olhar para esse funcionamento “antipolítico”, supostamente “sem autoria” (Ferguson, 1994), nosso esforço analítico dará ênfase especial às categorias que compõem a gramática do licenciamento ambiental, notadamente nos Estudos de Impacto Ambiental – i.e. externalidadesimpactos –, e que dialogam com população e território, categorias próprias dos dispositivos de governo, configurando uma economia de visibilidades do desenvolvimento.3 Portanto, a discussão proposta neste artigo tem como foco as relações de poder inerentes a tais processos, permitindo-nos refletir criticamente sobre os mecanismos de representação e de gestão fundamentais para as ações de planejamento e reordenamento territorial através dos projetos de desenvolvimento que, em verdade, perpetuam iniquidades históricas.

Efeitos ignorados pela matriz de impactos: a perda das vazantes e a desarticulação do sítio camponês

O projeto Murta consiste na construção de um barramento nas proximidades da confluência dos rios Salinas e Jequitinhonha, região do Médio Jequitinhonha. Sob licenciamento desde 1998, a usina hidrelétrica de Murta, no entanto, não constitui um projeto isolado. Ao contrário, é parte de um contexto mais amplo de produção de uma nova frente de expansão para o Vale do Jequitinhonha. Iniciada ainda na década de 1980, através do Programa Novo Jequitinhonha, esta proposta de ocupação do território do Vale é marcada pela ótica mercantil hegemônica, que privilegia a homogeneização da paisagem a partir da expansão dos reflorestamentos de eucaliptos nas ‘chapadas’ e da implantação de barragens hidrelétricas nas ‘grotas’ (Zhouri; Oliveira, 2005). Somente na bacia do Jequitinhonha foram identificados e inventariados quinze projetos de grandes aproveitamentos hidrelétricos, entre os quais está também a usina hidrelétrica de Irapé.

Construída pela Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e pelo Governo do Estado de Minas Gerais, a usina hidrelétrica de Irapé possui a barragem mais elevada do Brasil, com 208 metros de altura, e potência máxima instalada de 360 megawatts. O enchimento do reservatório provocou o deslocamento compulsório de cerca de 1.200 famílias de 51 comunidades rurais (Zucarelli, 2006). A barragem de Irapé está localizada logo a montante da área planejada para a instalação do aproveitamento hidrelétrico de Murta, o que significa que a população ribeirinha ameaçada de relocação pela UHE Murta é a mesma que vive a jusante da UHE Irapé. Quando do enchimento do reservatório de Irapé, em 2006, tais comunidades tiveram seu abastecimento de água seriamente comprometido, em função das alterações na qualidade da água do rio Jequitinhonha, que em muitas localidades constitui a única fonte do recurso (Zhouri; Oliveira; Laschefski, 2010).

Passados cinco anos desde o enchimento do reservatório, uma análise sobre as condições de vida dos moradores a jusante revelou o comprometimento das formas de reprodução social das famílias (Zhouri; Oliveira; Laschefski, 2010). Embora não contempladas no universo de ‘atingidos’ nos Estudos de Impacto Ambiental de Irapé, tais comunidades se viram impossibilitadas de dar continuidade a suas práticas produtivas e a seus modos de organização social em função das alterações induzidas no regime de vazão do rio Jequitinhonha. O resultado foi a imposição de uma conjuntura de crise a partir da produção de condições que engendraram um “deslocamento in situ” (Feldman; Geisler; Silberling, 2003). A este, seguiram-se movimentos migratórios de abandono das localidades, configurando então um cenário de “deslocamentos múltiplos”, conforme se discutirá adiante.

Essa dinâmica se produz devido ao modo específico de apropriação dos recursos naturais no Médio Jequitinhonha. Na região de clima semiárido, a organização produtiva das famílias caracteriza-se como um sistema interdependente, cuja reprodução torna imprescindível a articulação entre lavoura, lavra e criação de animais. Tal articulação se realiza mediante a produção conjugada nos domínios roça-horta, ou seja, na funcionalidade do binômio ‘tabuleiro-vazante’. Ocorre ali uma classificação do ambiente que organiza e fundamenta o trabalho das famílias. Os critérios para essa classificação estão relacionados à inclinação do terreno e à sua proximidade do rio (Zhouri, Oliveira e Laschefski, 2010). As ‘vazantes’ são áreas localizadas nas margens dos rios grandes (Jequitinhonha, Salinas e Vacaria) e estão sujeitas às inundações sazonais. Nestes terrenos são feitas as ‘hortas’ com o cultivo de hortaliças e verduras. Já os ‘tabuleiros’ são áreas planas localizadas a mais ou menos cinco metros das margens dos principais rios. Nos ‘tabuleiros’ são feitas as ‘roças’, nas quais são cultivados os mantimentos, ou seja, o milho e o feijão e, eventualmente, o arroz. Na ‘roça’, além deles, pode-se plantar também produtos como o amendoim, a abóbora, o quiabo, o maxixe e outros. Estes ambientes mobilizam trabalhos diferentes em épocas distintas do ano. A ‘roça’ feita nos tabuleiros exige que os produtos sejam plantados no ‘tempo das águas’ (período chuvoso, variavelmente de novembro a março). Em contraste, as ‘hortas’ que dependem das áreas de ‘vazante’ somente produzem durante a estiagem (maio a setembro), quando o rio tem seu volume de água reduzido, possibilitando o aproveitamento das margens. As ‘vazantes’ fornecem, portanto, o alimento durante o período mais crítico da seca; constituem um domínio produtivo cuja fertilidade está ligada à dinâmica da vazão e às águas fluviais. Elas são, assim, imprescindíveis para o modo de vida local, dada a irregularidade das chuvas no semiárido.

