Demolições e estabilização de encosta, melhorias para a mobilidade urbana e semáforos inteligentes, além de imóveis com valor histórico, foram inspecionados
Na PFDC
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) – órgão do Ministério Público Federal (MPF) – tem apoiado a atuação do grupo de trabalho do MPF que acompanha o Caso Braskem, em Alagoas. A convite das procuradoras da República que atuam no caso, o procurador federal dos Direitos do Cidadão, Carlos Alberto Vilhena, esteve no município para acompanhar as inspeções realizadas pelo MPF nas obras provenientes do acordo socioambiental com a empresa petroquímica Braskem e participação do Ministério Público do Estado de Alagoas.
Firmado em dezembro de 2020, o acordo trata, entre outros assuntos, dos danos sociourbanísticos causados pela exploração do sal-gema na capital alagoana, obras alvo da inspeção.
Em maio de 2019, a Braskem foi apontada pelo Serviço Geológico do Brasil (SGB/CPRM) como a causadora do afundamento do solo que atingiu parte de cinco bairros de Maceió, numa região densamente habitada, por causa da exploração do mineral realizada pela empresa petroquímica desde a década de 1970.
Recebido pelas procuradoras da República que compõem o Caso Braskem Júlia Cadete, Juliana Câmara e Roberta Bomfim, no MPF em Alagoas, o PFDC acompanhou obras em diversas frentes de trabalho, nos dias 15 e 16 de junho, nos bairros Pinheiro, Mutange e Bebedouro, em Maceió (AL).
Barreira do Mutange — A primeira parada se deu no alto da encosta do Mutange, onde todos os imóveis desocupados já foram demolidos. A encosta já era área de risco em razão da própria formação natural, mas o risco foi potencializado pelo processo de afundamento do solo, o que motivou a prioridade no seu tratamento. As obras têm por finalidade a estabilização da área e a ampliação da área verde da cidade, com conclusão prevista para dezembro de 2023.
Na visita, constatou-se que parte da encosta está passando por estabilização com obras de terraplanagem, construção do sistema de drenagem e plantio da cobertura vegetal.
Em seguida, os membros do MPF vistoriaram a encosta a partir de baixo, no trecho plano localizado na Avenida Major Cícero, de onde se verificou o avanço da obra de cobertura vegetal e que parte dela, durante a quadra chuvosa, está coberta por lonas para evitar riscos de deslizamentos.
Preenchimento de minas – Na visita à encosta, foi possível verificar à distância o trabalho de preenchimento de minas. Os engenheiros da Braskem revelaram que das quatro primeiras minas com indicação de preenchimento com areia, todas já foram preenchidas, sendo que a Agência Nacional de Mineração (ANM) teria atestado essa condição em três delas. Cinco outras que estavam em monitoramento receberam também a indicação de preenchimento com areia, sendo que três já estão em processo de preenchimento.
As ações para estabilização das cavidades vêm sendo cumpridas com o acompanhamento da ANM, tendo em vista que cada cavidade demanda intervenção técnica diferente. No total, são 35 minas que estão sendo monitoradas e em processo de preenchimento ou pressurização e tamponamento, com as atividades ocorrendo dentro do cronograma apresentado.
Mobilidade urbana — Além das intervenções visando à estabilização da encosta, o acordo socioambiental garantiu também recursos para que o Município de Maceió recebesse melhorias para a locomoção da população, por meio de obras estruturantes do eixo da mobilidade urbana.
Nesta vistoria, as procuradoras do MPF, acompanhadas do PFDC, visitaram as obras de ampliação da avenida Durval de Góis Monteiro, no bairro Tabuleiro do Martins, principal via urbana de trânsito. A conclusão total da obra entre a Facima e a Tupan, correspondente a 2 km com duas novas faixas, está prevista para até setembro de 2024. Ao todo, as obras desta avenida levarão duas novas faixas em um percurso de 6 km, que vão da Coagro ao viaduto da antiga Polícia Rodoviária Federal.
