MPF/SP quer que Rede Record veicule retratação sobre comentários feitos durante o programa Cidade Alerta

Apresentador Marcelo Rezende fez comentários que pressupunham a culpa de dois suspeitos e sugeria que policiais atirassem neles; emissora transmitiu a perseguição ao vivo

MPF SP

O Ministério Público Federal em São Paulo ajuizou ação civil pública contra a Rede Record e a União, devido à incitação à violência durante exibição ao vivo de uma perseguição policial. Na ação, o MPF pede que a emissora transmita uma retratação e que a União fiscalize o conteúdo veiculado pelo programa Cidade Alerta.

O fato que motivou a ação ocorreu em 23 de junho de 2015 e foi informado ao MPF por meio de uma representação da organização Intervozes Coletivo Brasil de Comunicação. Na ocasião, o programa Cidade Alerta exibiu uma perseguição policial a dois homens que seriam suspeitos de roubo. Durante a ação, transmitida ao vivo, o apresentador do programa, Marcelo Rezende, fez declarações contra os suspeitos, atribuindo a eles a autoria do crime de roubo e pediu, por várias vezes, que o policial atirasse nos homens.

Para o autor da ação, o procurador da República Pedro Antonio de Oliveira Machado, da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão em São Paulo, as imagens mostradas eram inapropriadas para o horário e não respeitavam a finalidade educativa e cultural a que estão subordinadas as emissoras de televisão. O Coletivo Intervozes lembrou que a exibição das imagens e o discurso do apresentador ferem o capítulo V da Constituição ao violar direitos humanos e fazer apologia à violência, além de desrespeitar o princípio da presunção de inocência. Na avaliação do procurador o teor do discurso do apresentador tem forte relevância social já que ele é um formador de opinião e, por esse motivo, deveria prezar por não incitar a violência e zelar pela dignidade humana.

Questionada sobre o ocorrido, a Rede Record alegou que pelo fato de ter sido uma transmissão em tempo real não havia possibilidade de escolher as imagens que seriam veiculadas e também não era possível prever o desfecho da ação policial. A emissora ainda se justificou argumentando que a nitidez das imagens estava prejudicada, sendo impossível identificar as pessoas envolvidas na ação. Para o MPF, no entanto, ao autorizar e transmitir a perseguição, a Rede Record assumiu a responsabilidade pelo resultado. Além disso, diferente do que alegou, a emissora teve a opção de escolha, uma vez que voltou a exibir as imagens gravadas da perseguição.

PEDIDOS

O MPF requer que a Rede Record veicule uma retratação, por dois dias úteis, no mesmo horário do programa Cidade Alerta, em que deixe claro que a emissora não compactua com o posicionamento de hostilidade e incitação à violência, adotado pelo apresentador Marcelo Rezende durante a transmissão da perseguição policial aos suspeitos. Em caso de descumprimento, a emissora deverá pagar multa de R$ 97 mil por dia. A retratação deve durar o mesmo tempo da reportagem exibida em 23 de junho.

A televisão (radiodifusão de sons e imagens) é um veículo de comunicação social que, de acordo com a Constituição Federal (art. 21, XII, “a”), é um serviço público da União, no caso, explorado por empresa privada (Rede Record), mediante concessão do Poder Público. Mesmo considerada a liberdade de imprensa e de expressão, a sua programação deve sempre observar os valores e princípios constitucionais, dentre eles a inviolabilidade do direito à vida, a dignidade da pessoa humana, a cidadania, a promoção do bem de todos, a prevalência dos direitos humanos e, enfim, o repúdio à violência, por ilegalidade ou abuso de poder.

Para o procurador, os princípios da liberdade de imprensa e de expressão, antes de pertencerem a qualquer veículo de imprensa ou mídia, são conquistas da sociedade, exercitáveis com vista ao bem comum, isto é, a serviço da coletividade, ante o que consta no preâmbulo da Constituição sobre os objetivos do Brasil como Estado Democrático de Direito, que é assegurar o “bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias”

Na ação, o MPF pede também que a União fiscalize o programa, sob a perspectiva do que é estabelecido no artigo 221 da Constituição Federal, que prevê a observância dos seguintes princípios para a produção e programação das emissoras de rádio e tv: preferência a finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas; promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que objetive sua divulgação; regionalização da produção cultural, artística e jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei e respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

A ação pode ser consultada no site http://www.jfsp.jus.br/foruns-federais/ sob o número o 0026302-55.2015.4.03.6100.

Assessoria de Comunicação
Procuradoria da República no Estado de S. Paulo

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