Liderança Indígena afirma que garimpeiro foi morto à flechada em conflito na Terra Yanomami em Roraima

Segundo Hutukara Associação Yanomami (HAY). Conflito aconteceu na Comunidade Helepi, na região do rio Uraricoera em 25 de fevereiro.

Por Vanessa Fernandes, G1 RR

Um conflito na Terra Indígena Yanomami resultou em garimpeiro morto a flechada e um indígena ferido, diz carta assinada presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY), Davi Kopenawa, que o G1 teve acesso nesta quarta-feira (3).

A carta aponta que oito garimpeiros, em uma lancha, atracaram os indígenas que estavam às margens do rio Uraricoera. Kopenawa pede a investigação do caso e a adoção de medidas urgentes para impedir novos ataques na comunidade do Helepi, onde o conflito ocorreu em 25 de fevereiro.

“Um deles [garimpeiro] bêbado, deslocou-se até a comunidade e perguntou por Ledimar, um xirixana residente na comunidade. Vindo Ledimar ao encontro do garimpeiro, este atirou com um revólver no indígena. Indignado, o irmão mais novo alcançou um arco e flecha e flechou o garimpeiro, que veio a óbito”, relatou Kopenawa no documento.

O documento foi enviado à Fundação Nacional do Índio (Funai), ao Ministério Público Federal de Roraima (MPF-RR) e a Polícia Federal (PF) nessa segunda-feira (1º).

Ao G1, o MPF disse que já foi informado oficialmente sobre o fato e acionou a Funai para verificação. “Foi realizada uma diligência in loco e aguardamos o envio do relatório para verificar a situação do conflito e assim tomar as providências cabíveis”, diz o MPF em nota.

Procuradas, a Funai e a PF não se manifestaram até a última atualização da matéria.

Ainda conforme a carta, o indígena ferido foi socorrido pela comunidade e aguardava a chegada da equipe de saúde do Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Yanomami para tratamento. A Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) não informou se ele já foi atendido.

Os garimpeiros ameaçaram os indígenas e disseram que eles não deveriam ir ao Porto do Arame, que é usado para acessar a Terra Yanomami. Em seguida, fugiram. Segundo Kopenawa, o porto é ocupado pelos garimpeiros que fazem controle do fluxo de embarcações e cobram pedágio dos próprios indígenas.

Este é o segundo conflito registrado em menos de um ano entre indígenas e garimpeiros. Na carta, Kopenawa diz que “não deve ser entendido isoladamente”.

Em junho do ano passado, os jovens Original Yanomami, 24, e Marcos Arokona, de 20, foram mortos a tiros na comunidade Maloca do Macuxi, região do rio Parima, município de Alto Alegre. A tensão foi comparada por lideranças ao que ocorreu durante o Massacre de Haximu.

O Massacre de Haximu ocorreu em 1993, quando garimpeiros promoveram uma chacina contra os Yanomami e 16 índios foram assassinados. O caso foi o primeiro genocídio reconhecido pela Justiça do Brasil.

‘Rota de entrada para o garimpo’

Conforme Davi Kopenawa, Xirixana de Helepi é a primeira comunidade às margens do rio Uraricoera, a partir do limite exterior da Terra Yanomami, o que torna a região rota de entrada para o garimpo.

“Toda a logística fluvial para abastecer os núcleos garimpeiros da região e consequentemente, os garimpeiros que nela circulam, passam necessariamente pela comunidade de Helepi, de modo que a comunidade sofre cotidianamente com o assédio dos garimpeiros no rio. Isto pode ser sentido em termos de impactos ambientais”, diz em trecho da carta.

O adolescente Yanomami Alvanei Xirixana, de 15 anos, terceira vítima da Covid-19 em Roraima e primeirio indígena do país a morrer em razão do vírus, era morador da Comuniade Helepi.

Conforme Kopenawa, o adolescente também morreu em comorbidade com a malária, que “se tornou endêmica na região, sendo esse agravamento do quadro sanitário um dos efeitos do garimpo”.

Até esta terça-feira (2), o boletim epidemiológico da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) apontava 1.448 infectados pela Covid-19 e 10 mortes entre os Yanomami.

Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Yanomami tem quase 10 milhões de hectares entre os estados de Roraima e Amazonas. Cerca de 27 mil indígenas vivem na região, alvo de garimpeiros que invadem a terra em busca da extração ilegal de ouro.

O território também contém a referência confirmada de um povo indígena isolado, além de seis outras reportadas em estudo, segundo a Funai.

Garimpo entre os rios Mucajaí e Uraricoera, que dividem a terra indígena Yanomami, em Roraima — Foto: Exército Brasileiro/ Divulgação

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