A Rede Indígena de Memória e Museologia Social, que congrega iniciativas de memória e processos museológicos protagonizados por populações indígenas, vem através desta nota manifestar sua solidariedade e apoio ao povo indígena Pankará, habitante do município de Carnaubeira da Penha, estado de Pernambuco, região Nordeste do Brasil, que na madrugada do dia 2 de maio de 2016 sofreu mais um violento atentado, reflexo da situação de omissão da Funai quanto a continuidade dos procedimentos de regularização do território tradicional deste povo, como também do acirramento dos conflitos sociais que vem aumentando a violência contra as populações indígenas no Brasil, tendo em vista o contexto de disseminação de ódio e intolerância propagado por setores midiático-empresariais aliados às oligarquias e elites político-econômicas nacionais, que atualmente executam uma manobra política com ares de golpe de estado que ameaça nossa jovem democracia.
O espaço sagrado localizado na aldeia Marrapé, onde os Pankará guardavam indumentárias, maracás, cachimbos, peças tradicionais e diversos objetos arqueológicos encontrados em seu território, muitos destes utilizados em rituais religiosos, foi incendiado criminosamente por indivíduos ainda não identificados, na noite do último domingo, 1º- de maio de 2016.
O povo Pankará habita a serra do Arapuá, sertão do estado de Pernambuco, e possui uma história marcada pela resistência secular à tomada de seu território tradicional. Os atuais perseguidores do povo são descendentes dos mesmos grupos familiares que, antigamente, impediam a realização de seus rituais e que não aceitam a demarcação territorial em curso, cujo processo se encontra com Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) (Portaria nº 413, de 24/03/2010) entregue à Fundação Nacional do Índio (Funai) pelo Grupo de Trabalho desde dezembro de 2014.
A cacique Dorinha, importante liderança indígena e que atualmente também exerce um mandato de vereadora pelo município de Carnaubeira da Penha, vem sofrendo diversas ameaças de morte e são constantes as tentativas de impedimento da realização dos rituais religiosos no próprio território indígena. As disputas vem ocasionando conflitos que estão obrigando os Pankará a comprarem a própria terra que lhes pertence, sob o risco de serem expulsos à força pelos posseiros, conforme denunciaram as lideranças Pankará em reportagem ao Conselho Indigenista Missionário/CIMI, publicada dia 03/05/2016.
A Rede Indígena de Memória e Museologia Social, ao denunciar este lamentável episódio, manifesta seu repúdio ao contexto de crescente violência aos povos indígenas no Brasil, que já dura mais de 500 anos. Há algumas semanas atrás, a liderança indígena e estudante da Licenciatura Intercultural do Campus Acadêmico do Agreste da UFPE (município de Caruaru/PE), Yssô Truká, sofreu um grave atentado quando retornava para sua casa, após o término das aulas, sendo alvejado por cinco tiros à queima-roupa. Casos de ataques, preconceitos e violência física contra estudantes indígenas de cursos superiores também foram recentemente registrados nos estados da Bahia e do Rio Grande do Sul. Estes episódios não são esporádicos, e somam-se às graves violações dos direitos indígenas efetuadas por conta de conflitos fundiários em diversos estados brasileiros, com casos muito graves nos estados da Bahia e do Mato Grosso do Sul. O covarde assassinato de um bebê Kaingang, degolado em Imbituba, litoral sul do estado de Santa Catarina, espantou e indignou aos defensores dos direitos humanos em todo mundo.
A Constituição Federal do Brasil, ao garantir o direito aos territórios tradicionais habitados por populações indígenas, reconhecer nossa diversidade sociocultural e as formas próprias de organização social destes povos, reforça nossa compreensão de que os territórios indígenas são parte fundamental do seu patrimônio cultural, constituindo espaços físicos e sagrados onde estão encravadas as memórias de seus ancestrais, Encantados, que muitas vezes, tombaram na luta pela terra.
Por conta de todo esse quadro, a Rede Indígena de Memória e Museologia Social se solidariza com o povo Pankará da serra do Arapuá, manifestando seu repúdio ao ato por entender que se trata de uma grave violência ao patrimônio cultural deste povo, exigindo das autoridades competentes aos níveis municipal, estadual e federal a apuração e a imediata punição de seus responsáveis.
Nossa memória, nossa terra, nossa luta!!!
Diga ao povo que avance! Avançaremos, sempre!!!!