A pedido do MPF, Tribunal determina atendimento em saúde a indígenas, mesmo que não estejam aldeados

Decisão refere-se a indígenas de Coronel Murta e Araçuaí (MG). Órgãos têm até 90 dias para implementar medidas sob pena de multa

Procuradoria Regional da República da 1ª Região

Em decisão dessa segunda-feira (23), o Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF1) acolheu pedido do Ministério Público Federal (MPF) para determinar medidas de atendimento em saúde aos povos indígenas Aranã Índio, Aranã Caboclo e Canoeiros, localizados nos municípios de Coronel Murta e Araçuaí, em Minas Gerais. A ação proposta pelo MPF discute o acesso à saúde, em especial no contexto da pandemia de covid-19, aos indígenas tidos como “aldeados”. Órgãos governamentais têm até 90 dias para implementar medidas sob pena de multa diária no valor de R$ 5 mil.

A decisão do desembargador federal Souza Prudente entendeu por presentes os requisitos para a concessão da liminar quanto ao direito invocado e ao perigo do dano. Para o MPF, além da omissão dos órgãos de saúde indígena, a crise sanitária causada pela pandemia de covid-19 torna necessária a adoção de medidas urgentes em favor dos referidos povos indígenas.

Nesse sentido, o Ministério Público destaca também decisão recente, de 16 de março de 2021, em que o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), homologou parcialmente o Plano Geral de Enfrentamento à Covid-19 para Povos Indígenas apresentado pelo governo federal – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 709 – , para o qual a questão da presença ou não em território identificado para o reconhecimento dos povos indígenas é irrelevante, determinando, enfim, o atendimento em saúde também a indígenas residentes em áreas urbanas e terras não homologadas.

Medidas – Com a decisão do TRF1, no prazo máximo de 90 dias, a União deve promover o cadastramento dos grupos indígenas no Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena (SIASI) e a consequente distribuição do Cartão SUS a esses usuários. Também no mesmo prazo, deve promover a contratação de equipes multidisciplinares de saúde indígena, para o atendimento à saúde no Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, de modo regular e efetivo. Deve prestar ainda, por meio do DSEI-MG/ES e do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, atendimento à saúde de modo regular e efetivo aos indígenas dos povos Aranã Índio, Aranã Caboclo e Canoeiros. O atraso no cumprimento dessas medidas pode ensejar multa diária no valor de R$ 5 mil.

Omissão – Conforme relata o MPF em ação civil pública ajuizada em desfavor da União, os grupos indígenas Aranã Índio, Aranã Caboclo e Canoeiros não recebem assistência adequada à saúde pelos órgãos competentes o que configura clara ofensa ao direito à vida e à saúde. Alegações estas plenamente comprovadas pelos elementos juntados aos autos.

De acordo com documento da Fundação Nacional do Índio (Funai), o Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi), vinculado ao Distrito Sanitário Especial Indígena de Minas Gerais e Espírito Santo (DSEI-MG/ES), decidiu há mais de uma década que os referidos povos não seriam mais atendidos pelo polo local da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), em razão de não serem “povos aldeados” e de residirem nas cidades de Coronel Murta e Araçuaí. É colocado ainda que  não havia um critério claro e objetivo adotado pela Sesai para a definição de “índio aldeado”.

Oficiado o DSEI-MG/ES informou que assistiu por um período o povo Aranã e que houve a descontinuidade da assistência aos povos Aranã Índio e Aranã Caboclo em razão da ausência de organização comunitária em território e ausência de organização sociopolítica autoidentificada etnicamente. Em relação ao povo Canoeiros, a assistência não ocorreu porque não houve reconhecimento por parte da Funai da referida etnia. O órgão teria ainda manifestado posição contrária à realização de atendimento a índios não residentes em terras indígenas ou comunidades indígenas aldeadas.

Para o MPF restou demonstrado que os órgãos competentes de atenção à saúde indígena (DSEI-MG/ES e Sesai) buscaram se esquivar da prestação de atendimento aos grupos. Ainda, resta clara a obrigação do estado brasileiro “independentemente do local em que escolham para se estabelecer, mormente em casos em que haja informação acerca da precariedade da assistência à saúde”, narram os autos.

Acesse a decisão.
Processo nº 1001021-89.2021.4.01.3816

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