A supressão das vazantes resulta, portanto, na desarticulação do sítio camponês, na medida em que seu domínio fornece às famílias não só a ‘mistura’,(4) mas a complementaridade das esferas roça-horta e do trabalho masculino-trabalho feminino. A vazante provê, sobretudo, o que alguns interlocutores chamam de “agricultura certa”, conforme relatou um morador da comunidade de Prexedes:

porque o processo é o seguinte, a terra ficava molhada e aqui [vazante] se plantou, colheu […] Já o alto é esse processo se tiver chuva você colhe, se não tiver, você não colhe. Então, como o rio molhava e o molhado conservava, então você plantava tendo certeza que colhia, e agora perdemos essa…a nossa agricultura certa, nós perdemos (Entrevista realizada em maio de 2011).

A perda desse domínio redunda não só no comprometimento da criação e do “fundo de manutenção” (Wolf, 1970) dessas famílias, como também as expõe a condições de perda da soberania e insegurança alimentar, derivadas da desestruturação produtiva e do desequilíbrio ecológico. É nesse sentido que Andrade e Filho (2006) expõem que a insegurança alimentar não se faz somente em termos técnicos, relativos ao suprimento nutricional, mas diz respeito, sobretudo, às alterações impostas compulsoriamente aos padrões de produção e consumo dos alimentos quando estes são modificados de forma drástica pelo impedimento do acesso aos recursos naturais utilizados tradicionalmente na composição da economia camponesa doméstica desses grupos.

Assim, foram observadas sucessivas perdas, já que a mudança no regime hidrológico do rio, imposta pelo funcionamento da usina hidrelétrica a montante, comprometeu as práticas e o conhecimento existentes e tornou impossíveis a previsibilidade e o controle exercidos pelas comunidades ribeirinhas sobre as vazantes. Com efeito, o que observamos foram tentativas incessantes de ler e organizar o sistema produtivo de acordo com essa nova condição ambiental, marcada pela inconstância do fluxo das águas. A afluência e a ‘fartura’ presentes nos relatos sobre o passado foram substituídas pelas perdas advindas da restrição à produção e ao trabalho, e por um esforço imperativo e constante de compreender a temporalidade de uma paisagem imprevisível, processos que sublinham uma nova condição de “deslocamento in situ” (Feldman; Geisler; Silberling, 2003), que precipitou deslocamentos subsequentes.

Com efeito, a anulação da matriz que organizava a lógica camponesa está associada à insuficiência de recursos para manter as famílias, o que resulta no sentimento de inaptidão para o trabalho dos homens e chefes de família, e na impotência que os leva compulsoriamente a deixar o direito de origem(5) para buscar melhores condições nos arruados mais próximos (São João da Vacaria, Barra do Salinas ou as cidades de Josenópolis e Virgem da Lapa). Como um morador do vilarejo de Limoeiro ressaltou quando perguntado pelos nove filhos: “Sai tudo pra fora. Não tem como viver [aqui]” (entrevista realizada em maio de 2011). O esvaziamento demográfico das comunidades à beira do rio Jequitinhonha relaciona-se, portanto, à perda das perspectivas que fundamentavam as possibilidades de reprodução familiar nas localidades de origem. Exemplo paradigmático é da comunidade de Pianos, localizada na margem direita do rio Jequitinhonha, onde apenas quatro das dezesseis famílias que compunham a comunidade permaneceram.

Considerando tais fatos, observamos que a principal mudança introduzida na vida dessas famílias a partir da instalação da UHE Irapé foi a desestruturação do seu sistema produtivo, com as implicações que isso acarreta, destacando-se o quadro atual de crise que redunda em novos deslocamentos compulsórios. Entretanto, os prejuízos e as mudanças pelos quais os moradores da zona rural a jusante da UHE Irapé passam são compreendidos – tanto pela Companhia Energética de Minas Gerais (CEMIG) quanto pelo perito engenheiro civil e sanitarista designado para avaliar sua situação – como uma fase transicional já superada.(6) Na ótica desses agentes, tudo se passa como se as condições anteriores à inserção do empreendimento tivessem sido restauradas.

Contudo, a pesquisa nas localidades evidenciou que a expectativa de que os danos seriam provisórios, circunscritos à etapa de construção da infraestrutura e enchimento do reservatório, não se confirmou na realidade empírica. A referência às perdas dessas famílias deve ser enfatizada, pois elas produzem um sentimento generalizado de privação. A redução da capacidade produtiva da família, com o comprometimento da capacidade de gestão da força de trabalho e a diminuição da renda (ou das possibilidades de auferi-la), se reflete na composição dos grupos domésticos, com a partida de muitos filhos (potenciais herdeiros), que deixam a terra em busca de novas oportunidades.

Assim, para as famílias a jusante da UHE Irapé, o imperativo da migração se revela como um destino inescapável, produzido pela confluência de certas condições que impedem o retorno da ‘fartura’, ao mesmo tempo em que projetam, na cidade, o espaço possível de reprodução social dos filhos e de acesso aos serviços dos quais sempre se viram privadas. A violência da experiência migratória que se mostra inevitável, ainda que não seja imediatamente dirigida pela coerção, permite refletir a respeito do modo de obtenção de governo sobre a conduta de outrem, e da produção da nova paisagem. A contínua migração das famílias para as cidades responde, nesse horizonte, aos próprios objetivos dos programas do Estado e a seus esforços para desenvolver a região, retirando-a do atraso e da estagnação econômica. A compulsoriedade configura-se, nesse caso, como um longo processo de erosão da autonomia e da escolha. Discutiremos, a seguir, a multiplicidade de formas que os deslocamentos compulsórios assumem, incluindo a produção dos “deslocamentos in situ” nesse contexto.

Desenvolvimento: a miopia estratégica do licenciamento e a produção de deslocamentos múltiplos

O caso de Murta, ou das famílias a jusante de Irapé, que foram ameaçadas de remoção pelo primeiro projeto e, simultaneamente, afetadas pela barragem (ainda que tenham sido tornadas invisíveis, no que diz respeito a esse segundo efeito, no âmbito do licenciamento de Irapé), permite compreender que os processos de deslocamento compulsório não são provocados exclusivamente por meras falhas ou lacunas falhas e lacunas nos estudos de impacto ambiental, nem tampouco constituem  externalidades resultantes do programa desenvolvimentista. Em contraste, a multiplicação de tais experiências é parte inerente tanto à formação do Estados-Nação (e seus enclaves corporativos do neoextrativismo) quanto à sua reestruturação econômica, com vistas à promoção do  desenvolvimento  (Feldman; Geisler; Silberling, 2003). Nessa perspectiva, os deslocamentos se apresentam como constitutivos da modernidade eurocêntrica, na medida em que modernidade e desenvolvimento são projetos “espaço-culturais” fundamentados sobre a conquista contínua de territórios e povos com vistas à sua transformação segundo as diretrizes de uma ordem presumidamente racional e logocêntrica (Escobar, 2003, p. 157).

