MPF e MP-SP movem ação pedindo a suspensão definitiva do licenciamento ambiental de hidrelétrica da CBA no Vale do Ribeira

MPs requereram também a extinção da concessão para aproveitamento do potencial de energia hidráulica concedido à UHE Tijuco Alto, empreendimento estimado em meio bilhão de reais

MPF

O Ministério Público Federal em Itapeva e o núcleo do Vale do Ribeira do Grupo de Atenção Especial de Defesa do Meio-Ambiente do Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizaram ação civil pública com pedido de liminar para que o Ibama suspenda o processo de licenciamento ambiental da usina hidrelétrica de Tijuco Alto, no rio Ribeira de Iguape, em uma área de quase 52 km² de Mata Atlântica – Patrimônio Nacional e Patrimônio Natural da Humanidade pela Unesco, na divisa de São Paulo e Paraná, um ambicioso projeto da Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), estimado em R$ 536 milhões, e que está para completar 30 anos.

Liminarmente, o MPF e o MP-SP, que mantêm inquéritos civis públicos sobre o empreendimento em ambas as instituições, também pedem que a União e a Agência Nacional de Energia Elétrica, a Aneel, anulem e extinguam os efeitos da concessão de aproveitamento de potencial de energia hidráulica à UHE Tijuco Alto, decretada sem licitação em 21/09/1988, há exatos 28 anos.

Desde 1989, a CBA tem planos para a área e iniciou a tentativa de obtenção do licenciamento ambiental do projeto junto a agência ambiental paulista, mas em 1994, o MPF em São Paulo ingressou e venceu uma ação civil pública para que o Ibama fosse o órgão responsável pelo licenciamento ambiental, uma vez que o lago da hidrelétrica cobrirá áreas de cinco municípios em dois Estados e a lei ambiental é clara que obras de impacto regional devem ser licenciadas pelo órgão federal.

O lago da hidrelétrica atingiria dois municípios em São Paulo (Ribeira e Itapirapuã Paulista) e três no Paraná (Adrianópolis, Dr. Ulysses e Cerro Azul). Além disso, o empreendimento pode causar impacto em toda a bacia hidrográfica do rio Ribeira do Iguape, que desemboca no complexo lagunar de Iguape-Cananéia-Paranaguá, que compreende parte do litoral sul de SP e parte do litoral paranaense.

RIO INTEIRO. Para o MPF e para o MP-SP, o maior problema do licenciamento ambiental em andamento no Ibama, que vem sendo questionado desde julho de 2007, é a “restrição absurda do estudo de impacto ambiental do empreendimento para apenas parte da bacia hidrográfica” do rio Ribeira de Iguape, e o subestimado impacto socioeconômico da região, segundo o procurador da República Ricardo Tadeu Sampaio e o promotor de Justiça especializado em meio-ambiente, Nilton Oliveira de Mello Neto, autores da ação. Para os MPs Federal e Estadual, o impacto em toda a bacia hidrográfica do rio Ribeira de Iguape deve ser avaliado.

Essa partição ilegal na avaliação dos MPs Federal e Estadual deixa em aberto, por exemplo, a análise da contaminação do rio Ribeira do Iguape e afluentes por metais pesados como chumbo, cádmio, cobre e mercúrio, em especial resíduos de um acidente na mineradora Del Rey, do grupo DuPont, ocorrido há 20 anos no qual 50 mil m3 de rejeitos foram dragados, junto com maquinário, para um fosso a 100 metros de profundidade com o solapamento de uma dolina. Não há estudos que comprovem se estes rejeitos não serão atingidos pelo alagamento, o que pode afetar especialmente o município de Cerro Azul.

No final de 2014 e início de 2015, o MPF e o MP-SP apresentaram também seis pareceres técnicos ao Ibama com questões relativas aos temas: poluição do solo e da água, impactos aos componentes bióticos, impactos socioeconômicos, estimativas financeiras, questões relativas a arqueologia, espeleologia (cavernas) e geologia e biológicos/agronômicos.

