“No dia 12/02/2016, na Delegacia da Capitania dos Portos localizada, em Itacuruça, houve uma reunião, com a participação de representantes das seguintes instituições: INEA, MPF do Rio de Janeiro e de Angra dos Reis, UERJ, Secretaria de Portos, Marinha do Brasil (Submarino Nuclear), a APLIM (Associação de Pescadores e Lavradores da Ilha da Madeira), APESCA (Associação de Pescadores Artesanais Galpão dos Pescadores Waldemiro Joaquim Coelho – Itaguai), APIMIM (Associação dos Pescadores e Maricultores da Ilha da Marambaia), AMAR (Associação de Maricultores e Pescadores de Mangaratiba) e APAPG (Associação de Pescadores e Aquicultores da Pedra de Guaratiba), Instituto Boto Cinza, Diretora Geral de Pesca da Prefeitura do Município de Itaguaí, onde foi registrada a ausência da Companhia Docas do Rio de Janeiro.
A reunião foi solicitada pelo Procurador da República Sérgio Suiama do Ministério Público Federal no município do Rio de Janeiro, com o objetivo de esclarecimentos sobre o problema das áreas de fundeios e das dragagens do canal de acesso ao Porto de Itaguaí, bem como a questão da duplicação do canal de acesso. Foi debatido sobre a expansão industrial e portuária na Baía de Sepetiba, o que tem gerado crise junto aos pescadores artesanais e também a intensificação da morte dos Botos.
Não há, de fato, estudos profundos, científicos e específicos sobre a mortandade do Boto. No entanto, relatado pelos próprios pescadores e publicado pelo próprio Instituto Boto Cinza, que a partir de 2010, ano em que as empresas começaram a utilizar equipamentos mais sofisticados para sondagem, por geofísica e por batimetria, em que era utilizada uma linha por vez e hoje usa-se multi-feixe, ou seja, usando 12 linhas por vez, interferindo assim na vida dos mamíferos aquáticos, pois os mesmos se orientam através de eco-localização. Esta tecnologia quando passada em determinada região durante um período de 5 dias, nenhum peixe fica próximo ao local por estarem desorientados.
Fala-se de que é a rede do pescador que vem matando o Boto, porém não há registro sólido que seja a rede causadora das mortes. Entre os pescadores não há relatos de que os Botos, tartarugas e outros peixes maiores tenham sido mortos por suas redes. Em casos raros, o que se observa são animais doentes, magros, cujas causas necessitam serem estudadas. Vale ressaltar, que a baía de Sepetiba tem um passivo, causado pela Empresa Ingá, que ao longo de mais de cinquenta anos foi despejado metais pesados e que ao longo das dragagens, essas plumas com contaminantes são levantadas, e com isso os peixes se contaminam e os botos acabam por se contaminar por ser topo de cadeia alimentar. Nós, pescadores, sempre convivemos com os Botos de forma harmônica e pacifica. A expansão da indústria, o tráfego de navio e dos portos têm gerado crises tanto para os pescadores, como para os botos. Somos todos vitimas do processo de degradação do ambiental da Baia de Sepetiba.
Iniciado em 2011, as obras do Porto Sudeste e a Base Naval da Marinha do Brasil estavam utilizando as mesmas dragas para serviços diferenciados, levando lama do Porto Sudeste para despejo fora da Baía de Sepetiba e na volta carregavam de areia para Base Naval. Iniciando os impactos, o que se fez necessário a criação de uma comissão de dragagem com as entidades de pesca, IBAMA, INEA, Capitania dos Portos, Docas do Rio de Janeiro, Instituto Boto Cinza, Prefeituras de Itaguaí e Mangaratiba.
Em uma determinada reunião da referida comissão foi detectado que na área do despejo foram encontrados metais pesados acima dos padrões tolerados e o aumento das algas marinhas no saco de Coroa Grande, em que as comunidades pesqueiras questionavam que o material dragado fosse lançado em outro local. Tal comissão foi encerrada em 2012, quando a Porto Sudeste comunicou o fim das dragagens. Em uma das reuniões da referida comissão, a Dr. Alpina Begossi, da UNICAMP, que fez um trabalho com os pescadores da Baía da Ilha Grande, relatou que os mamíferos aquáticos daquela região estavam com índices de metais pesados alarmantes.
Em 2013 não houve dragagem na Baía, havendo em 2014 uma derrocagem e dragagem licenciadas pelo órgão licenciador (INEA), sendo que a comunidade de pescadores em nenhum momento teve o acesso permitido para constatar qualquer dano à fauna local.
