Uma mina dentro da cidade: a nova lama invisível que atinge Barão de Cocais em MG

A cidade que foi sitiada pela mineradora Vale no dia 8 de fevereiro de 2019 por causa de uma ameaça de rompimento de barragem, agora enfrenta o risco de uma mineração dentro da área urbana

por MAB MG*

Os moradores de Barão de Cocais, cidade mineira de cerca de 32 mil habitantes no Quadrilátero Ferrífero, região de maior concentração urbana de Minas Gerais, foram surpreendidos pela informação que uma empresa chamada Bassari Mineração, com sede no município, quer explorar uma jazida de minério de ferro a poucos metros de centenas de casas. 

As poucas informações divulgadas até agora apontam que há um grande interesse da empresa e do governo municipal sob o comando de Décio Geraldo dos Santos (PSB), no empreendimento. O prefeito encaminhou a Câmara Municipal um projeto de lei complementar (PLC 16/2020) que modifica o Plano Diretor da cidade, permitindo exploração mineral em área de expansão urbana. A proposta beneficiará a Bassari Mineração, que pretende explorar uma jazida de minério de ferro próximo aos bairros São José Nacional, Andaime, Progresso e Garcia, todos localizados na entrada da cidade e que somam cerca de 6 mil moradores. 

O presidente da Câmara Municipal, João Batista Pereira (PP), em entrevista para o Jornal Estado de Minas, estava animado com a possibilidade da abertura da mina em área urbana afirmando que a cidade precisa de novas fontes de renda e que existiria um acordo com a empresa e os bairros atingidos garantindo contratação de mão de obra local “muito grande”. 

“Infelizmente, o impacto social no quesito mineração é lamentável, mas nós vamos ter isso eternamente, se não criarmos outra fonte de renda. Se nós tivéssemos aqui outros seguimentos no distrito industrial, eu acho que poderíamos estar dispensando a mineração em nossa região, mas, infelizmente, é a nossa fonte de renda”, ressaltou Pereira.

Apesar da aparente boa vontade dos vereadores e da prefeitura com a mineradora Bassari, a população da cidade não foi consultada, tão pouco participou dos acordos que teriam sido feitos com a empresa. E com vasta experiência dos danos socioambientais causadas pela lama invisível da Vale e da atividade industrial da GSM Mineração, da MR Mineração, da AngloGold, da Ashanti Mineração e da Gerdau, que está situada no centro da cidade, um grupo decidiu se manifestar na Câmara Municipal, o que fez com que o projeto não fosse aprovado na reunião ordinária realizada na última quinta-feira (27).

Uma mina urbana na cidade da lama invisível 

Barão de Cocais foi uma das cidades atingidas pelo terror de barragens conduzido especialmente pela mineradora Vale, em 2019. Apenas duas semanas após o rompimento em Brumadinho, centenas de pessoas foram retiradas de suas casas na madrugada de 8 de fevereiro após o sinal de alerta de um possível rompimento da barragem Gongo Soco. A barragem não se rompeu, mas a população viveu o pânico e sofreu os prejuízos sociais, culturais e econômicos causados pela atuação da mineradora que conduz o processo de reparação de maneira extremamente autoritária. 

No total, foram 458 pessoas expulsas de suas casas nas comunidades de Socorro, Piteira, Tabuleiro e Gongo Soco. Na chamada “área secundária”, são cerca de 6 mil pessoas atingidas pelo risco de rompimento dentro da área urbana. Nesta região, cerca de 150 pessoas foram deslocadas para hotéis ou casa de parentes. 

Depois deste crime da Vale contra estas comunidades, agora outros quatro bairros, que não estão na chamada “área secundária”, na entrada da cidade, e seus mais de 6 mil moradores estão ameaçados por esta empresa que existe a menos de 3 anos. Nenhum documento completo foi divulgado e os atingidos buscam informações mais seguras que confirmam se a mina vai danificar ou não uma importante fonte de abastecimento para o município bem como medir outros danos que certamente vão atormentar todos os moradores já sitiados pela indústria da mineração e da siderurgia e, desde 2019, pelo terror de barragens da Vale.

Para Letícia Faria, integrante da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), esta é mais uma situação que comprova que o primeiro direito violado das comunidades atingidas é o do acesso a informação: “Vemos isto se repetir de maneira sistemática em todos os processos, inclusive onde já ocorreu o rompimento, como na bacia do rio Doce em que até hoje, quase 5 anos depois, milhares de famílias ainda não foram reconhecidas e outras milhares ainda não sabem se a água que bebem, o ar que respiram, o peixe que comem ou o solo que plantam são seguros para a saúde”, comenta. 

“È claro que precisamos de novas fontes de renda, mais não ter ainda uma economia estruturada em outras atividades não justifica a motivação de um empreendimento tão perigoso para uma cidade já tão castigada pelas minerações e pelos riscos de rompimentos. É preciso envolver a população em um debate público em que todos acessem informações seguras e possam decidir de maneira soberana e popular sobre os destinos de Barão de Cocais”, concluiu Letícia. 

*Com informações do Jornal Estado de Minas, Jornal Brasil de Fato e Diário de Barão. 

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