O MPF move a ação contra a empreendedora CBA, empresa do grupo Votorantim, os órgãos licenciadores (Ibama, Ministério do Meio-Ambiente, e o ICMBio). Além disso, também contesta irregularidades verificadas na concessão do direito de aproveitamento do potencial de energia hidráulica, pela ANEEL, e a carência da devida outorga de direito de uso dos recursos hídricos, pela Agência Nacional de Águas – ANA. Houve ainda tutela deficiente de comunidades tradicionais diversas, entre estas várias quilombolas às quais a Fundação Cultural Palmares não prestou a devida assistência. Também é demandado na ação o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), por conta de estudos espeleológicos sobre eventuais danos a cavernas da região ainda não conclusos e deficiências nos estudos e salvamentos arqueológicos e paleontológicos.

“O Ibama ignorou nossas manifestações no sentido de que era necessária a análise da bacia hidrográfica inteira e que era inviável empreendimento desta espécie neste frágil bioma. Por esses e outros motivos, defendemos a definitiva proibição do empreendimento com o fim da concessão para exploração do potencial energético. Caso a medida seja negada, postulamos que o Eia-Rima seja inteiramente reformulado, abrangendo área mais ampla e melhor analisando os gravíssimos danos ambientais que certamente ocorrerão”, afirma o procurador Ricardo Tadeu Sampaio, um dos autores da ação.

OUTRAS PENDÊNCIAS. Uma grande incógnita para o MPF e o MP-SP é o impacto da hidrelétrica sobre 15 comunidades quilombolas do lado paranaense da represa. O EIA/RIMA do empreendimento foi totalmente “insatisfatório quanto ao diagnóstico dos impactos dos empreendimentos sobre essas comunidades”, afirma a ação. O documento chega a registrar que o empreendimento não atingiria comunidades quilombolas. Para o MPF, essas conclusões são “temerárias” já que as comunidades da área de influência do empreendimento não foram sequer identificadas. “Não se sabe nem quantas e quais são as comunidades quilombolas da área, mas o empreendedor, de forma surpreendente, já afirma que não serão impactadas”.

Mas há ainda muitas dúvidas sobre o impacto socioeconômico. Não se sabe ao certo quantas famílias serão desalojadas. Fala-se em torno de 700 a 850 famílias. Há previsão de locais para sua alocação em SP e no PR, mas nada formalizado. Apesar de pouco povoada, a região é muito frequentada por pescadores. Cerca de 5000 vivem do rio naquele trecho.

Outra questão é a segurança da barragem. A região onde está previsto o lago é formada por solo composto por rochas em uma região com muitas cavernas formadas devido à porosidade dessas pedras, o que pode causar instabilidade e a passagem de fluidos de um lado a outro da barragem.

O EIA atualizado do empreendimento apenas elencou, sem estudar adequadamente, 30 páginas sobre espécies que correm risco de extinção e que podem ser afetadas pela hidrelétrica, caso ela venha a ser construída. São 325 espécies de aves, 78 de répteis, 71 de mamíferos, 37 espécies de peixes, 23 de anfíbios, além de 24 tipos de plantas.

O estudo de impacto ambiental também ignorou a eventual interação do empreendimento com outros três projetos para a região: as UHEs de Funil e Batatal e a pequena central hidrelétrica de Itaóca, a que tem o mais adiantado projeto das três; além de mais seis usinas hidrelétricas da própria Companhia Brasileira de Alumínio – CBA implantadas no Rio Juquiá, importante tributário do Rio Ribeira de Iguape.

Leia a íntegra da ação civil pública

A ação foi autuada na Justiça Federal sob nº 0001297-74.2016.4.03.6139 e distribuída à 1ª Vara Federal de Itapeva. Para consultar a tramitação, acesse http://www.jfsp.jus.br/foruns-federais/

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Deborah Stucchi.

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

seis + dezoito =