Voltando ao assunto que é a reunião do dia 12 o Procurador Sérgio fez os seguintes encaminhamentos: Elaboração de uma avaliação global ambiental sobre o processo de degradação na Baía junto as entidades, ao INEA e às Prefeituras para implementação do Plano de Gerenciamento Costeiro. O outro encaminhamento foi na direção da compreensão dos territórios pesqueiros artesanais, junto com a Universidade Estadual do Rio de Janeiro, a fim de serem reconhecidos frentes a nova ação de duplicação do canal que se encontra em tramitação no INEA solicitado por Docas. O encaminhamento da Procuradora Monique Checker relatou que caberia a Polícia Federal, Capitania dos Portos, INEA e ao IBAMA a fiscalização da pesca predatória dentro da Baía.
No dia 17/02/2016 fomos todos surpreendidos por uma reportagem veiculada pela Rede Globo de Televisão através do Telejornal Bom Dia Brasil com forte ênfase de que o pescador artesanal mata Boto. No dia 19/02/2016 no Blog do Ancelmo Góes foi anunciado um Termo de Ajuste em que a Transpetro disponibilizaria a quantia de R$ 6 milhões para a preservação dos Botos. Vale ressaltar que a empresa Transpetro foi à responsável pelos dois crimes ambientais. Derramando óleo, primeiramente entre os Municípios de Angra dos Reis e Mangaratiba e o segundo entre Mangaratiba e Itaguaí, no Rio Itingussú, derramamentos tais que alcançaram a Baía de Sepetiba, destruindo os materiais dos pescadores inclusive manguezais.
Registramos ainda que no dia 25/02/2016 o agente do IBAMA de nome Felipe Bonifácio acompanhados de dois policiais federais com armas em punho em direção aos pescadores, em lanchas sem identificação, abordaram a Embarcação tipo Caíque a remo tripulada por dois pescadores artesanais de nome: Ramon da Silva e Adailson Souza, ambos de nossa comunidade, portadores de RGP – Pesca Artesanal. O agente e os policiais disseram que só não levaram a embarcação presa, pois já tinham apreendido a embarcação Dudamar, sendo que esta não estava pescando dentro da Baía.
Relata nesse momento, o proprietário da embarcação Dudamar, falando que dois agentes do IBAMA e dois da Policia Federal com armas em punho e apontadas para os pescadores, apreendendo a sua rede de pesca, a sonda do barco e o barco, onde o mesmo encontra-se na boia em Itacuruçá, local de origem de registro. Sendo emitida multa de cinco mil reais.
Estranhamos o fato da embarcação tipo caíque do pescador artesanal Ramon ser abordado pelos agentes já citados, quando que mesmo momento havia três embarcações de arrasto pescando no local. Uma prática de crime ambiental, conforme legislação vigente. Entendemos que os mesmos deveriam ser abordados em razão de não ser embarcações do porto da Baia de Sepetiba.
No dia de hoje, 26/02/2016, todos os pescadores estão temerosos devido à abordagem dos agentes do IBAMA e da Polícia Federal, fazendo com que os mesmos deixassem de exercer sua atividade de trabalho e renda, pois foram ameaçados que se continuassem pescando, pois eles levariam (levarão) os pescadores presos.
Neste sentido, estando aqui organizados e indignados junto ao Gabinete da Diretoria Geral de Pesca da Prefeitura do Município de Itaguaí, solicitamos medidas cabíveis para esse caso, em razão da violência institucional, de acordo com o comportamento inadequado dos agentes. Destacamos que sempre estivemos abertos ao diálogo, inclusive com o MPF cujo Procurador Sérgio Suiama vem fazendo um trabalho com forte diálogo com todos os pescadores da Baía de Sepetiba.
Os pescadores artesanais estão sendo atravessados por ações autoritárias e agressivas cujos desdobramentos não sabemos o que vai dar e que ferem o direito ao trabalho, o direito das comunidades tradicionais e o direito à dignidade humana.
Itaguaí, 26/02/2016″
Assinamos,
APLIM (Associação de Pescadores e Lavradores da Ilha da Madeira – Itaguai)
APESCA (Associação de Pescadores Artesanais Galpão dos Pescadores Waldemiro Joaquim Coelho – Itaguai)
APIMIM (Associação dos Pescadores e Maricultores da Ilha da Marambaia – Mangaratiba)
AMAR (Associação de Maricultores de Mangaratiba)
APAPG (Associação de Pescadores e Aquicultores da Pedra de Guaratiba – Rio de Janeiro)
ASSOPESCA (Associação de Pescadores e Maricultores de Say – Mangaratiba)
Diretoria Geral de Pesca da Prefeitura do Município de Itaguaí
Núcleo de Pesquisa e Extensão Urbano, Território e Mudanças Contemporâneas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
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Enviada para Combate Racismo Ambiental por Maria José Pacheco.