Novas imagens expõem crianças com desnutrição severa na Terra Yanomami

Imagens divulgadas pela Urihi Associação Yanomami mostram crianças da comunidade Kataroa, na região do Surucucu, em Alto Alegre, com desnutrição aguda. Problema crônico na reserva foi revelado em novembro do ano passado pelo Fantástico e g1.

Por g1 RR e Globonews Boa Vista

Novas imagens mostram crianças Yanomami sofrendo com desnutrição grave na Terra Indígena Yanomami, a maior reserva indígena do país. As fotos, divulgadas pela associação Urihi, revelam meninos e meninas extremamente magros e com costelas aparentes, situação dramática semelhante à denunciada pelo Fantástico e g1 em novembro do ano passado.

Desta vez, as fotos que denunciam e expõem o abandono da saúde Yanomami são de crianças que vivem na comunidade Kataroa, região do Surucucu, no município de Alto Alegre, ao Norte de Roraima. As imagens foram exibidas pela GloboNews nesta sexta-feira (9). O problema de saúde pública tem relação direta com a invasão de garimpeiros na reserva indígena.

O flagrante mostra ao menos 17 crianças com desnutrição aguda, além de outras doenças infecciosas, segundo divulgado pelo presidente da Urihi, Júnior Hekurari Yanomami, que também é chefe do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kwana (Condisi-YY).

“O agravo da invasão garimpeira, doenças infecciosas e a desassistência do Dsei aumentam a insegurança da população, resultando em níveis catastróficos de desnutrição”, publicou a Urihi numa rede social.

Crianças yanomami com desnutrição na região de Surucucu, na Terra Yanomami — Foto: Reprodução Instagram Urihi Yanomami

À GloboNews, o advogado do Conselho Indígena de Roraima (CIRR), Ivo Cípio, afirmou que as crianças estão sem assistência médica e sem o acompanhamento da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). O CIRR acompanha a situação.

“Cada dia que passa a situação piora, né? São praticamente 10 mil crianças yanomami sem assistência médica, sem acompanhamento da Sesai por falta de recurso, por falta de equipe médica em área”, ressaltou.

A Urihi deve encaminhar o caso ao Ministério Público Federal (MPF).

“Desde o ano passado vislumbramos muito claramente uma crise humanitária não só pela atividade de mineração ilegal, mas também, mas também pela falta de gestão da saúde Yanomami”, afirma o procurador Alisson Marugal, autor de dezenas de ações judiciais em prol de garantir os direitos do povo Yanomami.

Depois da malária, a desnutrição infantil é um dos maiores problemas de saúde enfrentado pelos indígenas dentro da Terra Yanomami. Um estudo do Unicef (braço da Organização das Nações Unidas para a infância) e a Fiocruz aponta que oito em cada dez crianças menores de 5 anos têm desnutrição crônica – nas regiões de Auaris e Maturacá.

Mulher Yanomami com desnutrição sendo pesada. — Foto: Reprodução Instagram Urihi Yanomami

Descaso na saúde Yanomami

Em novembro, a Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF) realizaram uma operação contra uma fraude na compra de remédios destinados ao Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei-Y).

De acordo com as investigações, o esquema criminoso deixou pelo menos 10 mil crianças indígenas sem medicamentos. Os alvos da operação são empresários e servidores do Dsei-Y – órgão do Ministério da Saúde responsável pela saúde indígena Yanomami.

Entre os alvos da PF estão os dois ex-coordenadores do Dsei Yanomami Rômulo Pinheiro e Ramsés Almeida da Silva – exonerado no último dia 22, a farmacêutica Cláudia Winch Ceolin, o assessor de Ramsés, Cândido José de Lira Barbosa, e o empresário Roger Henrique Pimentel, dono da empresa Balme Empreendimentos LTDA – todos investigados por participação no esquema.

As investigações indicam que os dois coordenadores, à época de suas respectivas gestões, firmaram o contrato com a Balme para o fornecimento de 90 tipos de medicamentos. Mas, a empresa entregou menos de 30% do previsto. O esquema teve a participação dos servidores ligados a eles e do dono da empresa contratada. A estimativa da PF é que esquema de desvio tenha movimentado R$ 600 mil.

A unidade é a mesma que, em março deste ano, estava com a estrutura ameaçada, devido à proximidade de uma cratera a céu aberto causada pelo avanço da atividade garimpeira.

Além disso, os indígenas sofrem com a precariedade na assistência de saúde – em grande parte agravada pelo garimpo ilegal. Na terça-feira (6), a Unidade Básica de Saúde Indígena de Homoxi (UBSI), na região de Homoxi, na Terra Indígena Yanomami, foi incendiada.

“Os garimpeiros ilegal queimaram o nosso posto de saúde Yanomami na região do Homoxi!”, afirmou Dário Kopenawa, vice-presidente da Hutukara.

Segundo a Urihi, o incêndio foi causado por garimpeiros ilegais. A Hutukara Associação Yanomami, mais representativa organização do povo Yanomami, também divulgou imagens do posto queimado e afirmou que o incêndio foi causado pelos invasores.

A suspeita da Urihi é que o incêndio ocorreu em retaliação à operação Guardiões do Bioma, do Ibama, com participação da Polícia Federal, que combate a extração ilegal de minérios e outros crimes ambientais na Terra Indígena. A fiscalização está em curso e já queimou aviões usados por garimpeiros.

Na segunda-feira (5) fiscais estiveram na região de Homoxi e destruíram equipamentos de garimpeiros. Após isso, o posto de saúde foi incendiado, conforme a associação.

“Estamos muito preocupados porque os garimpeiros queimaram a unidade básica de saúde onde essa unidade atende 700 Yanomami, cinco comunidades”, informou Júnior Hekurari, presidente da Urihi.

Terra Yanomami

Maior reserva indígena do Brasil, a Terra Yanomami tem quase 10 milhões de hectares entre os estados de Roraima e Amazonas, e parte da Venezuela. Cerca de 30 mil indígenas vivem na região em mais de 370 comunidades.

A área é alvo do garimpo ilegal de ouro desde a década de 1980. Mas, nos últimos anos, essa busca pelo minério se intensificou, causando além de conflitos armados, a degradação da floresta e ameaça a saúde dos indígenas.

A invasão garimpeira causa a contaminação dos rios e degradação da floresta, o que reflete na saúde dos Yanomami, principalmente crianças, que enfrentam a desnutrição por conta do escasseamento dos alimentos.

Em 2020, o ano da pandemia, o garimpo ilegal avançou 30% na Terra Yanomami. Só o rio Uraricoera concentra 52% de todo o dano causado pela atividade ilegal.

Unidade Básica de Saúde Indígena de Homoxi (UBSI), na Terra Indígena Yanomami, após incêndio. — Foto: Arquivo pessoal

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