A Campanha para que a Anglo American, uma das maiores mineradoras do mundo, encerre seus planos de explorar territórios indígenas, teve início com o relatório Cumplicidade na Destruição III, em outubro de 2020. Mineradora ainda tem 86 interesses minerários ativos na base de dados da ANM que impactam territórios indígenas.
Na Apib
A mineradora inglesa Anglo American se comprometeu formalmente em retirar da Agência Nacional de Mineração (ANM) 27 requerimentos aprovados para a pesquisa de cobre em territórios indígenas, localizados nos estados de Mato Grosso e do Pará. O compromisso foi informado, dia 24 de maio, após pressão do povo Munduruku, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e da Amazon Watch.
Do total de pedidos feitos pela Anglo American, que é uma das maiores mineradoras do mundo, e aprovados pela ANM, 13 impactavam diretamente a Terra Indígena Sawré Muybu, do povo Munduruku, no sudoeste do Pará.
Segundo a mineradora, a ANM foi informada sobre a retirada e a empresa aguardava pela atualização do banco de dados da Agência. Em sua resposta por email à Apib, a Anglo American afirma que com base nas preocupações levantadas pelas organizações e na oposição dos grupos indígenas contra a mineração em seus territórios, reavaliou essas licenças e tomou a decisão de retirar todas as 27.
“É uma vitória, mas queremos saber se a Anglo American vai realmente cumprir a sua palavra ou se ela vai voltar ao nosso território com outros meios, como o governo faz criando novas leis para entrar em território indígena. Nós resistimos e vamos continuar a resistir. São muitos ataques que sofremos, com projeto de lei dentro do Congresso, com madeireiros, garimpeiros, palmiteiros e grileiros dentro do nosso território. Então, a gente não confia, vamos confiar apenas se daqui dois, três anos, nós pudermos viver em paz. Que a Anglo American cumpra a sua palavra, porque tudo que sai no papel a gente não acredita, a Constituição é para ser respeitada, mas ela está sendo violada e rasgada”, afirma Alessandra Munduruku, vice coordenadora da Federação dos Povos Indígenas do Pará (Fepipa).
A campanha para que a Anglo American retirasse todos os requerimentos protocolados na ANM que impactassem territórios indígenas teve início após a publicação do relatório Cumplicidade na Destruição III, publicado pela APIB e Amazon Watch, em outubro de 2020, que apontava que a mineradora tinha quase 300 requerimentos de pesquisa registrados que incidiam sobre 18 Terras Indígenas na Amazônia, algumas com a presença de povos indígenas isolados. O alvo mais recente da mineradora inglesa havia sido a TI Sawré Muybu, no Médio Tapajós, onde vive o povo Munduruku. Cinco pedidos foram feitos de 2017 a 2019.
Confrontada com esses dados diversas vezes desde o lançamento do relatório e da campanha, a Anglo American se posicionou reiteradamente afirmando ter desistido de todos os pedidos de exploração mineral em áreas localizadas em terras indígenas no Brasil. No entanto, um levantamento de julho de 2021 do projeto Amazônia Minada, do InfoAmazonia, mostra que a Anglo American ainda possui 86 interesses minerários ativos na base de dados da ANM que impactam territórios indígenas.
“A decisão da Anglo American é importante e um resultado direto da resistência dos povos indígenas à mineração em nossos territórios. Mas esta decisão não é suficiente, porque não podemos esquecer que a mineradora ainda tem dezenas de pedidos para exploração mineral que afetam outros territórios indígenas. Portanto, seguiremos firmes com nosso chamado inicial à Anglo American: comprometer-se publicamente a não minerar em nenhum território indígena no Brasil. A maioria dos povos e as comunidades indígenas do Brasil não comunga com os anseios de uma minoria de indivíduos indígenas que se iludem e dobram às camufladas más intenções deste governo”, afirmou Eloy Terena, coordenador jurídico da Apib e assessor jurídico da Coiab.
Nos últimos dois anos, sob gestão do presidente de extrema direita Jair Bolsonaro, o Brasil bateu recorde de registros de pedidos de mineração dentro de terras indígenas. Segundo levantamento do Amazônia Minada, em 2020, um total de 143 requerimentos de mineração que afetam terras indígenas foram protocolados, e não rejeitados, na ANM — foi o maior número em 24 anos, quase três vezes o resultado de 2018, último ano antes de Bolsonaro assumir a Presidência. Uma onda de pedidos surgiu depois que Bolsonaro apresentou o Projeto de Lei 191, em fevereiro de 2020, que prevê a regularização da exploração mineral de terras indígenas, cumprindo assim uma de suas promessas de campanha mais controversas. Ainda mais preocupante, 71 dos 143 pedidos feitos em 2020 foram em terras onde a Funai tem registros da existência de povos indígenas isolados.
Apenas na TI Yanomami, terra indígena brasileira com maior área formalmente requisitada para mineração, são cerca de 3,3 milhões de hectares (34,3% da área total da TI) requeridos para extração mineral em 500 pedidos registrados na ANM — uma extensão territorial maior do que a Bélgica (3 mi ha) ou que o estado de Alagoas (2,7 mi ha) em disputa com mineradores. Quase um terço de todos esses pedidos registrados buscam por ouro. Foram diversos ataques a comunidades Yanomami por garimpeiros ilegais nos últimos dois meses.
“As empresas que seguem fazendo esses pedidos, mesmo cientes dos conflitos que a mineração tem levado ao território indígenas, estão colaborando com o projeto de destruição levado a cabo pelo governo Bolsonaro. Com a ameaça do projeto de lei 191/2020 cada vez mais próxima, seguiremos em campanha para que as gigantes da mineração, como a Anglo American, assumam uma postura compatível com os direitos indígenas e se posicionem contra essa proposta”, afirma Rosana Miranda, consultora de campanhas da Amazon Watch.
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Imagem: Sobrevoo registra destruição causada pelo avanço do garimpo ilegal dentro da Terra Indígena Munduruku, no Pará, em setembro de 2019. © Christian Braga / Greenpeace