Contra ‘Fundação Nacional dos Coronéis’, povo Terena completa uma semana de ocupação à sede da Funai

Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação – Cimi

Em 1979, Mário Juruna sugeriu que a Fundação Nacional do Índio (Funai) passasse a se chamar Fundação Nacional dos Coronéis. Tempos de ditadura militar. A ocupação de indígenas do povo Terena à sede da Funai em Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul, completou uma semana tentando afastar do presente tal passado sombrio. Os indígenas se opõem à nomeação do coronel reformado do Exército Renato Vidal Sant’Anna ao cargo de coordenador do órgão indigenista.

Nesta quinta-feira, 17, os Terena trancaram uma via de grande circulação, a Rua Maracaju, na região central da capital sul-mato-grossense, e um trecho da BR-262, que liga Campo Grande a Corumbá, na altura da Terra Indígena Taunay/Ipegue, em protesto com faixas contra a militarização da Funai. “Queremos o retorno do Evair (Borges, coordenador da Funai exonerado), que é indígena, e nada de militares”, frisa Elvis Terena.

Para lideranças ouvidas, os protestos de hoje foram apenas um aviso. “Não vamos aceitar  esse absurdo. Sequer fomos consultados. O Conselho do Povo Terena não aceita essa decisão”. O escritório da Funai em Campo Grande atende as terras indígenas Água Limpa, Buriti, Buritizinho, Cachoeirinha, Guató, Kadiwéu, Lalima, Limão Verde, Nioaque, Nossa Senhora de Fátima, Ofayé-Xavante, Pilad Rebuá e Taunay/Ipegue.

Durante essa semana, até esta sexta, 18, ocorre na aldeia Bananal (Taunay/Ipegue), município de Aquidauana, o 9º Hanaiti Ho’únevo Têrenoe – a Grande Assembleia do Povo Terena. Conforme os indígenas, caciques, lideranças de retomadas, rezadores, mulheres e a juventude se reúnem para discutir a luta pelo território tradicional, além de educação escolar, meio ambiente, saúde nas comunidades e demais políticas.

“Tudo está ocorrendo e o povo Terena enxerga que é o momento de intensificarmos a nossa luta. A conjuntura não está fácil. Demarcações paralisadas, essa PEC (55) do congelamento dos gastos, a Funai desestruturada e o governo querendo colocar generais nela. A gente entende como uma ofensiva, um plano arquitetado pelo governo e pelos ruralistas, tanto que quem indicou o coronel aqui foi um ruralista”, diz Lindomar Terena.  

Com o governo de Michel Temer, a defesa de militares em cargos da Funai passou a ocorrer com frequência. Em julho deste ano, o general Roberto Sebastião Peternelli, integrante do PSC, foi convidado e aceitou assumir a presidência do órgão. “Existe uma relação histórica de amizade entre os índios e os militares”, declarou o deputado federal Carlos Marum (PMDB/MS) – parlamentar que indicou o coronel Sant’Anna.

Fundação Nacional dos Coronéis’  

Desde o Napalm lançado sobre os Waimiri-Atroari aos reformatórios e fazendas de trabalhos forçados, os militares possuem um histórico de violência e extermínio contra os povos indígenas. Os militares nunca esconderam a opinião de que as terras indígenas são danosas à segurança nacional. No final da década de 1970, desejavam a completa integração dos indígenas à sociedade branca.

“A ditadura militar, através do ministro do Interior, general Rangel Reis, elaborou um projeto visando a “emancipação dos índios”, através do qual pretendia resolver a questão declarando os índios emancipados, e suas terras disponibilizadas aos latifundiários. Desta forma, ao invés de demarcar todas as terras indígenas até 1978, como previa o Estatuto do Índio (Lei 6.001, vigente até hoje), resolveria o problema declarando 80% dos índios como não índios, não tendo direito, portanto, às suas terras, ou confinando-os a lotes do módulo rural”, lembra Egon Heck, do Secretariado Nacional do Cimi.

As políticas indigenistas da ditadura militar instalaram um forte aparato militar na Funai, a partir do Conselho de Segurança Nacional e Serviço Nacional de Informação, “visando o controle e repressão dos povos indígenas e seus aliados. Instalaram cadeias nos postos e presídios indígenas regionais e nacional, como o Krenak, em Minas Gerais. Foi criada a Guarda Rural Indígena (GRIN) e a Assessoria de Segurança e Informação (ASI)”, completou Heck – indigenista desde o início da década de 1970.

Protesto na Rua Maracaju, em Campo Grande. Foto: Povo Terena

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