Cursos online vão até dezembro com representantes de diferentes localidades, a maioria mulheres
Mariana Castro, Brasil de Fato
Desde os primeiros impactos da pandemia de covid-19 no país, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) tem praticado ações de solidariedade, sob o lema da campanha Mãos Fraternas: “o povo cuidando do povo”.
É sob essa perspectiva que tem sido desenvolvido, também, um processo nacional de formação de agentes populares de saúde. No Maranhão, a aula inaugural aconteceu no sábado, dia 3 de outubro, e contou com a representação online de comunidades camponesas, ribeirinhas, quilombolas, quebradeiras de coco e mulheres trabalhadoras da cidade.
O curso é uma oportunidade para o reconhecimento, valorização e partilha dos saberes das comunidades tradicionais amazônicas, que vivem em relação de interdependência com a natureza e mantêm costumes e conhecimentos de cuidados com ervas e plantas medicinais.
“É um momento também de reconhecer os nossos hortos comunitários, de produção de ervas para os chás, as pomadas, os xaropes, que são produzidos por esses diversos grupo não só do campo, mas também da cidade”, diz Gilvânia Ferreira, da coordenação estadual do MST.
Andreia Campigotto, da Rede de Médicos e Médicas Populares do MST, explica que a ação segue a premissa dos movimentos populares, que sempre priorizaram a vida e o cuidado com o próximo. “Essa iniciativa de formar agentes populares de saúde vem também no sentido de cuidar das nossas vidas. São lideranças locais, pessoas que são referência, que querem cuidar do povo e tem essa disponibilidade, como voluntárias, para fazer essa tarefa tão nobre que é cuidar do outro”, diz.
No Maranhão, o curso é uma iniciativa do MST em parceria com a Universidade Federal do Maranhão (UFMA), por meio do Núcleo de extensão e pesquisa com populações e comunidades rurais, negras, quilombolas e indígenas (NuRuNI), do Programa de Pós-Graduação em Saúde e Ambiente.
Para o professor István van Deursen Varga, do Departamento de Sociologia e Antropologia da universidade e coordenador geral do NuRuNI, o projeto coloca cada vez mais clara a perspectiva de que a produção de conhecimento deve estar a serviço da sociedade.
“Nossos projetos de pesquisa partem de demandas, de problemas identificados pelas próprias comunidades, segmentos sociais com os quais a gente trabalha. Nós partimos desses problemas para a produção de conhecimento. Entendemos que a pesquisa deve servir à sociedade em que a universidade está inserida, e não o contrário”, afirma Varga.
Um dos problemas a ser enfrentado pelo MST com o apoio da UFMA é a falta de políticas públicas de apoio às comunidades tradicionais e periféricas em meio à pandemia. Para o movimento, não há um plano concreto de enfrentamento e o governo federal vem assumindo uma postura genocida, priorizando o lucro acima das vidas.
“Um plano de enfrentamento à pandemia não vai conseguir ser efetivado se nós não tivermos a participação popular, se o povo brasileiro não estiver junto. Um país onde o maior representante esquece do seu povo, claramente não prioriza as vidas, prioriza o lucro, acaba levando o país a um desastre ainda maior”, afirma Campigotto, da rede de médicos populares.
A senhora Maria José, de 56 anos, vive no assentamento Cipó Cortado (MA), região marcada pelo trabalho escravo, grilagem de terra e assassinatos de camponeses. Ela conta com orgulho sobre a oportunidade de aprender, e poder ajudar a comunidade.
“Gostei muito e tenho certeza que vamos aprender muito mais, porque não vamos perder nenhuma aula. A gente vai aprender a orientar as pessoas sobre o coronavírus, porque tem muitas pessoas aqui que não sabem nem o que é o coronavírus”.
O curso segue até dezembro de 2020, com aulas online todos os sábados. Para além disso, o MST do estado segue com as demais ações de solidariedade às comunidades tradicionais, especialmente por meio da doação de alimentos.
Edição: Rogério Jordão.
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Imagem: Médicos Populares em assentamento no Sul da Bahia. Foto: Coletivo de Comunicação MST/BA