Membro do grupo Prerrogativas diz ser curiosa e virulenta a reação de general à declaração de Barroso, que criticou quem estaria “orientando” as Forças Armadas a atacar o sistema eleitoral
São Paulo – A nota divulgada ontem (24) pelo Ministério da Defesa contra a fala do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), é uma defesa ao presidente Jair Bolsonaro e não das Forças Armadas. É o que destaca o advogado e integrante do grupo Prerrogativas Fabiano Silva dos Santos, sobre a reação do general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira à declaração de que as Forças Armadas têm sido “orientadas” a atacar o processo eleitoral.
Em entrevista ao Jornal Brasil Atual, o doutor em Direito e professor universitário chamou atenção para o dado “curioso” da nota da pasta, já que as Forças Armadas não foram criticadas pelo ministro do STF, e sim “quem estaria orientando” suas instituições a atacar o processo eleitoral. “Desde 1996 não tem um episódio de fraude no Brasil. Eleições totalmente limpas, seguras e auditáveis. E agora se vai pretender usar as Forças Armadas para atacar? Gentilmente convidadas a participar do processo, estão sendo orientadas para atacar o processo e tentar desacreditá-lo?”, questionava o magistrado.
A fala de Barroso foi feita durante sua participação, por videoconferência, no evento Brazil Summit Europe 2022, realizado pela universidade alemã Hertie School, em Berlim. Embora não tenha citado Bolsonaro nominalmente, o magistrado contextualizou sua posição, lembrando de diversos atos antidemocráticos, encabeçados pelo mandatário. Quando, em relação ao Exército, ele elogiou dizendo que não havia, contudo, nenhuma “notícia ruim” sobre a instituição desde a redemocratização, apesar dessa pressão.
‘Nota é vergonhosa’
“Tenho a firme expectativa de que as Forças Armadas não se deixem seduzir por esse esforço de jogá-las nesse universo indesejável para as instituições de Estado, que é o universo da fogueira das paixões políticas. E, até agora, o profissionalismo e o respeito à Constituição têm prevalecido”, disse Barroso.
No cargo de ministro da Defesa há pouco menos de um mês, por indicação de Bolsonaro, o general Oliveira rebateu as afirmações chamando-as de “irresponsável” e “ofensa grave” às Forças Armadas. Segundo o ministro, que constitucionalmente não deveria ser um militar, a declaração ainda “afeta a ética, a harmonia e o respeito entre as instituições”. O que para o advogado do Prerrogativas apenas comprova o papel que as Forças Armadas vêm desempenhando sobre o governo Bolsonaro.
“Uma nota virulenta como essa contra um ministro da Suprema Corte é algo vergonhoso e mostra bem o nível hoje desse governo. O papel deveria ser de distância, de garantir a lisura do processo eleitoral. (…) Quem fala sobre a garantia do cumprimento da Constituição é o Supremo Tribunal Federal, não é o presidente da República. E assim vai ser nesse e em qualquer outro governo, isso não se muda”, advertiu Santos. “Isso só mostra que as Forças Armadas foram cooptadas. Mais de oito mil cargo são ocupados por militares, eles foram dragados pelo bolsonarismo e essa onda que existe. É lamentável que as Forças Armadas brasileiras prestem esse papel”, acrescentou.
Sinal de alerta
Ainda segundo o advogado, a análise de Barroso é um “sinal de alerta” para o país. No ano passado, o ministro do STF chamou representantes das Forças Armadas para participarem do processo de fiscalização das urnas eletrônicas – atacadas por Bolsonaro e seus apoiadores para a defesa do voto impresso. Mas agora Barroso diz avaliar que elas estão sendo orientadas para desacreditar do mesmo processo.
O próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) chegou a decidir que o general Fernando Azevedo e Silva, ex-ministro da Defesa no governo Bolsonaro, seria o diretor-geral do tribunal, onde ficaria inclusive durante o período eleitoral, em outubro. Mas, depois, o general anunciou a desistência do cargo. “Há algo muito estranho nessa história”, aponta o representante do Prerrogativas. “Eu também não tenho dúvidas de que as pessoas que são colocadas lá pelo Exército visam única e exclusivamente enfraquecer o processo eleitoral, desacreditar o processo porque sabem que a derrota é inevitável. E o argumento que eles já têm é uma eventual fraude no sistema eleitoral”, acrescenta.
“É importante a fala do ministro Barroso e que a sociedade manifeste seu apoio às instituições, em especial ao Supremo e ao TSE, para que a gente tenha eleições no Brasil que reflitam a vontade do povo. Não dá mais para a gente aguentar esse tipo de pressão militar como veio essa nota do Ministério da Defesa com o objetivo claro de atingir o Supremo e o ministro Luís Roberto Barroso. O governo Bolsonaro conseguiu a proeza de desestabilizar as Forças Armadas brasileiras”, conclui.
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