Impactos da Veracel Celulose no Extremo Sul da Bahia

Por Ramon Rafaello, para Desacato.info.

Em reportagem publicada na terça-feira 18 de julho de 2017, pelo Jornal do Brasil, diz:

[1]O Ministério Público da Bahia (MP-BA) acionou na Justiça a empresa Veracel Celulose S/A pela ocupação irregular de terras do estado. Entre os pedidos da ação civil pública, o MP-BA solicita à Justiça uma liminar que determine a reintegração de posse em favor do estado da Bahia dos mais de 225 hectares ocupados pela empresa para o plantio de eucalipto. Os promotores de Justiça Rafael Henrique Andreazzi e Antônio Leal Filho, responsáveis pela ação, informam que a empresa Veracel explora a plantação de eucaliptos há 15 anos nas terras localizadas na região do município de Eunápolis, Extremo Sul da Bahia.

[2]A alegação de irregularidade foi confirmada, segundo o MP-BA, pela Coordenação de Desenvolvimento Agrário (CDA), vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Rural do Estado. De acordo com o Ministério Público, a área é formada por terra devoluta, ou seja, terra pública que não integra o patrimônio de nenhum particular, ainda que ocupada irregularmente, e que deve ser devolvida ao estado, mesmo que não tenha destinação definida pelo Poder Público.

Outro ponto levantado na ação é que a ocupação das terras para a produção da celulose rendeu à Veracel vantagens superiores a R$ 3 milhões, sem que nenhum valor fosse repassado ao estado da Bahia. A ação ainda pede à Justiça que, devido a isso, a empresa seja condenada ao pagamento de R$ 15 milhões em indenização por danos morais coletivos a serem destinados ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.

Além dos lucros exorbitantes oriundos da ocupação irregular de terras públicas, segundo dados fornecidos pela própria empresa ao PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), a Veracel é beneficiada com larga isenção fiscal para operar na região.

Veja abaixo, os impostos que são tributados a empresa, e os impostos que foram isentos das suas atividades econômicas:

[3]PIS/COFINS: Por ser a Veracel uma empresa focada nas exportações e, por não haver incidências destas duas contribuições (PIS/COFINS) nas vendas para o Mercado Externo, a empresa possui um saldo credor acumulado, oriundo das aquisições de matérias-primas e equipamentos destinados à produção de mercadorias exportadas.

[4]IMPOSTO DE RENDA E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO: A Veracel não está gerando estes dois impostos nas operações contábeis. Por apresentar um prejuízo fiscal acumulado.

[5]ICMS – Foi concedido pelo Governo Estadual Diferimento do imposto para aquisições internas de matérias-primas e ativo imobilizado, assim como Diferimento do diferencial de alíquota nas aquisições de bens interestaduais destinados ao ativo imobilizado. Portanto, como também todas as vendas de celulose são destinadas ao mercado externo, gozando assim da “não incidência” deste imposto, as operações da Veracel não geram ICMS.

[6]ISS – A Veracel não é contribuinte deste imposto, por não ter em suas operações a atividade de prestadora de serviços, porém, por força de Lei, a Veracel está obrigada a reter o referido imposto de suas contratadas e repassar para as Prefeituras dos Municípios de sua influência. Para efeito de estimativa deste imposto, tomando como base os anos de 2004 e 2005, estimamos que o valor anual de recolhimento do ISS, contemplando todos os Municípios será em torno de R$ 10.000.000,00 (Dez  Milhões).

Portanto, segundo o relatório do (PNUD) o único imposto que vem sendo pago (por força de lei) pela empresa para atuar na região é o (ISS) Imposto Sobre Serviços, que é insuficiente para cobrir os altos lucros obtidos, e sua correlação com os impactos ocasionados pela monocultura de celulose.

[7]Não faltam denúncias contra a Veracel no extremo sul da Bahia, devido aos seus impactos sociais, ambientais e econômicos. Exemplo disso é a situação no Embaré (distrito rural de Eunápolis), onde os moradores denunciam a empresa multinacional por estar usando em grandes quantidades os agentes químicos: glifosato, Round Up e Mirex em seus plantios, contaminando rios, nascentes e afluentes, provocando impactos irreversíveis para o meio ambiente e para saúde humana. Durante as chuvas, os compostos químicos caem no lençol freático e os animais e seres humanos ficam vulneráveis à contaminação causada pelos agrotóxicos. Há a denúncias também, de que o rio Santa Cruz está agonizando e morrendo, sobrevivendo em raríssimos trechos, onde ainda existe água em barragens ilegais utilizadas para irrigar os plantios de eucaliptos.

