Cebraspo e Abrapo denunciam chacina no Acampamento Ademar Ferreira, em Rondônia

DENÚNCIA: CHACINA NO ESTADO DE RONDÔNIA – Força Nacional de Segurança e Polícia Militar assassinam camponeses

A presente denúncia se soma às demais, que nos últimos 12 meses, o Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos – CEBRASPO e Associação Brasileira dos Advogados do Povo – ABRAPO têm feito, de que o Estado de Rondônia disponibilizou todo o aparato policial para atacar os camponeses e exterminar os movimentos sociais de luta pela terra. 

O Estado tem se colocado ao lado dos latifundiários com o apoio incondicional do Governo Federal, que colocou à disposição do Estado de Rondônia a Força Nacional, que até o presente momento só efetuou ataques violentos aos camponeses e nada contribuiu para diminuição da pobreza ou da violência no campo, pelo contrário, a famigerada promessa de “Paz no Campo” tem implicado em “Guerra aos Camponeses”.

O Acampamento Ademar Ferreira é composto por famílias camponesas expulsas dos mais diversos espaços sociais, que se organizaram junto ao movimento social de luta pela terra para poderem lutar pelo direito de acesso à terra.

Essas famílias ocuparam a Fazenda Santa Carmen, localizada no Distrito de Nova Mutum, cidade de Porto Velho/RO, em abril de 2021, de forma a pressionar o INCRA a analisar as necessidades dessas famílias e promover a Reforma Agrária – tão determinada na Constituição Federal e tão esquecida da política governamental.

A Fazenda ocupada fica ao lado das fazendas Norbrasil e Arco-Íris, onde está instalado o Acampamento Tiago dos Santos, palco de grandes violações de direitos humanos ocorrido em outubro de 2020, cujas violências e violações foram devidamente divulgadas através do dossiê, que ainda encontra-se disponível no site da ABRAPO: http://abrapo.org/2020/10/26/rondoniaviolacoeseviolenciascontra-o-acampamentotiago/.

As famílias do Acampamento Ademar Ferreira desde o começo da ocupação, sofreram ameaçadas de pistoleiros contratados pela fazenda e de policias, que prestavam serviços de pistolagem para o fazendeiro: constrangendo e ameaçando os camponeses. 

No dia 13 de agosto de 2021, passando da verbalização das ameaças para a prática ilegal concreta, foi realizada uma Operação Policial, planejada e executada pela Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) e pela Coordenadoria de Planejamento Operacional da Polícia Militar de Rondônia, composta pelo Batalhão de Operações Policiais Especiais (BOPE), e do Batalhão de Polícia de Choque (BPCHOQUE) que resultou em 03 camponeses assassinados, além de destruição de casas dos camponeses, queima de motos, destruição de ferramentas de trabalho e alimentos, assim como perseguições à diversas famílias que tiveram que se abrigar na mata.

A operação iniciou, por volta de 07 horas da manhã, onde um jovem foi abordado por policiais que estavam agachados e deitados no chão, em meio à mata. Foi espancado e torturado para que fornecesse informações sobre o acampamento e suas lideranças. Foi conduzido e levado para a delegacia de Nova Mutum Paraná, onde teria assinado um Termo Circunstanciado e liberado em Porto Velho/RO.

De acordo com as famílias, ainda pela manhã do dia 13, em torno de 10 horas, o senhor Amarildo Aparecido Rodrigues e seu filho, o jovem Amaral José Stoco Rodrigues, foram alvejados com tiros efetuados por policiais armados com fuzis, enquanto trabalhavam na preparação da terra.

Pelas fotos do local do assassinato não houve possibilidade de nenhuma reação ao ataque policial.

Segundo relatos dos camponeses e familiares, os policiais do BOPE não estavam em patrulha com suas viaturas, entraram a pé pela mata, com roupas verdes camufladas, capuzes camuflados, agachados e rastejando com seus fuzis nas mãos, “entraram para matar!”. Amarildo foi executado e morto com ao menos dois tiros nas costas, enquanto, que, seu filho, Amaral, fora atingido por vários disparos no peito. 

