Em vitória histórica, STF reconhece proteção do clima como dever constitucional

Com placar de 10 a 1, Supremo reconhece omissão deliberada do governo federal na gestão do Fundo do Clima e determina o restabelecimento do mecanismo

Por Duda Menegassi, em ((o))eco

Com o placar de 10 votos favoráveis e apenas um contra, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu nesta sexta-feira (1º) um julgamento histórico sobre o dever constitucional de proteção ao clima. A ação alegava omissão deliberada do governo federal na paralisação e no contingenciamento de recursos do Fundo do Clima. Com a decisão do STF, determina-se que a União pare de obstruir o funcionamento do fundo e garanta a continuidade da captação de recursos e sua efetiva alocação.

Ao todo, nove ministros seguiram o voto do relator, Luís Roberto Barroso, que julgou procedente a ação – Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 708 – movida em junho de 2020 por quatro partidos políticos: PSB, PSOL, Rede e PT. 

“O Poder Executivo tem o dever constitucional de fazer funcionar e alocar anualmente os recursos do Fundo Clima, para fins de mitigação das mudanças climáticas, estando vedado seu contingenciamento, em razão do dever constitucional de tutela ao meio ambiente, de direitos e compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, bem como do princípio constitucional da separação dos poderes”, defende Barroso em seu voto.

Apenas o ministro Nunes Marques divergiu o voto e afirmou que não constatou “a alegada omissão, visto que o “Fundo Clima” é apenas um dos vários instrumentos à disposição da Administração Pública para execução de política pública de proteção ao meio ambiente”.

Já o ministro Edson Fachin acompanhou o voto de Barroso com a ressalva de que também seja determinado ao governo federal publicar um relatório trimestral que evidencie o percentual de gastos do Fundo do Clima nos cinco segmentos (energia, indústria, agropecuária, uso da terra e resíduos) e que seja formulado periodicamente o Inventário Nacional de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa, com segmentação por estados e municípios.

O julgamento, que foi realizado em plenária virtual, teve início na madrugada do último domingo (24), quando o relator do processo, o ministro Luís Barroso, publicou seu voto em favor da ADPF. O placar da maioria no Supremo já havia sido conquistado na quarta-feira, quando a especialista-sênior em Políticas Públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo, adiantou-se em comemorar a vitória histórica.

“Esse julgado na prática terá um alcance bem mais amplo do que o Fundo Clima: a decisão favorável à ADPF 708 traz o precedente fundamental de que a omissão no uso de recursos destinados à política climática é inconstitucional. O poder público não tem o direito de optar pela não política pública nesse campo”, analisou Suely.

Os advogados Rafael Carneiro e Felipe Corrêa, que assinam a ação em nome do PSB, também comemoraram a decisão. “O STF reafirma que a proteção ao meio ambiente é um dever constitucional, sobretudo diante de um cenário tão grave de emergência climática. O inconstitucional bloqueio dos recursos do Fundo Clima não só viola normas nacionais como descumpre uma série de compromissos internacionais firmados pelo Brasil, colocando em xeque o bem-estar das atuais e futuras gerações”, declararam os advogados.

Manifestação pelo Dia Mundial de Ação pela Justiça Climática em Paris aponta o presidente brasileiro Jair Bolsonaro como um dos líderes cuja inação climática coloca o planeta em perigo. Paris, 6 de novembro de 2021. © Paloma Varón/RFI

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