É sob essa ótica que examinamos a associação entre projetos de desenvolvimento e deslocamentos compulsórios. Tais projetos consistem em intervenções que “transformam a paisagem de modo rápido, intencional e profundo e requerem aplicações coordenadas de capital e do poder do Estado” (Gellert; Lynch, 2003, p. 15-16). Ribeiro (2000), por sua vez, os define como eventos do sistema mundial que implicam em grandes movimentos de capital e pessoas, em escala global ou nacional. O percurso desses projetos no espaço e no tempo exige, pois, a diferenciação de processos “primários” e “secundários” de deslocamento (Gellert; Lynch, 2003). Os primeiros se referem às ações diretas de relocação de populações no espaço, incluindo os grupos atingidos por obras desse tipo e o contingente de trabalhadores mobilizados e/ou atraídos para a construção do projeto. Já os deslocamentos secundários se referem a processos desencadeados, como “efeitos em cascata”, a partir das mudanças na qualidade do ambiente físico e social.

A literatura especializada também aponta que a relocação física não é condição necessária para caracterização do deslocamento compulsório, conforme demonstra a noção de “deslocamento in situ” (Feldman; Geisler; Silberling, 2003, p. 9). Aparente contradição em termos, a noção revela, em contraste, que grupos podem experimentar a compulsoriedade desses processos sem efetivamente deixarem seus lugares de origem, na medida em que veem seus recursos e formas de reprodução social comprometidos pelos efeitos das intervenções. O “deslocamento in situ” se refere, assim, a processos em que as pessoas permanecem no lugar, mas têm suas condições de existência significativamente alteradas, modificando sua posição social, em especial suas condições de vulnerabilidade e risco. Nessa medida, o deslocamento compulsório diz respeito não ao movimento físico em si, mas às relações a partir das quais as pessoas perdem acesso e controle de suas condições de existência e reprodução social, incluindo recursos naturais, moradia, segurança e redes de solidariedade, confiança e parentesco (Feldman; Geisler; Silberling, 2003). Cabe investigar, nesse sentido, as conexões entre o controle dos territórios e seus efeitos, pois o deslocamento compulsório tanto pode se referir ao movimento no espaço quanto à permanência no local, embora com reconfiguração dos atores em novas posições econômicas e sociais.

Interessante notar ainda que a noção de pobreza evocada por planejadores e empreendedores aparece comumente relacionada a experiências de deslocamento compulsório, como justificativa para a intervenção. Nesse sentido, o escrutínio da realidade local a ser atingida como um conjunto de carências a ser superado a partir da integração do lugar às dinâmicas do mercado é um elemento fundamental das “ideologias modernizantes” (Gellert; Lynch, 2003). É através da classificação dos sujeitos do lugar como pobres que se opera uma patologização e uma discriminação dos mesmos: “A retórica da ‘qualidade de vida’ que informa estes programas, entendida em termos morais, além de materiais, representa a instigação contemporânea de uma intervenção destinada a uma maior inserção e realização pessoal (empowerment) das faixas vulneráveis da população” (Pussetti; Brazzabeni, 2011, p. 8).

O prosseguimento das intervenções se faz, assim, alimentado pela ideia de interesse público, que legitima o prejuízo concomitante de alguns; pela crença na capacidade tecnológica e na gestão participativa para a mitigação e compensação dos impactos; e pela assertiva da necessidade de agir sobre a qualidade de vida dos grupos afetados. Nesses casos, a vulnerabilidade diz respeito à impossibilidade de governar o próprio destino, e em especial ao aumento da exposição a situações que lesam ou produzem danos aos indivíduos, incluindo-se aí a possibilidade constante de sofrer deslocamentos subsequentes.

Ora, as indenizações e compensações, quando subscritas, revelam-se irrisórias e insuficientes para a reposição patrimonial das famílias. Sabemos que, quando tais expedientes são acionados, revelam-se precários, de modo a não comprometer o orçamento previsto para o custo social do empreendimento. Contudo, compreendidas na chave do “paradigma da adequação ambiental” (Zhouri; Laschefski; Paiva, 2005), as medidas de indenização e compensação revelam sua funcionalidade para a viabilização institucional e política dos projetos. Isso porque, uma vez previstas e inseridas como condicionantes no processo de licenciamento, permitem a continuidade das obras mesmo sob expressiva recusa das populações afetadas e a flagrante evidência dos danos sociais e ambientais irreversíveis advindos dos empreendimentos.

A seguir, abordaremos em mais detalhe os elementos constitutivos dessa lógica patrimonial que, centrada numa perspectiva gerencial, perfaz o quadro do “paradigma da adequação ambiental”. Para tal, nos apoiaremos no estudo realizado a propósito do projeto minerário Manabi, atualmente designado MLog, na bacia do rio Santo Antônio, para onde estão previstas 22 barragens hidrelétricas. Importante frisar que a mudança de nome do complexo minerário se insere em um processo de reestruturação da empresa Manabi S.A. em 2015, que incluiu ainda mudança de controle acionário e o desenvolvimento de um novo plano de negócios, a partir da fusão com a corporação britânica Asgaard, especializada em logística e navegação. Manteremos o nome Manabi aqui, em coerência com a denominação contida no EIA-RIMA, elaborado antes da mudança.

A propósito do EIA-RIMA, a análise a seguir compreenderá os estudos de impacto ambiental como dispositivos de governo que arregimentam certos tipos de expertise e poder para funcionar como mecanismos de visibilização e invisibilização, ou seja, inclusão e exclusão daquilo que se deseja classificar e reconhecer como universo atingido e, por conseguinte, das responsabilidades estatais e empresariais.