Para causar mais terror, prenderam uma família inteira, incluindo duas crianças, uma de um ano e outra de oito (com deficiência física e mental). Este mesmo operativo do BOPE, a poucos metros dali, executou o jovem Kevin Fernando Holanda de Souza, que passava de moto, viu os policiais, se assustou e, ao tentar correr, foi alvejado com mais de 30 tiros de fuzil pelas costas, levando-o à óbito no mesmo instante.

Os locais em que os camponeses foram assassinados, conforme demonstram as fotos acima, confirmam que não houve confronto, sequer tiveram tempo para reagir, que as polícias efetuaram execução sumária.

Um outro camponês detido junto com sua esposa, teve seu veículo, um Fiat Strada, alvejado várias vezes no para-brisa dianteiro, também com disparos de fuzis realizado pelo BOPE. A PM diz, em sua versão publicada no site da PMRO, que avistou o veículo vindo de frente e em direção ao BOPE. Os projéteis passaram entre a cabeça deste trabalhador e de sua esposa que estava no banco do carona. Ele parou o veículo na frente dos policiais. As marcas de queimaduras e estilhaços ficaram em seus ombros, por pouco não foram assassinados também.

Houve a detenção de um idoso, que correu para o mato para não ser atingido pelos disparos, mas ao retornar para a estrada foi abordado e preso.

Muitas pessoas disseram que correram para a mata, sob tiros de fuzil efetuados pelas equipes de policiais em solo, além do helicóptero do NOA – Núcleo de Operações Aéreas da Polícia Militar de Rondônia que, em baixa altitude, disparava contra o povo que corria para se abrigar na mata. 

A Associação Brasileira dos Advogados do Povo – ABRAPO teve a oportunidade de colher diversos depoimentos dos camponeses que estavam no Acampamento Ademar Ferreira e tiveram que efetuar fuga da polícia. As narrativas são unânimes em apontar que a polícia chegou atirando numa clara confirmação de que exterminar os camponeses era a missão da Operação Militar.

Os relatos de que os policiais incendiaram carros e motos, vários barracos inteiros, com roupas, colchões, comida, panelas, ferramentas de trabalho e demais pertences das famílias foi confirmado por camponeses que retornaram ao local após a retirada da polícia.

Os 5 camponeses presos foram libertados no dia seguinte. E os desaparecidos foram localizados dentro da mata da Fazenda, muito temerosos do ataque sofrido. Um deles, teve crise alérgica em função das picadas de formigas por ter ficado muito tempo parado no mesmo local, escondendo dos policiais, que caçavam as pessoas como “animais”, inclusive, fazendo uso de cães farejadores.

O fato concreto é que tanto a Força Nacional quanto a Polícia do Estado de Rondônia praticaram ação ilegal, com a intenção clara de exterminar camponeses, num compromisso com o latifúndio.

Trata-se de mais um crime do Estado, fato que tem se repetido e sido denunciado nos últimos tempos em Rondônia, podendo ser destacado:

  • O cerco e a reintegração de posse violenta contra o Acampamento Tiago dos Santos em outubro de 2020;
  • Cerco, perseguição e prisões ilegais no Acampamento Manoel Ribeiro em maio de 2021;
  • E por fim, mais essas execuções, num processo violento de criminalização da luta e dos
  • movimentos sociais de luta pela terra, onde o Estado funciona como verdadeiro “jagunço” dos latifundiários e não garante os direitos humanos, ferindo gravemente o Estado Democrático de Direito.

Urge, que cada organização de defesa dos direitos humanos, a partir de suas práticas e experiências possam reproduzir essa denúncia, efetuar ações de cobranças junto ao Governo de Rondônia sobre essa operação e demais ações com caráter criminalizador dos movimentos sociais de luta pela terra e dos camponeses que têm sido efetuadas de forma orgânica e sistemática por este Estado.

Maiores informações nos colocamos à disposição.”

Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos – CEBRASPO

Associação Brasileira dos Advogados do Povo – ABRAPO

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Lenir Correia Coelho, Advogada Popular, Especialista em Direitos Sociais do Campo – UFG/PRONERA/INCRA, Mestra em Direito Agrário pelo PPGDA/UFG.

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