Clarice Mbya Guarani, da comunidade indígena de Barra do Ouro, foi constrangida e agredida por policiais rodoviários após abordagem ao motorista da Uber de quem usufruía os serviços; os indígenas cobram providencias das autoridades
No Cimi
Lideranças Mbya Guarani denunciam abuso de poder, constrangimento ilegal, intimidação e preconceito contra mulher indígena por agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF), do posto policial localizado na BR 101, em Osório, no Rio Grande do Sul (RS). Na tarde do dia 20 de julho de 2022, entre às 15 e 16 horas, Clarice Mbya Guarani da comunidade indígena de Barra do Ouro se dirigia de Uber para a Comunidade Sol Nascente, na mesma localidade, quando, após abordagem ao motorista da empresa de transporte privado Uber, de quem usufruía os serviços, foi constrangida e agredida por policiais rodoviários.
De acordo com o relato do motorista da Uber, que não será identificado por segurança, ele foi abordado para mostrar carteira de habilitação, documento do veículo e, ainda, obrigado a abrir porta-malas para averiguações. Não satisfeitos, os agentes passaram a interrogar a indígena de forma autoritária e também recolheram os documentos para averiguações.
Percebendo se tratar de uma mulher indígena, queriam saber para onde estavam se deslocando, chegando a inquirir o motorista sobre o que ele pretendia com a Clarice Mbya Guarani. O motorista explicou que foi contratado para leva-la a uma outra comunidade indígena, também em Osório. “Um dos três policiais, o mais exaltado, retrucou de forma rude que em Osório não havia nenhuma comunidade indígena”, contou o motorista.
Na sequência, esse mesmo policial se dirigiu a Clarice, de forma descontrolada, querendo saber dela para onde iria e o que iria fazer. Clarice tem como língua mãe o Guarani e, por isso, sente dificuldade de falar português, além do que, se encontrava muito nervosa e com medo diante da brutalidade daquela abordagem.
Conforme relato do motorista da Uber, chegou um dado momento que a indígena mal conseguia responder as tantas perguntas. Ele conta que o policial que a interrogava queria obriga-la a falar somente em português, chegando a dizer que ela era obrigada a saber falar português, porque ele [policial] não tem a obrigação de saber Guarani. Esse policial proferia palavras ofensivas e de baixo calão a indígena. “Clarice estava quase em pânico e não conseguia mais falar, a situação ficou muito tensa, chegando a constranger os outros dois policiais”, contou.
Depois de muitos palavrões, intimidação, constrangimento ilegal, abuso de poder e as mais variadas formas e expressões de preconceito contra Clarice Mbya Guarani, os policiais decidiram liberar o veículo, mas não sem deixar de proferir impropérios, chegando a afirmar que não queriam mais vê-los pela rodovia.
Por meio de áudio enviado pelo aplicativo de trocas de mensagens Whatsapp, o motorista do aplicativo informou o fato às lideranças indígenas da Comunidade Barra do Ouro, que denunciaram a violência às entidades indigenistas e instituições públicas que prestam assistência às comunidades na região.
Conforme o Conselho indigenista Missionário (Cimi) Regional Sul, que acompanha o caso, os fatos narrados são graves, precisam ser adequadamente investigados pelo Ministério Público Federal e acionado o comando da Polícia Rodoviária Federal para que se identifique os policias e que estes sejam responsabilizados civil e também criminalmente, pois fatos como esses não podem ser admitidos e tolerados. “Nunca é demais lembrar que, recentemente, policiais rodoviários federais abordaram um homem em Aracaju e o constrangeram, espancaram, torturaram e o mataram no porta-malas da viatura transformada, por eles, numa espécie câmara de gás”, lembra o Regional.
Os indígenas cobram providencias das autoridades e exigem um “basta de racismo, basta de violência, basta de truculência, de ameaças e de constrangimento policial. Eles não estão acima da lei, eles devem respeita-la”, afirmam.
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Imagem:Registro da mobilização indígena contra a violência. Foto: Apib/ Divulgação