Decisão unânime confirma descumprimento de ordem judicial em favor da comunidade Quilombo Água Branca e mantém multa de R$ 5,9 milhões
Procuradoria Regional da República da 1ª Região
Atendendo à manifestação do Ministério Público Federal (MPF), a 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) negou recurso da União contra uma multa de R$ 5,9 milhões por descumprimento de ordem judicial. O acórdão do TRF1 manteve, por unanimidade, decisão anterior do Tribunal que havia determinado multa diária em caso de descumprimento de sentença que condenou a União e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a concluírem a regularização fundiária da comunidade quilombola Água Branca, em Conceição do Tocantins (TO).
De acordo com o MPF, o processo administrativo de regularização fundiária, instaurado pelo Incra em 2008, permanece sem finalização após mais de 15 anos, configurando omissão prolongada e injustificada do Poder Público. Em 2009, o MPF propôs ação civil pública na Justiça Federal e o acórdão condenatório do TRF1 foi proferido há mais de 10 anos, sem qualquer notícia de cumprimento da decisão judicial por parte dos réus. A sentença determinou a conclusão do procedimento de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras tradicionalmente ocupadas pela comunidade quilombola.
A União alegou no recurso ao TRF1 que não teria legitimidade para ser condenada ao pagamento da multa. Porém, a própria decisão descumprida condenou expressamente os dois órgãos, reconhecendo que a regularização fundiária de territórios quilombolas é um procedimento complexo, que demanda atuação conjunta de diversos órgãos federais. Segundo explicado na manifestação do MPF, a União é responsável, inclusive, pela edição de decreto presidencial para desapropriação de imóveis privados situados no território e pela viabilização orçamentária das indenizações.
Para o MPF, a legitimidade da União também decorre de sua competência constitucional para zelar pela guarda da Constituição, das leis e das instituições democráticas, bem como da obrigação de efetivar o direito fundamental assegurado às comunidades quilombolas pelo artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), que reconhece a propriedade definitiva das terras por elas tradicionalmente ocupadas.
Sobre o argumento de excesso no valor da multa, o MPF afirmou que ficou plenamente caracterizada a mora injustificada e a relutância insistente dos entes públicos no cumprimento da decisão judicial. Na manifestação, o órgão defendeu que a multa diária é instrumento legítimo e indispensável, previsto no Código de Processo Civil, para garantir a efetividade das decisões judiciais, especialmente diante do descumprimento reiterado e prolongado da obrigação.
O órgão ministerial ressaltou, ainda, que o valor da multa é proporcional à gravidade da omissão estatal, pois reflete a resistência prolongada da Administração Pública em cumprir uma decisão que assegura direito fundamental à titulação das terras quilombolas. Segundo o MPF, a demora injustificada viola não apenas o artigo 68 do ADCT, mas também os princípios constitucionais da eficiência administrativa e da razoável duração do processo.
Por fim, o MPF explicou que o cálculo do valor milionário levou em consideração a multa diária de R$ 1 mil aplicada durante 3.411 dias de descumprimento, contados de 18 de janeiro de 2014, quando se esgotou o prazo judicial de 360 dias para conclusão da titulação, até 22 de maio de 2023. A decisão judicial determinou, ainda, a expedição de precatório em favor do MPF para o recebimento dos valores da multa, cujo destino final será objeto de decisão judicial após o efetivo pagamento.
Agravo de Instrumento nº 1045358-97.2023.4.01.0000
Processo Originário nº 0015800-89.2009.4.01.4300
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Arte: Secom/PGR
