Quilombo é reconhecido por órgão estadual e quer virar ponto de cultura na Baixada

Igor Ricardo – Extra

Sinônimo de resistência negra, os quilombos são historicamente locais onde os escravos se refugiavam e resgatavam suas origens africanas. Em Bongaba, em Magé, um grupo de pelo menos 50 pessoas mantém viva essa tradição e comemora o reconhecimento como quilombo concedido pela Acquilerj (Associação de Comunidades Remanescentes de Quilombos do Estado do Rio de Janeiro). O local também completa 21 anos de existência este ano.

O título dado pela entidade estadual é o primeiro passo de uma etapa até receber também a denominação pela Fundação Palmares, de nível nacional. Hoje, apenas o quilombo Maria Conga, também é Magé, é reconhecido pelo órgão como quilombo em toda a Baixada Fluminense.

– Queremos transformar esse local em um ponto turístico, sem perder as nossas características. Estamos às margens do antigo caminho do ouro (entre Rio e Minhas Gerais) e, na época da escravidão, aqui era uma espécie de hospital para os escravos – relembra o babalorixá Paulo José dos Reys, o Pai Paulo de Ogum, de 52 anos, líder religioso do espaço.

O espaço com mais de 300 m² é cercado por árvores nativas e, além da casa dos quilombolas, abriga o terreiro Ilé Àsé Ògún Alàkòró, dedicado ao orixá Ogum.

Morador mais antigo do quilombo, Ivanildo Gomes Neto, de 70 anos, viu a comunidade nascer e se orgulha de ter filhos e netos morando no local. A felicidade do aposentado é ainda maior por estar preservando a memória de seus antepassados.

– Nasci em Itaperuna (Noroeste Fluminense) e vim com meu pai para Magé trabalhar em uma barreira, onde extraímos barro. A terra sempre esteve com descendentes de escravos, que começaram a se organizar para preservar suas raízes. Isso aqui tem muita história – afirma Ivanildo.

Um dos “causos” contados pelos quilombolas é do medo de subir uma trilha que passa na parte de trás do quilombo. Segundo eles, havia uma serpente que ficava escondida na mata que só deixava passar quem tinha boa intenção. Caso contrário, ela devorava o sujeito.

– Sei pouco sobre essas histórias, mas a gente conta para os nossos filhos. É uma forma de preservar e trazer essa noção de pertencimento para eles – conta o enfermeiro Job Dias, de 61 anos.

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‘Não somos ruins’

O reconhecimento estadual do Quilombá de Bongaba transforma o terreno em um ponto de cultura da região. De acordo com Pai Paulo, a partir de agora, as políticas desenvolvidas por eles poderá contar incentivos públicos. No próximo mês, no dia 20, a casa realiza a X Mostra Cultural – Resgatando os valores das raízes afro.

Além disso, o quilombo promove todo segundo sábado do mês uma roda de conversa com diversas atividades africanas, como jongo, capoeira, dança de roda, a partir das 15h. A entrada é gratuita.

– É uma forma das pessoas conhecerem a nossa cultura e olharem com outros olhos. Não somos coisa ruim, como muitos dizem. Queremos o bem de todos – disse a estudante Luanda Santana Costa, de 15 anos.

Apesar da comemoração, os quilombolas ainda convivem com problemas básicos de estrutura, como a falta de saneamento básico nas casas. Eles cobram maior atenção das autoridades.

– Queremos retomar um terreno nosso que foi invadido há alguns anos e construir ali uma escola e um ginásio para nossas crianças. Seria de uso de toda a comunidade no entorno também. É hoje um dos nossos sonhos – confessa Pai Paulo.

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Moradores de quilombo, em Magé, celebram reconhecimento por entidade estadual Foto: Cléber Júnior / Extra

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