Apesar do banimento do amianto no Brasil, manobras legislativas e violações de regras sustentam altos riscos à saúde e ao meio ambiente
Por STG News Redação
Apesar do banimento do amianto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2017, o Brasil permanece como o terceiro maior exportador mundial do minério cancerígeno. Graças a manobras legislativas, a exploração continua em Goiás, mas o problema vai além da mineração: o transporte do amianto é uma ameaça invisível que expõe trabalhadores, comunidades e o meio ambiente aos perigos da fibra mortal.
A mina Cana Brava, em Minaçu (GO), é a única operação de extração de amianto ativa no continente americano. Mesmo com o banimento decretado pelo STF, a mineração segue autorizada por leis estaduais que permitem a exportação até 2029. Essa brecha legal sustenta uma cadeia de produção que movimenta toneladas de amianto para portos no litoral brasileiro, desafiando leis e colocando vidas em risco.
O amianto extraído em Minaçu é transportado por rodovias até portos como Santos (SP), Paranaguá (PR) e Belém (PA). Porém, em estados como São Paulo, o transporte de materiais contendo amianto é proibido por lei. Apesar disso, empresas de transporte continuam operando, muitas vezes violando essas regras. Há registros de apreensões de cargas ilegais e até acidentes envolvendo o minério, resultando em contaminação ambiental e riscos à saúde de comunidades próximas às rotas.
O transporte de amianto representa uma ameaça não apenas para os trabalhadores que lidam diretamente com o material, mas também para as comunidades próximas às estradas e portos. As partículas do minério, conhecidas por causar asbestose e diversos tipos de câncer, podem se espalhar durante o deslocamento. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que o amianto seja responsável por cerca de 100 mil mortes por ano em todo o mundo.
São Paulo, que abriga o maior porto do país, em Santos, é um dos estados onde o transporte e o armazenamento de amianto são proibidos. Mesmo assim, há registros de cargas chegando ao porto em aparente violação da legislação estadual. A falta de fiscalização efetiva permite que o minério seja exportado para mercados na Ásia, alimentando uma indústria que já foi banida em mais de 60 países.
A persistência do Brasil em permitir a extração e exportação de amianto contraria tendências globais. Recentemente, os Estados Unidos anunciaram a proibição completa do uso do minério. Enquanto isso, o Brasil mantém sua posição de destaque como fornecedor para mercados como a Índia, expondo-se a críticas da comunidade internacional e manchando sua imagem no cenário global.
“A continuidade da exploração e transporte de amianto depende de uma ação mais firme das autoridades”, diz Fernanda Giannasi, fundadora da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea). Ela ressalta que o transporte de amianto é uma ameaça silenciosa. “Não se trata apenas da mineração; cada carga que sai da mina expõe trabalhadores e comunidades ao risco. A permanência do amianto na cadeia logística brasileira é um reflexo da ineficácia das leis e da falta de fiscalização. Até quando o transporte e a exportação desse minério mortal serão tolerados?”, indaga.
Especialistas defendem que, além de encerrar a mineração, é necessário desmantelar toda a cadeia logística que sustenta o comércio do material, desde o transporte terrestre até a exportação.
Legislação e Proibições
Depois de mais de 30 anos de articulação entre especialistas e organizações que alertam para os riscos que a exploração do amianto impõe à saúde, em 2017 o STF aprovou o banimento completo do produto no país. Mas a lei se mostrou ineficaz: em 2019 a Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) burlou a ordem federal e aprovou a lei estadual Lei nº 20.514, de autoria do Deputado Rubens Marques (União Brasil), para liberar a exportação “enquanto houver capacidade de extração de lavra ou disponibilidade do minério”.
Uma ação de inconstitucionalidade tramita até hoje no STF, que deveria ter apreciado a matéria no último 14 de agosto, mas a suprema corte retirou o item da pauta sem nenhuma explicação. No dia seguinte, a Alego aprovou uma lei protocolada no mesmo dia pelo próprio governo do estado: a lei 22.932 estabelece o generoso prazo de cinco anos para o fim da exploração da fibra em Goiás e, consequentemente, no Brasil. Ambas as leis estaduais foram sancionadas pelo governador Ronaldo Caiado, do União Brasil. O processo ADI 6200 deveria ingressar novamente na pauta do STF em outubro, para discutir a suspensão imediata da atividade econômica, mas foi novamente destacado em 22 de outubro de 2024, ocasião em que o governador Caiado se reuniu com o relator do processo, o ministro Alexandre de Moraes.
A justificativa que ampara essas decisões políticas é o impacto socioeconômico do fim das atividades mineradoras na cidade de Minaçu, que, segundo a Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea) mantém cerca de 300 postos de trabalho na região de 30 mil habitantes.
Riscos à Saúde e ao Meio Ambiente
O amianto é reconhecido por seus riscos significativos à saúde pública, incluindo doenças respiratórias graves e câncer. A exposição pode ocorrer não apenas durante a extração e uso, mas também durante o transporte, especialmente se não forem seguidas rigorosas medidas de segurança. Além disso, o descarte inadequado de resíduos contendo amianto pode levar à contaminação ambiental, conforme destacado pela Resolução Nº 348 do CONAMA, que classifica esses produtos como resíduos Classe D – perigosos à saúde e que exigem disposição em aterros especiais
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Imagem: Capa da Radis 29