Justiça determina que União e município de Entre Rios (SC) retomem medicina tradicional em comunidade indígena

Após ação civil pública do MPF, comunidade do Paiol de Barro terá de volta horto e cozinha para elaboração de remédios tradicionais

Ministério Público Federal em SC

A Justiça Federal acatou pedido do Ministério Público Federal (MPF) e condenou a União e o município de Entre Rios (SC) a providenciarem a retomada, em 60 dias, sob pena de multa, das atividades de medicina tradicional com o uso de ervas terapêuticas na comunidade indígena do Paiol de Barro, localizada na área rural do município. Pela decisão, os entes também devem adotar medidas para revitalizar o horto e a cozinha, que servia de auxílio para elaboração de remédios, além de promover a contratação ou cessão de profissional de saúde para coordenar o serviço.

A medida é resultado de ação civil pública ajuizada em 2017 pelo MPF. Na ocasião, o órgão ministerial constatou que o uso da medicina tradicional no cuidado à saúde dos indígenas – prática comum na região – acabou sendo abandonado, em razão da mudança na gestão municipal. Duas servidoras públicas que exerciam trabalhos na comunidade, auxiliando no preparo de medicamentos, foram removidas da localidade, afetando o modo de vida dos indígenas.

Segundo relato de uma das profissionais – uma técnica de enfermagem que atuou por 20 anos na comunidade – as mulheres da aldeia se reuniam no local para cultivar e ministrar as ervas medicinais. Havia grande demanda pelos serviços, sobretudo de pessoas em busca de chás preparados por elas. A prática é considerada de suma importância na preservação das tradições culturais indígenas.

Na ação, o MPF argumenta que a Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas, das Nações Unidas, prevê o uso da medicina tradicional em complemento às técnicas clássicas de saúde para proporcionar melhor condição de vida a essas populações. Já a Lei 8.080/1990 estabelece como obrigação do Estado brasileiro levar em conta as especificidades da cultura dos povos indígenas nas políticas de saúde voltadas a essa população. “É importante assegurar esse intercâmbio entre a medicina alopática e a tradicional, de modo a se garantir atendimento mais eficaz e que seja capaz de respeitar as tradições e os saberes da comunidade indígena”, sustenta o Ministério Público na ação.

Ao atender o pleito do MPF, a Justiça considerou ser dever do Estado fornecer às pessoas carentes de recursos o acesso à saúde, de modo que a política pública seja exercida em locais apropriados. No caso dos povos indígenas, o acesso à saúde deve ser tratado com a devida distinção, considerando-se aspectos como a língua, tradições e modos de vida. “A atenção aos povos indígenas deve comportar particularidades, sobretudo, no que concerne a uma abordagem diferenciada, não podendo o administrador simplesmente se valer de soluções próprias e genéricas, como se não houvesse especificidades do indígena em relação ao não indígena”, conclui a decisão.

Íntegra da decisão

Arte: Secom/MPF

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

um × 4 =