Carta aberta de apoio e solidariedade à população tradicional pesqueira de Tatajuba/Camocim/CE

No Terramar

Nós, movimentos sociais, redes, pastorais, grupos de pesquisas, advogados/as populares, ativistas, ambientalistas e entidades da sociedade civil, manifestamos nosso absoluto apoio às causas comunitárias em defesa do território tradicional de Tatajuba-Camocim/CE, denunciamos o agravamento do conflito fundiário e ambiental gerado pela especulação de empresários do turismo convencional, cujos interesses estão voltados para a superexploração dos ecossistemas e das paisagens naturais, provocando conflitos locais, expropriação da população tradicional local e seus modos de vida.

Entenda:

Tatajuba é reconhecida como um território de tradicionalidade pesqueira, constituído por manguezais, dunas, paleodunas, lagoas e sítios arqueológicos. Para além da sua beleza cênica – impertinente visada – esse território possui alta importância ecológica, econômica e cultural para mais de 400 famílias que ali vivem, sendo utilizado, também, por outras 18 comunidades pesqueiras da região. No começo dos anos 2000, a empresa Vitória Régia Empreendimentos Imobiliários, posteriormente, Vitória Régia Participações Ltda, do estado do Rio de Janeiro, se apresentou como dona das terras em que, na época, 247 famílias de pescadores residiam, trabalhavam e preservavam há séculos. A população local tomou conhecimento dessa pretensa propriedade em 2001 quando famílias foram processadas e ameaçadas de perder suas moradias, através de Ação de Reintegração de Posse movida pela Vitória Régia.

Frente a esse contexto, em 2001, 11 sócios(as) da Associação comunitária de Tatajuba, entram na Justiça questionando a validade das matrículas apresentadas pela Vitória Régia (Processo inicialmente na Justiça Estadual/CE, seguido da Ação Anulatória na esfera Federa l – 18a Vara Federal – SJ de Sobral com no 0002390-82.2012.4.05.8103).

Ao longo desses 20 anos, tal empresa foi vendida e revendida, passando o objeto da Ação Anulatória (duas matrículas de terras) para Bhg S.A.- Brazil Hospitality Group e mais recentemente sendo incorporada à Camocim Empreendimentos Turísticos Imobiliários Ltda, com sede na cidade de São Paulo e em Camocim/CE e com investimento internacional.

Nesse tempo, cresceram movimentações de ocupação ilegal, compra e venda de terras, além de uma série de crimes ambientais que foram fartamente denunciados. Com o avanço da especulação imobiliária cotidiana, a comunidade luta pelo reconhecimento e garantia do território tradicional e coletivo, a partir de alguns instrumentos como:

  • Pedido para criação de Reserva Extrativista, não efetivado;
  • Mapeamento de sítios arqueológicos;
  • Diálogos e incidências junto à Secretaria de Desenvolvimento Agrário (SDA) e ao Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará (IDACE), primeiramente com estudo sobre a cadeia dominial de Tatajuba em 2001 e mais recentemente com retomada do processo para Regularização Fundiária das Posses dos comunitários das 4 Vilas;
  • Atuação junto às organizações da sociedade civil e entes do Estado, resultando na criação do GT Tatajuba, que realizou estudos sobre os ecossistemas locais;
  • Pedido de Termo de Autorização de Uso Sustentável (TAUS) aberto junto à Secretaria do Patrimônio da União (SPU).

Desde a chegada da Vitória Régia, muitas violências aconteceram contra moradores locais, como agressões físicas e tentativas de assassinato. Hoje é sabido que enquanto se aproxima a sentença judicial, os empresários têm aumentado, de forma preocupante, as tensões históricas, a partir de promessas sem consistências e garantias, com um trabalho de manipulação e pressão psicológica sobre a população, disseminação de desinformações, promovendo reuniões com aglomerações locais, para que sejam atendidos de qualquer forma, às urgências dos investidores.

Nesse contexto, há uma crescente coação aos comunitários que ajuizaram a ação judicial e à sua advogada. Assim, tememos pela segurança e integridade desses que estão legitimamente na busca pela garantia e defesa dessas terras históricas e tradicionalmente ocupadas. Isso que vem acontecendo hoje na região de Tatajuba reflete o atual contexto brasileiro de agudização dos conflitos socioambientais e das violações de direitos humanos, com o desmonte das políticas ambientais e de regularização fundiária. Circunstâncias que agravam a vulnerabilização das populações tradicionais, somatizando os impactos da pandemia Covid-19 e das crises econômicas.

É URGENTE, pois, que o Estado atue a partir do reconhecimento da tradicionalidade das famílias que residem em Tatajuba e em suas quatro vilas: Vila Nova, Baixa da Tatajuba, Vila São Francisco e Tatajuba, garantindo, assim, os DIREITOS REAIS de USO e OCUPAÇÃO dessas famílias.

É preciso assegurar os direitos dessa população à terra e ao território, que além das áreas de moradia constitui-se dos ecossistemas marinhos e costeiros associados; assim como o direito à AUTOGESTÃO das atividades socioeconômicas tradicionais e, especialmente, o direito a uma VIDA PACÍFICA. Esses são direitos reconhecidos pela legislação nacional e internacional, com vista a promover a JUSTIÇA SOCIAL e AMBIENTAL.



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