Agência Nacional de Águas não pode outorgar direitos de uso na bacia do rio Solimões

Legislação prevê que, para concessão de autorizações, é necessário que a bacia possua um plano de recursos hídricos; rios da Amazônia não possuem o planejamento

Por Procuradoria da República no Amazonas

A Justiça Federal determinou que a Agência Nacional de Águas (ANA) não mais outorgue direitos de uso de recursos hídricos (Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica) em processos de licenciamento ambiental na Bacia Hidrográfica do Rio Solimões, enquanto não for instalado o Comitê da Bacia Hidrográfica e aprovado o Plano de Recursos Hídricos da Bacia do Rio Solimões/Amazonas. A sentença foi concedida em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal no Amazonas (MPF/AM) para proteger os recursos hídricos da região, até agora usados sem nenhum planejamento.

A Lei das Águas (9.433/97) instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos, que prevê que a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do poder público, dos usuários e das comunidades. O Conselho Nacional de Recursos Hídricos aprovou, em 2011, um plano que previa que fossem instalados os comitês de bacia para que planejamentos fossem formulados para cada bacia. Até hoje, não foi criado o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Solimões, responsável pela elaboração do plano de recursos hídricos.

Na sentença, a Justiça Federal afirma que “sem a existência de um Plano específico para a Bacia Hidrográfica, elaborado no âmbito de um comitê específico, não se mostra possível reservar recursos hídricos para qualquer empreendimento, porquanto desconhecida a viabilidade da reserva efetuada e os eventuais efeitos advindos da utilização dos recursos daí provenientes, seja para o meio ambiente, seja para as comunidades do entorno”.

A ANA informou à Justiça que existem 265 interferências com outorgas válidas emitidas pela autarquia na bacia do rio Amazonas; três pedidos de Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica (DRDH) e outorgas de aproveitamentos hidrelétricos em análise no momento, na bacia do rio Amazonas; e um projeto de captação de água do rio Negro. A sentença destaca que a concessão destas autorizações para utilização dos recursos hídricos representam risco de prejuízo, já que as DRDH não são acompanhadas de planejamento específico para a bacia e a para a população afetada.

Reconhecendo a ilegalidade de autorizar intervenções na bacia hidrográfica sem que haja o comitê e o plano de recursos hídricos da bacia, a Justiça Federal determinou a aplicação de multa de R$ 50 mil por ato de descumprimento e R$ 1 mil de multa diária enquanto a autorização emitida indevidamente estiver válida. As penas de multa devem recair sobre o patrimônio pessoal do diretor-presidente da ANA no momento da concessão e de outros responsáveis que subscrevam a outorga.

A ação tramita na 7ª Vara Federal no Amazonas sob o nº 0016399-54.2014.4.01.3200.

Rios da Amazônia – A ação civil pública relativa à Bacia Hidrográfica do Rio Solimões foi uma das ações ajuizadas pelo Ministério Público Federal em seis estados da Amazônia para proteger os recursos hídricos da região, usados sem nenhum planejamento. Nas ações, o MPF pediu que a ANA seja proibida de emitir a chamada Declaração de Reserva de Disponibilidade Hídrica para quaisquer empreendimentos que estejam em licenciamento nas bacias dos rios Negro, Solimões, Tapajós, Teles Pires, Madeira, Ji-Paraná, Oiapoque, Jari, Araguaia, Tocantins e Trombetas.

Para o MPF, o fato de vivermos uma crise de abastecimento de água de graves proporções no sudeste do país, assim como o desaparecimento de trechos inteiros do rio São Francisco, no nordeste, são alertas para o que pode ocorrer na Amazônia, a maior bacia hidrográfica do país e do mundo, se for mantido o atual padrão de total falta de planejamento e precaução.

“O que ocorre no sudeste e no nordeste é um vislumbre do risco que correm os rios da bacia Amazônica, em pior situação por nem sequer se observar a precaução obrigatória da gestão participativa dos recursos. E a Amazônia, como demonstra o conhecimento científico mais recente, é um ecossistema que funciona como regulador hidrológico para o continente sul-americano e principalmente, para as regiões sul, sudeste e centro-oeste do Brasil, diretamente beneficiadas pela umidade transportada da floresta”, dizem as ações judiciais.

No Amazonas, além da ação relacionada à Bacia Hidrográfica do Rio Solimões, o MPF ajuizou ação civil pública para proteger os recursos hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio Negro. Esta ação também aguarda julgamento na 7ª Vara Federal no Amazonas, sob o nº 0016398-69.2014.4.01.3200.

Imagem: Encontro das águas dos rios Negro e Solimões – Créditos: Bruno RS/Flickr

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