Ricardo Barros vira sócio de empresa de mineração para extrair manganês no Pará

Líder do governo, deputado foi autor de requerimento que aprovou urgência ao PL que libera mineração em terras indígenas

Por Murilo Pajolla e Paulo Motoryn, no Brasil de Fato

O deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), autor do requerimento que aprovou a urgência do PL 191, que libera a mineração em terras indígenas, em março deste ano, está investindo na extração de manganês no leste do Pará.

Dois dias antes de ser nomeado líder do governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) na Câmara dos Deputados, em 12 de agosto de 2020, Barros abriu uma empresa chamada RC6 Mineração, sediada em seu estado natal, o Paraná.

Apesar do nome, a empresa foi inscrita na Receita Federal tendo como atividade a fabricação e o envase de água mineral, o que não habilita a companhia a realizar extração e exportação de minério. Porém, em março deste ano, Barros entrou oficialmente no setor.

A RC6 Mineração passou a compor o quadro societário da Sulpar Mineração, empresa fundada em 31 de março, com sede no município de Marabá. A cidade paraense é marcada pela extração ilegal de manganês, além do desmatamento, do garimpo e da grilagem.

:: O caçador de jazidas: quem é o empresário que lidera a corrida pelo ouro em terras indígenas ::

Nos dados da Receita, a Sulpar tem como atividade econômica a extração de manganês e o comércio de minerais. Entre os sócios, está um empresário chamado Giovanni Ribeiro Amorim, dono de mineradoras no Pará e em Minas Gerais, e que atua na exportação de manganês ao exterior.

Brasil de Fato não localizou nenhuma solicitação realizada pela Sulpar, até o momento, para liberação de lavras e licenças junto à Agência Nacional de Mineração (ANM). A reportagem também não encontrou registros de nenhuma atividade pública da empresa até o momento.

:: Ricardo Barros faz ataques à CPI e Omar Aziz decide encerrar a sessão ::

Sócio de Barros explora entorno de áreas invadidas 

O novo parceiro comercial de Ricardo Barros no ramo da mineração, Giovanni Ribeiro Amorim, é o único proprietário da GR Amorin Minerais. A empresa declarou capital social de R$ 1,5 milhão e tem como atividade principal o apoio à extração de minerais metálicos não-ferrosos. 

Brasil de Fato identificou 12 requerimentos de mineração feitos pela GR Amorin Minerais à Agência Nacional da Mineração (ANM) entre 2018 e 2021. Todas as requisições são para explorar o subsolo de áreas próximas de Terras Indígenas (TIs) que sofrem escalada de conflitos e crimes ambientais, com forte presença de desmatadores, grileiros e garimpeiros. Além disso, parte das comunidades se recupera do impacto de grandes projetos de infraestrutura, como a usinas de Belo Monte e Tucuruí. 

Os projetos de mineração de Amorim estão no leste do Pará, nos municípios de Marabá, São Félix do Xingu, Novo Repartimento e Rio Bonito. As 12 requisições estão ativas e dez delas estão em tramitação avançada, com autorização de pesquisa já outorgada pela ANM. 

Os pedidos são para extração de manganês, ouro, cobre e ferro. Somados, eles abrangem 444,5 km², o equivalente a mais de cinco vezes a área da mina de Carajás, da Vale SA, também localizada no Pará, a maior mina de minério de ferro a céu aberto do mundo. 

Indígenas afetados 

Uma das áreas requeridas para exploração de ouro está a apenas 10 km da TI Trincheira Bacajá, habitada por quase 800 indígenas Mebêngôkre Kayapó, Mebêngôkre Kayapó Kararaô e Xikrin (Mebengôkre). 

A TI está em segundo lugar no ranking de áreas protegidas mais ameaçadas do país, segundo um estudo divulgado na última semana pelo MapBiomas. O levantamento classifica como ameaça casos de derrubada da floresta registrados em um raio de 10 km dos limites dos territórios.

No limite sul da Trincheira Bacajá está a TI Apyterewa, habitada por 800 integrantes do povo Parakanã, que estão em extrema vulnerabilidade. No dia 16 de maio, moradores denunciaram a invasão de grileiros. Montados em cavalos, eles teriam entrado em duas aldeias e aterrorizado os indígenas. A área está tomada por grileiros e passa por um processo de desintrusão desde 2011. 

Na Apyterewa, nem mesmo a presença da Força Nacional tem inibido os invasores. O desmatamento aumentou 28% entre 2020 e 2021 e há relatos de 22 km de estradas ilegais abertas no interior do território. Segundo o Mapbiomas, a TI foi a terceira do Brasil mais pressionada pelo desmatamento no primeiro trimestre deste ano.

Outra TI próxima aos projetos minerários da empresa é a TI Parakanã, habitada por mil indígenas. No final de abril, três caçadores não indígenas do município de Novo Repartimento (PA) foram encontrados mortos no interior da área protegida. A situação levou a uma onda de violência e ameaças contra os Awaeté-Parakanã. 

Relatos recebidos pelo Ministério Público Federal (MPF) indicam que moradores armados cruzaram os limites do território e promoveram ameaças. O povo iniciou contato com não indígenas há 40 anos e a maioria não fala português.

Segundo o Instituto Socioambiental, os Awaeté-Parakanã ainda se recuperam após terem sido deslocados compulsoriamente de seu território originário, em função da construção da hidrelétrica de Tucuruí.

Outro lado

Ricardo Barros foi procurado na manhã desta quinta-feira (19) para se posicionar sobre o assunto. O deputado atendeu ao telefone e se dispôs a ouvir os questionamentos da reportagem, mas a chamada foi encerrada de forma repentina após a descrição do tema a ser abordado.

A assessoria de imprensa e a equipe do gabinete do congressista também foram acionadas. Os profissionais se comprometeram a consultar Barros para a emissão de um posicionamento. Até o momento, não houve resposta. O espaço segue aberto para manifestações.

A reportagem também procurou, via e-mail, a GR Amorin Minerais e perguntou se os projetos de mineração preveem medidas compensatórias aos povos indígenas afetados pela exploração econômica no entorno de suas áreas. Até a publicação do texto, não houve retorno. Caso a resposta seja encaminhada, o texto será atualizado.   

Mineração em terras indígenas

Colocado sob regime de urgência na Câmara dos Deputados por requerimento de Barros em março, o projeto de lei que libera mineração e usinas hidrelétricas em terras indígenas está longe de ir para votação.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), havia anunciado que criaria um grupo de trabalho para analisar o texto, mas não há expectativa do colegiado sair do papel. A proposta, que é de autoria do governo, vinha sendo defendida e tratada como prioritária pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).

O Planalto e o Congresso, porém, foram surpreendidos com a repercussão negativa do projeto entre representantes do agronegócio e até da própria mineração. Ainda não há data para apreciação do tema.

Edição: Camila Salmazio

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

eleven − one =