Por Assessoria de Comunicação da Procuradoria da República no Amazonas / Cimi
O Ministério Público Federal (MPF) expediu recomendação à Casa Civil da Presidência da República, ao Estado do Amazonas, ao Município de Manaus e aos Ministérios da Justiça, das Relações Exteriores e do Desenvolvimento Social e Agrário, que requer uma série de medidas a serem adotadas, de forma articulada, para prestar assistência humanitária aos imigrantes venezuelanos que se encontram em Manaus, no prazo de dez dias. O pedido inclui, entre outras ações, garantia de abrigo e alimentação adequados, água potável, assistência médica e vestuário.
Ao Estado do Amazonas e ao Município de Manaus, o MPF recomendou que articulem entre si e com os órgãos competentes do governo federal as medidas de abrigamento aos imigrantes venezuelanos, em especial aqueles que estão vivendo na rua e em situação de vulnerabilidade, em regime de urgência, com local adequado à cultura indígena Warao. O documento pede também a implementação, em 20 dias, de uma política sólida de imigração no estado, que envolva as três esferas de governo, organizações civis e conte com a participação de representantes dos imigrantes venezuelanos indígenas e não indígenas.
O documento pede também à Direção-Geral do Departamento de Polícia Federal que, com o objetivo de resguardar seus direitos, sua integridade física e psicológica, monitore a entrada de imigrantes venezuelanos no país, em especial de crianças, mulheres e gestantes, fiscalizando e reprimindo a ação de autores de eventuais abusos sexuais, tráfico de órgãos e tráfico de pessoas. O MPF requer ainda o fornecimento da documentação necessária para acesso aos serviços essenciais de cidadania a todos os imigrantes em situação de vulnerabilidade.
Foi recomendado à Fundação Estadual do Índio (Funai), à Coordenação Regional da Fundação Nacional do Índio de Manaus e ao Distrito Sanitário Especial Indígena de Manaus (DSEI Manaus) que prestem auxílio imediato aos órgãos do governo federal, estado do Amazonas e município de Manaus, na articulação das medidas de abrigamento e assistência humanitária, à saúde, à educação e demais ações, por meio da atuação de indigenistas especializados, antropólogos e profissionais da área da saúde com experiência no atendimento aos povos indígenas.
Situação de vulnerabilidade
A situação dos imigrantes venezuelanos em Manaus tem sido acompanhada pelo MPF no Amazonas, por meio inquérito civil público instaurado em março de 2017. Em levantamento realizado em fevereiro deste ano, foi notificada a presença de 117 indígenas da etnia Warao em Manaus, alojados no terminal rodoviário e nos bairros Educandos e Centro. A estimativa mais recente, realizada nessa terça-feira (9), levantou que já existem mais de 400 indígenas Warao na capital, além do número crescente dos imigrantes venezuelanos não indígenas.
Visita pericial antropológica realizada pelo MPF aos grupos de indígenas que ocupam área próxima ao terminal rodoviário e casarões no Centro de Manaus confirmou a situação de vulnerabilidade das famílias, em especial das crianças indígenas, nas ruas de Manaus. Foram colhidos relatos de tentativas e de ocorrência de incêndios possivelmente criminosos em um dos locais habitados pelos imigrantes, com o objetivo de afugentá-los. Foi constatada ainda a cobrança de valores abusivos de aluguel praticados por responsáveis de casas que abrigam algumas famílias de indígenas no Centro de Manaus, chegando ao valor diário de R$ 10,00 a R$ 30,00 por pessoa ou família, em locais com mais de 20 pessoas.
Abordagens de segurança
Aos órgãos de segurança pública do Amazonas, o MPF recomendou promover orientação de seus agentes para adequar os eventuais atendimentos e abordagens aos indígenas Warao no estado do Amazonas, em especial aos que se encontram na cidade de Manaus, priorizando abordagens conjuntas com representantes da Funai ou representantes que facilitem o diálogo.
Diante de relatos de suposto uso desproporcional de efetivo policial em abordagem realizada na última semana, no terminal rodoviário, o MPF recomendou ainda a adoção de medidas disciplinares cabíveis, por meio da Corregedoria do sistema de segurança pública, quanto às ações policiais realizadas nos dias 5 e 6 deste mês, informando ao MPF sobre as providências tomadas no prazo de dez dias.
Obrigações legais
De acordo com o MPF, o Estado brasileiro tem o dever de assegurar a prevalência dos direitos humanos e a cooperação entre os povos para o progresso da humanidade nas relações internacionais do país, já que se trata de princípio previsto na Constituição Federal de 1988. No documento, o órgão cita ainda a Resolução Normativa do Conselho Nacional de Imigração (CNIg) nº 126, de março de 2017, que permite a residência temporária por dois anos, com a regularização da situação de estrangeiros de países limítrofes com o Brasil. O conselho foi criado por meio da Lei nº 6.815/1980, que define a situação jurídica de estrangeiros no Brasil.
O MPF destaca ainda que o Brasil é signatário de diversos tratados internacionais que preveem o compromisso às regras de direito humanitário, direitos das crianças e das mulheres. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948, sustenta que todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade, bem como têm a capacidade para gozar dos direitos fundamentais, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.
Por meio do Decreto n. 592, de 6 de julho de 1992, o Brasil também se comprometeu a assumir as obrigações do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, segundo o qual “os Estados Partes do presente Pacto comprometem-se a respeitar e a garantir a todos os indivíduos que se achem em seu território e que estejam sujeito a sua jurisdição os direitos reconhecidos no presente Pacto, sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, religião, opinião política ou outra natureza, origem nacional ou social, situação econômica, nascimento ou qualquer outra condição”.
Os órgãos têm prazo de dez dias para responder ao MPF sobre o acatamento da recomendação e informar quais medidas serão adotadas para cumprir os itens do documento. Caso não sejam atendidas, os destinatários poderão ser responsabilizados na Justiça.
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O pedido do MPF inclui garantia de abrigo e alimentação adequados, água potável, assistência médica e vestuário. Foto: Divulgação/MPF