Visões e classificações que esvaziam o universo dos atingidos

O empreendimento Manabi está previsto para uma sub-bacia do rio Doce, a bacia do rio Santo Antonio, que já conta com quatro hidrelétricas instaladas, duas delas, as barragens de Porto Estrela e de Salto Grande, consideradas de grande porte. Outras dezoito PCHs estão planejadas para a mesma bacia, enquanto o mineroduto Minas-Rio, considerado o mais extenso do mundo, mobiliza consideráveis volumes de água desde que entrou em operação, em 2014. Situado neste contexto, o projeto Manabi consiste na implantação de uma infraestrutura de extração de minério de ferro com capacidade de 25 milhões de toneladas anuais, um sistema de dutos para escoamento do mineral (mineroduto Morro do Pilar-Linhares) e um terminal portuário, designado Porto Norte Capixaba. As cavas a céu aberto têm sua instalação prevista no município de Morro do Pilar, vizinho a Conceição do Mato Dentro, onde se localizam parte das estruturas do projeto minerário Minas-Rio. O projeto Manabi ainda se encontra em licenciamento, tendo sido emitida apenas a licença prévia estadual para as cavas e demais estruturas associadas à planta extrativa. O mineroduto está sob análise do órgão ambiental federal (Ibama), assim como o porto.

Ao longo de sua extensão, o projeto Manabi colide com comunidades tradicionais, incluindo grupos de camponeses em Minas Gerais e de pescadores artesanais no litoral do estado do Espírito Santo. Propomos pensar os estudos de impacto ambiental produzidos no âmbito do licenciamento do empreendimento Manabi como uma narrativa particular que exerce um olhar gerencial sobre o universo social que examina, procedimento típico dos EIA-RIMAs também no campo do licenciamento das hidrelétricas. Trata-se, de saída, de uma narrativa linear que encadeia uma sequência de diagnósticos, intervenções e resultados, apresentados sob a forma de descrições, fotografias, tabelas, compilações de dados estatísticos, mapas e a denominada matriz de impactos. Estamos diante de um documento que reivindica expertise e poder (Li, 2007), calcado sobre as imagens de territórios vazios, abandonados ou carentes, onde a implantação do empreendimento operaria como fonte ou motor do desenvolvimento. Apoiando-nos na análise de Tania Li (2007), buscamos entender os estudos de impacto ambiental como um dispositivo que arregimenta saberes, modos de percepção, práticas de cálculo, tipos de autoridade e técnicas específicas de inscrição. Assim, tomar o universo a ser governado em termos técnicos exige a mobilização de um conjunto de recursos que ensejam determinados modos de percepção, e produzem certas visibilidades. Tal análise sugere a seguinte indagação: quais efeitos e visibilidades derivam das avaliações de consultores produzidas no âmbito do licenciamento ambiental?

Na produção de uma visibilidade específica, a descrição das localidades, seus habitantes e atividades apresenta-se como artefato estrategicamente calculado, que descaracteriza as redes de relações e as histórias conformadoras de trajetórias e memórias coletivas, esvaziando o sentido de um passado compartilhado e de um destino comum. Nessa medida, os estudos de impacto ambiental produzidos para o licenciamento do projeto Manabi – como de resto ocorre no licenciamento ambiental das hidrelétricas que pesquisamos ao longo dos anos – compreendem informações de caráter demográfico com caracterizações breves e superficiais, que não permitem avaliar as interrelações de parentesco, solidariedade e trabalho, bem como a magnitude das consequências do projeto sobre essas redes. Para o mineroduto que cruza os estados de Minas e Espírito Santo, a contabilidade do universo atingido apresenta 832 propriedades afetadas ao longo do traçado de mais de 500 quilômetros de extensão.

Indispensável acrescentar que o conjunto de empreendimentos já existentes não é analisado nos estudos de impacto ambiental do projeto Manabi. Centrando a análise em dados censitários, a avaliação elaborada pelas consultorias contratadas apresenta imagens de territórios vazios, que sugerem impactos socioeconômicos de menor proporção. Para caracterizar a região de inserção do porto, esses estudos enfatizam que se trata de “uma região rural esparsamente ocupada” (Ecology Brasil & Econservation, 2013, p. 19). O mesmo estudo também ressalta:

Ao atravessar os estados de Minas Gerais e Espírito Santo, o mineroduto Morro do Pilar-Linhares […] corta um território de ocupação rural de baixa densidade com a população concentrada em cidades e distritos e na mesma medida, com reduzido impacto na socioeconomia (Ecology Brasil & Econservation, 2013, p. 144).

De um ponto de vista sociológico e antropológico, questiona-se a precariedade de uma afirmação que se baseia exclusivamente no critério de densidade demográfica. Ela exprime o caráter limitador de uma avaliação acerca da magnitude dos efeitos sociais que se restringe à distribuição da população sobre o território. Argumentamos, por outro lado, pela necessidade de se considerar a organização social dos grupos e comunidades afetadas, suas relações econômicas, de parentesco e territorialidade, e seus usos dos recursos hídricos, entre outros aspectos, já que as consequências de um empreendimento dessa natureza não estão adstritas nem exclusivamente relacionadas à densidade demográfica das áreas ocupadas pelas obras, mas se estendem às diversas consequências desencadeadas sobre o modo de vida dos grupos afetados. É possível sublinhar, então, que a ênfase nos aspectos populacionais oblitera a existência de sujeitos coletivos que não se encontram devidamente qualificados ou caracterizados nos estudos.