[8]Além disso, em decisão inédita, a Justiça Federal da cidade de Eunápolis (BA) condenou a Veracel Celulose em uma ação movida pelo Ministério Público Federal (MPF), contra o desmatamento de remanescentes de Mata Atlântica em estágios avançados de regeneração protegidos pelos Decretos de Lei de N°. 99547 de 25 de setembro de 1990. A ação da justiça determinou que a empresa terá que restaurar com vegetação nativa, todas as suas áreas compreendidas nas licenças de plantio de eucalipto liberadas entre 1993 e 1996. De acordo com a sentença, a Veracel terá que retirar suas plantações de uma área de 96 mil hectares, que deverá ser reflorestada com bioma natural de Mata Atlântica. Além disso a empresa deverá pagar uma multa de R$ 20 milhões de reais por realizar desmatamento ilegal utilizando de tratores e correntões nos primeiros anos de seu funcionamento no extremo sul da Bahia, em meados dos anos 1991 a 1993.

Após a denúncia pública deste desmatamento, movimentos sociais e ambientalistas passaram a ser cobrados pela sociedade, no sentido de responsabilizá-los por não apoiarem o desenvolvimento da região em parceria com um empreendimento que se comprometia a ser grande gerador de empregos para a população local, porém, os dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento apontam que a concentração fundiária promovida pela monocultura de eucalipto na região, ao invés de gerar renda e emprego, vem fomentando um contexto social de desemprego no campo, êxodo rural e desigualdade socioeconômica.

Segundo dados apresentados no relatório: Impactos socioeconômicos do empreendimento da Veracel no extremo sul da Bahia – fase I, a multinacional teria capacidade de gerar cerca de 6.000 empregos diretos e indiretos. Porém a monocultura de celulose trouxe impactos significativos na geração de empregos em determinados setores da produção agrícola, que representam um importante papel econômico e social na região. Como consequência a produção de alimentos da agricultura familiar diminuiu. Para abastecer a população, os municípios precisam importar a produção agrícola de outras cidades e estados, a exemplo do Espírito Santo, um dos principais fornecedores de produtos nas feiras e mercados locais. A inflação sobre os gêneros alimentícios do campo subiu e sua oferta e diversidade nos mercados diminuiu vertiginosamente.

[9]Entre os anos de 1992 e 2003, foi demonstrado que com a diminuição ou desaparecimento de áreas de cultivo de mandioca, banana, feijão, laranja e cana-de-açúcar, pode-se estimar que em torno de 6.465 pessoas possam ter se tornado desempregadas. A única cultura que gerou empregos foi o plantio de abacaxi, em torno de 443 postos de trabalho diretamente associados. Os municípios mais atingidos foram Eunápolis e Guaratinga com a diminuição da área plantada com mandioca. Guaratinga também perdeu oportunidades de trabalho com a redução da área de feijão e Eunápolis com as de abacaxi. Santa Cruz de Cabrália também foi afetada em relação aos plantios de abacaxi e Canavieiras com o cultivo da banana, que após 1998 praticamente colapsou.

O momento de alta na geração de empregos na Veracel Celulose aconteceu durante a construção de sua fábrica, que gerou em trono de 9.000 empregos, mas com a fábrica de celulose em pleno funcionamento, a empresa passou a empregar na fábrica e nas suas plantações 741 pessoas, em geral bem qualificadas, vindas de outras regiões do país. De fato, a produção da celulose contribui pouco para a geração de empregos. Pois trata-se de um setor altamente mecanizado, que com poucos trabalhadores monitorando a produção, consegue alcançar alta lucratividade.

Ou seja, se por um lado houve alguma geração de empregos na atividade da celulose, por outro lado houve o esvaziamento e desemprego no campo, gerando a superlotação das cidades e o aumento da demanda por trabalho, moradia, educação, infraestrutura, saneamento básico, saúde, educação, segurança e etc.

