Nota de repúdio sobre os procedimentos adotados para a realização da audiência pública 009/2018 que trata da prorrogação antecipada do prazo de vigência contratual da concessionária Estrada de Ferro Carajás
A rede Justiça nos Trilhos, coalizão de organizações, movimentos sociais, pastorais, sindicatos, núcleos universitários, que atuam em defesa dos direitos das comunidades que vivem nas áreas atravessadas pela Estrada de Ferro Carajás, nos estados do Pará e do Maranhão, manifesta publicamente repúdio ao modo como o a audiência pública em questão vem sendo executada.
Em 8 de agosto de 2018 a Agência Nacional de Transportes Terrestres- ANTT tornou público os locais e endereços para realização das sessões presenciais bem como o prazo para o envio de contribuições por escrito (9/8/2018 até 24/8/2018). Em agosto e setembro de 2018 foram realizadas três sessões presenciais: em Belém (27/8), em São Luís (29/8) e Brasília (17/9).
Por ocasião da sessão presencial realizada em São Luís (MA), em 29/8/2018, membros da rede Justiça nos Trilhos se manifestaram publicamente sobre as deficiências no procedimento da audiência pública, já que, nos moldes propostos, a participação social nesse processo está sendo profundamente prejudicada tendo em vista que o objeto da audiência pública é de grande importância para as populações de diversos municípios localizados no interior dos estados do Maranhão e do Pará. Neste sentido, a insuficiente divulgação sobre as datas e locais para realização das sessões públicas, a quantidade insuficiente de sessões presenciais e o pouco tempo disponibilizado para a análise do material produzido pela ANTT (cerca de 800 páginas de documentos) já eram fatos que geravam grande preocupação e indignação. Naquela sessão foi proposto por Justiça nos Trilhos que a ANTT realizasse sessões presenciais em todos os 23 municípios maranhenses impactados pela estrada de Ferro Carajás, com ampla e prévia divulgação em jornais locais, escolas e repartições públicas em geral.
Em 24 de setembro de 2018, a ANTT divulgou comunicados por meio dos quais prorrogou o prazo da audiência pública por mais 30 dias e determinou a realização de uma nova sessão presencial na cidade de São Luís (MA), a ser realizada em 10 de outubro de 2018.
Ocorre que, essa nova sessão presencial não altera a situação exposta acima afinal a maioria das comunidades impactadas pelas operações da Estrada de Ferro Carajás estão localizadas no interior do estado e no meio rural. Frise-se ainda, que entre elas estão comunidades seculares, muitas delas indígenas e quilombolas. Desse modo, novamente denunciamos o descaso e as ações de boicote da ANTT, que visam dificultar e impedir a ampla participação destas pessoas no processo de audiência pública.
A postura da ANTT, apesar de nos indignar não nos causa estranheza, já que o próprio relatório final elaborado para audiência pública 009/2018 não considerou como Atores envolvidos na ação regulatória as comunidades afetadas direta e indiretamente pela EFC (cerca de dois milhões e trezentas mil pessoas) e tampouco os usuários do serviço de transporte de passageiros da EFC, o que, a nosso ver, inviabiliza e torna inexpressivo todo o estudo apresentado[1]. Por óbvio que a ANTT, ao invisibilizar essa parcela importante de atores envolvidos, não obteve êxito em apresentar uma perspectiva real nos cenários analisados exatamente porque não identificou e avaliou os impactos da ação regulatória sobre esses atores.
A conclusão a que se chega é que os grupos descritos acima, além de não terem sido considerados no estudo realizado pela ANTT, estão sendo reiteradamente tolhidos em seu direito a participação no âmbito da audiência pública em questão, o que é injustificável. Ademais, cabe evidenciar que são estes os atores que, na prática, terão de arcar com os principais impactos negativos da ação regulatória em questão. Portanto, a rede Justiça nos Trilhos denuncia publicamente a forma desrespeitosa e negligente com que a ANTT tem dirigido esse processo de audiência pública, tornando-o incapaz de cumprir os objetivos aos quais se destina.
São Luís, 09 de outubro de 2018.
Nota:
[1] Adotamos os dados do IBGE, previsão de população nos 27 municípios impactados pela EFC no Maranhão e Pará, em 2018.