De certo modo, a ênfase censitária dos estudos não ocorre de maneira fortuita. As enumerações de base ocupacional e fundiária privilegiadas pelos estudos de impacto ambiental revelam a centralidade da preocupação com um território a ser, ao mesmo tempo, liberado e manejado a partir da implantação dos projetos. Nesta e em outras situações examinadas, a obsessão com listas e tabelas de proprietáriosposseiros, arrendatáriospopulação residente e outros tem a função pragmática de produzir legibilidade (Scott, 1998) sobre o campo de intervenção. Simultaneamente, a pretensão exaustiva dos números – que procuram traduzir com precisão o montante dos indenizáveis – apresenta, no contexto do licenciamento, um claro papel discursivo com duas intenções articuladas. De um lado, a legitimação do projeto, já que os números apresentados parecem produzir a imagem de uns poucos atingidos, que são minimamente afetados e potencialmente bastante beneficiados; e, paralelamente, o subdimensionamento dos efeitos, com a consequente construção de limites de responsabilidade claros e exíguos. Não é demais lembrar que as listagens de comunidades e propriedades afetadas funcionam como mapas de legilibilidade que visibilizam a área de atuação e controle das empresas e, na mesma medida, circunscrevem os limites de sua responsabilidade, frequentemente restritos à chamada Área Diretamente Afetada (designada nos estudos da Manabi, de modo eufemístico, Área de Estudo Local). Nesse sentido, as delimitações físicas produzidas pelos estudos podem ser lidas também como “esforços de criar legibilidade, circunscrever e espacializar a responsabilidade corporativa” (Rajak, 2011, p. 143).

A trajetória histórica e a composição social de comunidades tradicionais são completamente obliteradas a partir da caracterização apresentada. Além da descrição excessivamente genérica e superficial, os vínculos e relações existentes entre as comunidades são ignorados, impossibilitando compreender as consequências do empreendimento sobre as mesmas. Deve-se acrescentar que o uso de categorias como população residenteposseiros e estabelecimentos rurais contribui para uma visão simplificadora e homogeneizadora, que termina por tornar inacessíveis os elementos que permitem defini-las enquanto grupos sociais específicos, portadores de territorialidades próprias, e marcados por uma organização em que as dinâmicas econômica e social estão integradas, pois a produção nas roças, hortas e quintais alimenta uma verdadeira cadeia de sociabilidade.

Repetidamente, os estudos de impacto ambiental elaborados pelas empresas de consultoria para o projeto Manabi relatam somente a ocorrência dispersa de famílias de posseiros, desconsiderando sua existência em um contexto coletivo/comunitário e omitindo ou apagando sistematicamente as redes de relações de parentesco, trabalho e solidariedade que vinculam essas famílias. Assim, a categoria basilar utilizada para tais estudos é população residente, termo que obscurece as dinâmicas locais de fluxos e vinculações entre a roça e a ‘rua’ (sede urbana). Neste sentido, é revelador o seguinte trecho sobre a comunidade de Carioca, afetada tanto pelas atividades do projeto minerário quanto pelo mineroduto:

Antiga fazenda que foi sendo dividida/ocupada ao longo das últimas décadas, denominada Fazenda Carioca, que originou o nome atual. Atualmente é a região na zona rural de Morro do Pilar que concentra o maior número de pessoas, com adensamento populacional, caracterizado por forte presença de posseiros, no entorno. Esta área, chamada de Carioca, não representa uma comunidade reconhecida pelo poder público e nem mesmo por sua população, não tendo sido detectada relação direta de parentesco ou características históricas comuns (Geonature, EIA-MOPI-002-03/12-v1, p. 32, grifos das autoras).

A negação da dinâmica coletiva e do modo de vida particular dessas comunidades também é sugerida pelos estudos que as caracterizam somente como conjuntos de posseiros com moradias dispersas, ignorando sua trajetória histórica. O resultado dessa visibilidade é a produção do atingido como categoria administrativa, uma espécie de público-alvo, definição técnica tornada possível a partir da confecção de mapas e tabelas que pretendem listar aqueles cujas propriedades se sobrepõem às áreas de ocupação pretendida para o empreendimento. Trata-se, portanto, de uma ficção tecida tecnicamente, resultante dos discursos que procuram circunscrever o território como área de inserção do projeto. Tal ficção gerencial é eficiente, na medida em que fixa e individualiza o sujeito passível de indenização.

Conforme se discutirá na próxima seção, essa ficção gerencial apoia-se nas categorias território e população, que se vêem articuladas pela noção central de impacto. Este conjunto de categorias permite a produção de legibilidades e visibilidades sobre as quais o Estado e as corporações se dispõem a governar, enquanto engendram, concomitantemente, novas modalidades de violência e exclusão.

Território e população: produzindo sujeitos governáveis através de realidades sinópticas

Se examinamos o desenvolvimento como um “regime de representação” (Escobar, 2007) específico, vinculado a um “projeto de governo” característico do Estado moderno – ou seja, como esforço para produção de sujeitos governáveis (Li, 1999) –, as noções de legibilidade, território e população se revelam centrais. Tomando esse ponto de partida, cabe interrogar sobre os fundamentos conceituais e os efeitos da produção de saberes e práticas vinculados ao planejamento e à promoção do desenvolvimento.

Nesse sentido, um pressuposto básico de tais iniciativas é a concepção de que o mundo social constitui um cenário ou paisagem passiva, legível e disponível para a intervenção técnica que procura organizar e conduzir os processos e fluxos econômicos. Nesse horizonte, os estudos de impacto ambiental constituem um campo privilegiado para a análise dos saberes e práticas que procuram recortar, gerir e produzir territórios e sujeitos comensuráveis, ou responsivos às orientações de crescimento, progresso e produtividade. Enquanto somatório de recursos acessíveis, territórios e populações são tidos como as variáveis-chave de uma “geopolítica empresarial” (Bronz, 2013) em que os projetos de investimento tornam-se, eles próprios, definidores de novos ordenamentos espaciais e sociais (Vainer; Araújo, 1992). A produção de novos recortes e ordens não pode prescindir da legibilidade do terreno. A capacidade de apreensão, organização e controle dos sujeitos e recursos disponíveis mobiliza, assim, operações de simplificação e padronização do tecido social (Scott, 1998), nas quais as “estratégias enumerativas” (Appadurai, 2004) cumprem um papel fundamental.