De acordo com o IBGE, o censo demográfico de Porto Seguro em 1991 foi de 34. 661 habitantes, em 1996 foi de 64.957 habitantes, isso representa um crescimento de 87,40% em apenas cinco anos, equivalente a uma taxa média de crescimento de 17,58% ao ano, e no último censo de 2000 foi de 95.721 habitantes, o que representa um crescimento de 176, 16% em apenas nove anos com relação ao ano de 1991, equivalente a uma taxa média de crescimento de 19,57% ao ano.

[10]Até meados da década de 90, o município de Porto Seguro ainda poderia ser considerado como uma pequena e pacata cidade do interior, com 34.661 habitantes. Porém, desde os anos 1990 aconteceram profundas transformações econômicas, sociais, ambientais e geográficas na região, impulsionados dentre outros fatores, principalmente pela implantação da Veracel celulose, que ao gerar desemprego e êxodo no campo, contribuiu para superlotação das cidades, a exemplo de Porto Seguro, que saltou de 34.661 mil habitantes em 1992, para 95.721 habitantes em 2000, atualmente, o município conta com a população de 126.929 mil habitantes. O mesmo aconteceu com o município de Eunápolis, que saltou de 70. 591 habitantes em 1991, para 114.275 habitantes em 2010.

Diante de todo o contexto, fica aqui um questionamento, por que uma empresa que ocupa aproximadamente 225 hectares de terras públicas, exercendo atividades em 40% de terras agricultáveis do município de Eunápolis, continua em pleno funcionamento, sendo isenta de impostos como, CSLL, PIS/COFINS, e ICMS, gerando superlotação das cidades, desemprego e êxodo no campo, concentração fundiária, impactos ambientais, sociais e econômicos.

Até quando o Brasil continuará sendo o quintal dos países do “primeiro mundo” e suas multinacionais, deixando que suas riquezas naturais e sua população continuem a ser exploradas livremente para o enriquecimento do grande capital internacional?

Referências:

[1] http://www.jb.com.br/pais/noticias/2017/07/13/mp-ajuiza-acao-para-veracel-desocupar-terras-com-plantio-de-eucalipto-na-bahia/

[2] http://www.jb.com.br/pais/noticias/2017/07/13/mp-ajuiza-acao-para-veracel-desocupar-terras-com-plantio-de-eucalipto-na-bahia/

[3] IMPACTOS SOCIOECONOMICOS DO EMPREEDIMENTO DA VERACEL NO EXTREMO-SUL DA BAHIA – FASE I – ACORDO DE COOPERAÇÃO PNUD – VERACEL CELULOSE Novembro/2005

[4] IMPACTOS SOCIOECONOMICOS DO EMPREEDIMENTO DA VERACEL NO EXTREMO-SUL DA BAHIA – FASE I – ACORDO DE COOPERAÇÃO PNUD – VERACEL CELULOSE Novembro/2005

[5] IMPACTOS SOCIOECONOMICOS DO EMPREEDIMENTO DA VERACEL NO EXTREMO-SUL DA BAHIA – FASE I – ACORDO DE COOPERAÇÃO PNUD – VERACEL CELULOSE Novembro/2005

[6] IMPACTOS SOCIOECONOMICOS DO EMPREEDIMENTO DA VERACEL NO EXTREMO-SUL DA BAHIA – FASE I – ACORDO DE COOPERAÇÃO PNUD – VERACEL CELULOSE Novembro/2005

[7] http://www.futucandonoticias.com/eunapolis-moradores-do-embare-denunciam-a-veracel-por-contaminacao-de-aguas-e-plantios-irregulares-de-eucalipto/

[8] https://www.ecodebate.com.br/2008/08/20/veracel-celulose-empresa-da-stora-enso-e-aracruz-e-condenada-na-justica-por-desmatar-mata-atlantica/

[9] IMPACTOS SOCIOECONOMICOS DO EMPREEDIMENTO DA VERACEL NO EXTREMO-SUL DA BAHIA – FASE I – ACORDO DE COOPERAÇÃO PNUD – VERACEL CELULOSE Novembro/2005

[10] SILVA Marcelo Santana & FERNANDES Fábio Matos – 2005 Turismo, desenvolvimento local e pobreza no município de Porto Seguro – BA – Revista Espaço acadêmico – Nº 51 agosto/2005

Enviado para Combate Racismo Ambiental por Ivonete Gonçalves.

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