“Inúteis. O inimigo número um do Brasil é o índio”. Por Fernanda Torres

Na Folha

O inimigo número um do Brasil é o índio.

Em 2001, Jarbas Passarinho foi duramente criticado pelas Forças Armadas por ter, no período em que foi Ministro da Justiça do governo de Fernando Collor de Mello, demarcado e homologado a terra indígena ianomâmi.

O viés ideológico que dominou a política brasileira nos últimos 20 anos impediu que a discussão se aprofundasse.

Mas agora, graças a Deus, Johnny Bravo está no poder, eleito por um povo cristão e ordeiro, um homem determinado a dar um basta na distribuição irrestrita de glebas aos selvagens.

Vivendo como animais de zoológico em vastas áreas de solo arável, sobre reservas minerais de valor incalculável, esses povos representam uma grave ameaça à soberania nacional porque, senhores absolutos de suas terras, podem ceder à cobiça de nações estrangeiras e se separar do Brasil.

Torço para que o Senado aprove o nome de Eduardo Bolsonaro para nos representar em Washington, e que os tão sonhados contratos de parceria de mineração e cultivo em terras indígenas saiam do papel, trazendo dividendos não só para os brasileiros de bem, como para o que resta desse gentio.

Abaixo, uma lista de citações colhidas pela antropóloga Manuela Carneiro da Cunha em “História dos Índios no Brasil” (Companhia das Letras, 648 págs., R$ 149,90), que pode servir de argumento para o nosso futuro embaixador na América.

Do jesuíta Manoel da Nóbrega, em 1549: “Os habitantes do Novo Mundo descendem necessariamente de Adão e Eva e, portanto, de um dos filhos de Noé, provavelmente do maldito Cam, aquele que desnudou seu pai, razão de andarem nus. À lei natural, não a guardam porque se comem; são muito luxuriosos, muito mentirosos, nenhuma coisa aborrecem por má, e nenhuma louvam por boa”.

Do frade francês André Thévet, em 1558: “Os canibais são os mais cruéis e desumanos de todos os povos americanos, não passando de uma canalha habituada a comer carne humana do mesmo jeito que comemos carne de carneiro, se não até com maior satisfação”.

Do historiador e cronista português Pero de Magalhães Gândavo, em 1570: “A língua desse gentio carece de três letras —não se acha nela F, nem L, nem R, assim não tem Fé, nem Lei, nem Rei; e desta maneira vivem sem justiça e desordenadamente”.

De dom João 6°, em 1809: “Não é conforme aos meus princípios religiosos e políticos o querer estabelecer minha autoridade nos Campos dos Guarapuava por meio de mortandades e crueldades contra os índios. E só desejo usar a força com aqueles que ofendem os meus vassalos e que resistem aos brandos meios de civilização que lhes mando oferecer”.

De José Bonifácio, em 1823: “Com efeito o homem no estado selvático, e mormente o índio bravo do Brasil, deve ser preguiçoso; porque tem poucas, ou nenhumas necessidades; porque sendo vagabundo, vivendo todo o dia exposto ao tempo não precisa de casas e vestidos cômodos. Porque finalmente não tem ideia de propriedade nem desejos de distinções e vaidades sociais, que são as molas poderosas, que põem em atividade o homem civilizado”.

Do historiador Francisco Adolfo de Varnhagen, em 1867: “No reino animal há raças perdidas; parece que a raça índia, por um efeito de organização física, não podendo progredir no meio da civilização, está condenada a esse fatal desfecho. O índio parece ter uma organização incompatível com a civilização”.

De um deputado maranhense, autor de um projeto de colonização do Maranhão, em 1826: “Uma aldeia de 200, 300 índios umas vezes se achava a 20 léguas acima e daí a pouco a 20 léguas mais abaixo; chamar-se-ão esse homens errantes, proprietários de tais terrenos? Por que razão não se aldeiam fixamente como nós? Eu quisera que me mostrasse a verba testamentária, pela qual nosso pai Adão lhes deixou aqueles terrenos em exclusiva propriedade”.

Do desembargador José da Silva Lisboa, em 1816: “Que se derrubem as matas todas e se distribuam as terras a homens ricos que deem emprego agrícola aos índios”.

Quinhentos anos de extermínio nos contemplam.

Em 1934, o antropólogo francês Claude Lévi-Strauss foi convidado a lecionar na recém inaugurada Universidade de São Paulo. Ao mencionar o desejo de visitar algumas tribos indígenas, ele ouviu do então embaixador brasileiro em Paris, Luís de Souza Dantas: “Índios? Infelizmente, prezado cavalheiro, lá se vão anos que eles desapareceram”.

Se tudo sair como o esperado, até o fim do mandato do pai, o quiçá embaixador Eduardo Bolsonaro poderá se dar ao luxo de dizer o mesmo.

Criança Paumari. Foto: Oiara Bonilla – editada

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