Para tornar efetivamente legíveis sistemas complexos de posse, uso e transmissão do patrimônio e seus recursos naturais por parte dos grupos locais, lança-se mão de uma grade padronizada na qual os sujeitos serão distribuídos em categorias formalmente reconhecidas, definidas pelo status jurídico da relação estabelecida com a terra. As classificações usuais empregadas nessas descrições referem-se prioritariamente, então, à situação fundiária local, que enumera os proprietários, arrendatários, trabalhadores rurais e posseiros. A legibilidade é fundamental porque, segundo aponta Rose:

Para se governar uma população é necessário isolá-la como um setor da realidade, identificar certas características e processos próprios dela, fazer com que seus traços se tornem observáveis, dizíveis, registráveis, explicá-los de acordo com certos esquemas explicativos. O governo depende, pois, de verdades que encarnam aquilo que deve ser governado, que o tornam pensável, calculável e praticável (1998, p. 37)

Para Rose (1998), os cálculos de governo dependem de processos de “inscrição”, que traduzem a realidade selecionada em relatórios escritos, mapas, gráficos e, sobretudo, números. Frequentemente, os estudos de impacto ambiental se efetivam como verdadeiras “avalanche[s] de números impressos” capazes de produzir e tornar visível uma “população calculável”, registrada e fixada sob a forma de “inscrições duráveis”, bastante apropriadas para “argumentos políticos e decisões administrativas” (Rose, 1998, p. 37-38). Tais simplificações produzem, assim, sínteses administrativamente eficientes, que permitem prescrever tratamentos específicos (medidas reparativas e compensatórias) para cada uma das categorias elencadas (posseiroproprietáriotrabalhadoratingido direto, entre outras). Trata-se, portanto, da construção de uma realidade sinóptica que pretende tornar possível o controle sobre o universo social considerado. Conforme destaca Scott (1998), as práticas locais se tornam legíveis e assimiláveis “à grade administrativa somente ao custo de serem transformadas e reduzidas a um dispositivo conveniente, ficcional” (Scott, 1998, p. 24).

Os estudos de impacto ambiental operam, nesse sentido, a reivindicação de um conhecimento totalizador que se mostra significativamente parcial, priorizando como informação central a extensão, o status da relação jurídica com a terra e seu uso comercial, fatores fundamentais ao objetivo de liberação da área superficial onde se pretende localizar o empreendimento. Conforme sublinhou Scott (1998), o propósito de ‘cadastramento’ implica, de saída, a reprodução de certa miopia que não apenas simplifica a realidade social abordada, mas a mutila, suprimindo o conjunto de relações e histórias que confere significado a ela:

A completude do mapa cadastral depende, de modo curioso, de seu caráter como esboço abstrato, sua falta de detalhe – sua precariedade. Tomado sozinho, ele é essencialmente uma representação geométrica de fronteiras entre parcelas de terras. Mas o que reside dentro de cada parcela permanece indeterminado (Scott, 1998, p. 44).

Nessa medida, inventários, censos, mapas e levantamentos tornam-se dispositivos centrais na produção de um conhecimento cujo objetivo supera as funções meramente referenciais. Trata-se de um aparato que produz uma “economia de visibilidades específica”, tomando corpo nas “representações utilizadas por planejadores e peritos no desenho e execução dos programas [de desenvolvimento]” (Escobar, 2007, p. 44). As regiões e “populações”, no sentido atribuído por Foucault (1999), são mapeadas, recenseadas, inventariadas e investigadas de modo a permitir a identificação dos potenciais de rentabilização (vantagens locacionais) e dos possíveis riscos sociais às iniciativas de investimento, incluindo a prevenção e a gestão da crítica social (Bronz, 2011Pinto, 2013).

Não é fortuito que os extensos volumes dos estudos de impacto ambiental  produzidos sejam marcados pela profusão de números, tabelas, gráficos, mapas e cadastros. Os números figuram com papel particularmente relevante. Primeiro porque se associam às aspirações de objetividade e imparcialidade expressa na linguagem formal das cifras. Ademais, deve-se destacar sua afinidade com o campo da administração burocrática, cuja linguagem se pretende “abstrata e perfeitamente supracontextual” (Herzfeld, 2016, p. 28). Para Appadurai (2004), a associação entre a proliferação dos números e o controle burocrático erige-se como “chave do imaginário colonial em que as abstrações contabilísticas de pessoas e recursos” engendram “a sensação de haver controle sobre a realidade indígena” (pp.156-157).

A “avalanche dos números” cumpre papel igualmente importante na viabilização político-institucional dos projetos de desenvolvimento. Afinal, são os expressivos montantes de beneficiáriosreceitas e empregos que justificam a implantação dos empreendimentos. Do mesmo modo, é o caráter mensurável, numericamente exprimível dos impactos que torna possível edificar sistemas de mitigação e compensação. Carmona e Jaramillo (2015) ressaltam o “caráter icônico” dos números frequentemente exibidos nos estudos de impacto ambiental. Enquanto ícones que expressam magnitude e relevância, eles apontam “quanta atenção lhe deve ser destinada e o valor aproximado de sua negociação para lograr uma equivalência” (2015, p. 77). Trata-se, conforme nossa interpretação, da instituição de uma comensurabilidade em termos técnicos (medidas necessárias para anular ou mitigar tais efeitos indesejáveis) ou financeiros (medidas compensatórias) sempre tomados como suficientes para a viabilização institucional dos empreendimentos.

A abundância de “estratégias enumerativas” (censos, cadastros, listas e mapas) que caracterizam os estudos de impacto ambiental não revela apenas a busca por uma forma pretensamente objetiva e concisa de captar, ordenar e transmitir grande variedade e volume de informações sobre as “características de outro modo recalcitrantes da paisagem humana e social” (Appadurai, 2004, p. 162). A economia de visibilidades a que nos referimos se apresenta como uma “prosa de dominação cadastral” (idem, p. 164) que racionaliza, simplifica, padroniza, domestica, aplana e normaliza a complexidade das dinâmicas socioculturais. Nesse sentido, há outro recurso próprio dessa economia de visibilidades que se faz fundamental: a noção de impacto.

Como já destacamos, impactos são sobretudo consequências objetivas, apreensíveis e mensuráveis, tradicionalmente organizadas em uma matriz que aponta para sua magnitude, intensidade e duração. Nesses termos, determinadas alterações ambientais serão definidas e consideradas como impactos – ou seja, relevantes e significativas no âmbito da gestão ambiental – somente se puderem ser apreendidas e aferidas por meio de indicadores, mostradores, laudos, testes e laboratórios. Assim, mudanças sociais experimentadas como graves, duradouras e violentas, e que decorrem do planejamento e da implantação de projetos de desenvolvimento, são sistematicamente elididas, já que os  impactos  frequentemente se esgotam nas áreas tomadas como circunscrições ou abrangências pertinentes, tendo em vista a centralidade do projeto (isto é, a localização das estruturas, intervenções e obras previstas), e não os fluxos e a temporalidade dos processos ecológicos e das dinâmicas relativas à organização social dos grupos e suas relações com o território.

Nessa qualidade, ou seja, como categoria administrativa, a noção de impacto opera uma inflexão central: a abordagem dos efeitos e processos de mudança social desencadeados como questões ou problemas de ordem exclusivamente técnica. Nesses termos, a noção de impacto circunscreve uma arena de intervenção sobre a qual os cálculos podem ser aplicados, conforme expõe Li (2007): “a identificação do problema está intimamente ligada à disponibilidade de uma solução. Problema e solução co-emergem dentro de uma arena governamental na qual certos tipos de diagnósticos, prescrições e técnicas estão disponíveis para o perito devidamente treinado” (Li, 2007: p. 7).

Ademais, como algo objetivamente apreensível, mensurável e controlável – a exemplo da extensão da área que se mede e se delimita como diretamente afetada, e da população que se conta, registra e classifica –, a noção de  impacto reafirma o papel dos experts.

Assim, em lugar de tomar a “alquimia de métodos e técnicas de identificação de impactos” (Lacorte; Barbosa, 1995, p. 29) como uma questão de ordem metodológica, seria interessante a tomarmos como uma “estratégia político-gerencial” (idem) que integra a economia de visibilidades própria dos projetos de desenvolvimento. Compreendemos tais dinâmicas como disputas pela produção da verdade e, nessa medida, os estudos de impacto ambiental figuram como discursos autorizados e poderosos, que criam efeitos de sentido e de poder, produzindo e consolidando fronteiras que são relativas ao reconhecimento de direitos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na contramão das narrativas, hoje dominantes, que atribuem ao licenciamento ambiental um papel de empecilho burocrático ao crescimento econômico do país, nossas análises permitem compreender a lógica complexa que configura a economia de visibilidades que, de fato, autoriza a apropriação sistemática do espaço pelas forças hegemônicas do capital. Assim, em vez da flexibilização ou eliminação do licenciamento ambiental e seus estudos de impacto ambiental, a explicitação das categorias que sustentam tal economia de visibilidades possibilita configurar o quadro que delimita o campo das lutas por direitos empreendidas pelos grupos que são colocados em processos de vulnerabilização socioambiental em decorrência de grandes projetos.

De fato, conforme assevera Baviskar (2003), a cartografia do poder toma corpo ou forma no desenho do espaço. Nesse sentido, ao produzir o ordenamento, a discriminação dos espaços e a racionalização do uso dos mesmos, os projetos de desenvolvimento se apresentam como formas de representação e intervenção espacial. Os casos analisados retratam as estratégias por meio das quais a realidade local é tornada legível e administrável, ao mesmo tempo em que operam como um mecanismo de conformação dessas realidades, discriminando espaços, prescrevendo e legitimando usos, traçando fronteiras e produzindo novas hierarquias.

O caso das comunidades ameaçadas pela UHE Murta, ao mesmo tempo atingidas a jusante pela UHE Irapé, demonstra a associação entre a implantação de projetos de desenvolvimento e a produção de deslocamentos compulsórios envolvendo formas diversas de violência, que incluem, de início, as classificações impostas pelos instrumentos míopes dos estudos de impacto ambiental. Essa modalidade de violência também é explicitada na análise do EIA-RIMA do projeto Manabi. Procuramos argumentar que os estudos de impacto configuram-se como uma modalidade de “dispositivo” específico no qual as listagens de população funcionam como artefatos técnicos destinados a sistematizar e sintetizar o conhecimento do cenário da intervenção. Na consecução desse objetivo, contudo, a simplificação operada e a visibilidade produzida por meio de quadros sinópticos terminam por esvaziar as localidades de sua realidade histórica e sociológica.

É preciso destacar, contudo, que a implantação de tais projetos de desenvolvimento depende não apenas do licenciamento ambiental, mas especialmente das medidas que o antecedem, e que se referem ao planejamento elaborado e executado pelo Ministério de Minas e Energia e pelas decisões da Agência Nacional de Mineral, antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). Nessa medida, a exemplo da instalação de empreendimentos hidrelétricos, cujo processo já foi extensamente examinado por Sigaud (1986)Vianna (1989)Vainer (1993), os estudos de impacto ambiental são realizados em momento posterior às etapas de identificação, estimativa do potencial produtivo (pesquisa e prospecção) e autorização de lavra ou outorga junto à Agência Nacional de Mineração e Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), respectivamente. Todavia, é neste momento anterior à formalização do licenciamento que se efetua a opção política em relação aos projetos; assim, a análise de viabilidade é, de saída, condicionada por ações e decisões precedentes, que definem a natureza e a inserção territorial do empreendimento.

Nessa lógica, quando o processo de licenciamento é iniciado, já existem, do ponto de vista do empreendedor, um cronograma e uma estimativa de custos estabelecidos, e que precedem a apreciação dos efeitos, riscos e custos socioambientais do projeto. Desse modo, conforme destaca Vianna (1989), a avaliação ambiental fica subordinada apenas à lógica produtiva e à temporalidade dos investidores, limitando-se à discussão de “medidas ambientais paliativas” que não questionam a opção política efetiva pelos projetos extrativos. Como acentua Sigaud (1986), não são colocadas em questão a natureza e os objetivos dos projetos, pois o foco é a adoção de procedimentos para minorar e reparar as possíveis consequências. Nesses marcos, Zhouri, Laschefski e Paiva (2005) identificam um modus operandi característico do licenciamento ambiental, denominado “paradigma da adequação”, que prioriza ajustes e condicionantes ao empreendimento. Assim, o licenciamento se realiza no interior de uma lógica na qual as questões sociais e ambientais são variáveis a equacionar em termos de custo financeiro e continuidade do empreendimento.

Procuramos evidenciar como as “estratégias político-gerenciais” desse paradigma podem ser entendidas como práticas diversas de regulação e condução de populações e territórios, a partir de conjuntos coordenados de saber e poder, e de acordo com racionalidades específicas que produzem, identificam, circunscrevem e solucionam problemas (O’Malley, 2009). É nesse sentido que a violência do Estado e dos agentes corporativos é naturalizada e rotinizada por meio de sua atividade administrativa, especialmente no esforço de levar a cabo seus projetos de desenvolvimento para a população (Baviskar, 2001). Tal violência se inicia pela mobilização de estratégias e dispositivos que produzem visibilidades específicas e, a partir delas, autorizam certas intervenções. O que tais categorias classificatórias circunscrevem, no entanto, não são apenas as fronteiras da “geopolítica empresarial”, mas os contornos e limites da violência e do campo dos direitos.

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AGRADECIMENTOS

As autoras agradecem ao CNPq e à FAPEMIG pelos auxílios que tornaram possíveis as pesquisas das quais derivam as reflexões desenvolvidas neste texto. E aos pareceristas anônimos da RBCS cujos comentários possibilitaram desenvolver com maior clareza segmentos relevantes da nossa argumentação.

1As categorias administrativas que serão debatidas criticamente nesse texto, tais como desenvolvimento sustentávelimpacto e externalidade, estão grafadas em itálico a fim de apontar seu tratamento enquanto categorias êmicas da gramática do desenvolvimento. Expressões conceituais como “justiça ambiental” (Acselrad, 2004) e “modernização ecológica” (Blowers, 1997), por sua vez, estão assinaladas com as aspas duplas. Com aspas simples grafamos as demais categorias êmicas, sejam as mais amplamente articuladas para defesa dos projetos ditos de desenvolvimento ou aquelas que constituem o léxico dos moradores atingidos pelos empreendimentos.

2Wolfgang Sachs sugere tomarmos essa concepção técnica e gerencial da natureza como uma apreensão particular: “La naturaleza, cuando se transforma en objeto de la política y del planeamiento, se convierte en «medio ambiente». Es engañoso utilizar ambos conceptos en forma intercambiable ya que impide el reconocimiento del «medio ambiente» como una construcción particular de la «naturaleza»” (Sachs, 1996, p.128). Juntamente com Esteva (1996), Sachs nos convida a problematizar a noção de desenvolvimento, incluindo o desenvolvimento sustentável como matriz de pensamento, uma crença modular e catalisadora capaz de mobilizar investimentos políticos e afetivos.

3Mobilizamos a noção de dispositivo inspiradas em Foucault. Para o autor, um dispositivo é “um conjunto decididamente heterogêneo que engloba discursos, instituições, organizações arquitetônicas, decisões regulamentares, leis, medidas administrativas, enunciados científicos, proposições filosóficas, morais, filantrópicas. Em suma, o dito e o não dito são os elementos do dispositivo” (Foucault, 2000, p. 244). Nesse sentido, o dispositivo seria uma espécie de rede que coloca em conexão esses elementos e, em seu funcionamento, produz classificações, práticas discursivas, relações de poder.

4Da mesma forma que o trabalho feminino é visto como complementar – e designado como ajuda – no espaço da roça, a mistura (legumes e verduras), produto do trabalho feminino nas hortas, cumpre papel complementar na alimentação. Aqui, assim como entre o campesinato goiano analisado por Brandão (1981), a chamada mistura representa o acompanhamento, o conteúdo modificador da massa, esta prioritariamente composta pelos mantimentos (cereais) (Brandão, 1981). Quando, alternativamente, a mistura é cultivada no espaço da roça, ela ocupa também espaços intersticiais, os chamados entremeios, liberados entre as ruas nas quais são plantados os mantimentos. De modo semelhante, a mistura é servida depois do mantimento no prato, cuja base é a farinha (mandioca ou milho), o feijão e o arroz.

5Estudos etnográficos realizados no Vale do Jequitinhonha assinalam que a herança constitui a principal forma de acesso à terra na região (Galizoni, 2002Santos, Galizoni & Ribeiro, 2002). Contudo, tais processos não levam necessariamente à partilha jurídica da terra. Herdam-se os direitos, sempre referenciados a um conjunto mais abrangente: o bolo, que agrupa os descendentes de um ancestral comum, reconhecido como legítimo  dono ou  responso da terra. Dessa forma, um determinado direito é mobilizado no interior do bolo para prover o trabalho e o sustento de um grupo doméstico. Sobre as estratégias de transmissão do patrimônio familiar no Médio Jequitinhonha ver Oliveira (2008). Sobre herança e campesinato, ver os trabalhos de Moura (1979) junto a um segmento camponês no sul de Minas Gerais; Brandão (1982), que concentra sua análise em uma fazenda goiana;  Seyferth (1985), que examina as formas de transmissão do patrimônio fundiário entre camponeses do Vale do Itajaí; e Woortmann (1985), que se detém sobre a relação entre processos de herança e práticas matrimoniais em um grupo camponês de Sergipe.

6Sperling, Eduardo Von. PERÍCIA Processo 2006.38.13.012165-7, Classe: 7100-Ação Civil Pública. Requerente: Ministério Público Federal; Réu: Companhia Energética de Minas Gerais — CEMIG. (s.d.) fls 1393-1414. Ver análise detalhada em Zhouri; Oliveira; Laschefski, 2010.

DOI: 10.1590/3610501/2020

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Moradores do Novo Peixe Cru, comunidade construída após a construção da barragem de Irapé. Foto: Maria Fernanda Paulino / Brasil de Fato

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