A adesão do município ao termo de acordo socioambiental, quanto ao eixo mobilidade urbana, ocorreu em 25 de fevereiro de 2022 e definiu medidas que seriam implantadas para a recomposição da mobilidade urbana, no valor de R$ 360 milhões.
A execução ocorre por empresas contratadas pela Braskem, sob a coordenação do município, para concretizar as medidas necessárias para implantação das obras visando à melhoria da mobilidade urbana da capital.
Semáforos inteligentes — As melhorias na mobilidade urbana passam pela implantação de novas tecnologias na semaforização das principais vias impactadas pelo deslocamento forçado das pessoas dos bairros atingidos pelo afundamento do solo, especialmente as avenidas Fernandes Lima e Durval de Góis Monteiro. As vias passarão a contar com 30 intersecções de semáforos inteligentes, desde o viaduto da antiga PRF, até a Praça do Centenário, alguns já em funcionamento.
Esses equipamentos também serão instalados nas proximidades do Bom Parto e no Bebedouro, diante do impacto sofrido pela região após a interdição de vias pelo risco gerado pelo afundamento do solo.
Para as procuradoras da República que acompanharam a vistoria, “ver a execução das obrigações assumidas se tornando concretas e visíveis, próximas de apresentar benefícios diretos à população maceioense, é muito importante. A construção do acordo foi muito difícil e fazê-lo acontecer também não é fácil, mas os resultados já começam a aparecer e a cada dia se mostrarão mais reais”.
Prédios históricos – Ao todo são 46 imóveis listados como de relevante valor histórico inseridos no Mapa de Risco da Defesa Civil e por isso passaram pelo processo de desocupação e compensação financeira. Uma vez sob a gestão da Braskem, esses imóveis estão em processo de preservação e não serão demolidos e nem descaracterizados. Serão recuperados e restaurados.
Apesar de a região afetada estar isolada e não ser adequada à circulação de pessoas e veículos, é consenso a importância de se preservar os prédios históricos por seu valor memorial e arquitetônico, como um espaço que conta parte da história da cidade de Maceió.
Assim, mesmo sem previsão de abertura dos espaços para a população, a PFDC concorda que a preservação da memória da cidade é inegociável e que todos os esforços devem ser investidos nesta frente sociourbanística.
Proteção – Entre as principais ações específicas que estão sendo destinadas para estes imóveis estão: vigilância 24 horas; proteção com tapumes e/ou telas para manter a integridade das construções; procedimento de escoramento de vigas para melhorar sustentação dos imóveis; e registro de alguns imóveis por escaneamento a laser, técnica que reproduz as construções e as transforma em réplicas digitais, com detalhamento da fachada e do seu interior, permitindo, assim, a preservação da memória dos bairros.
Também estão entre as medidas: barreira química em alguns dos imóveis históricos, também como medida de preservação, uma vez que prédios históricos fazem uso de madeira em sua estrutura e estão naturalmente mais vulneráveis à ação de pragas, especialmente o cupim. A barreira química protege os prédios históricos de agentes patogênicos que destroem madeira e fiação. Além disso, controle de pragas é realizado rotineiramente em todos os imóveis.
MPF e PFDC visitaram o Solar dos Nunes, o Colégio e a Capela Nossa Senhora do Bom Conselho, as Casas Gêmeas e uma casa histórica por trás da estação ferroviária do Flexal.
Solar dos Nunes – Localizado na praça Lucena Maranhão, bem no coração do bairro Bebedouro, o solar construído por Jacinto Nunes Leite é, possivelmente, da mesma época em que a região começou a ser ocupada. O imóvel é tratado pelo MPF com muita atenção, especialmente pelo seu evidente valor histórico apesar dos poucos registros oficiais existentes.
A construção antiga precisou de reparos estruturais, retelhamento, sustentação com vigas e novo madeiramento, tudo buscando recuperar traços originais do imóvel. O prédio possui como material original o barro e a madeira, e vem sofrendo com a ação do tempo.
A praça Lucena Maranhão e a Igreja Matriz Santo Antônio de Pádua também passarão por intervenções a fim de serem preservadas adequadamente, conforme garantido pelo acordo socioambiental. A praça, inclusive, é um relevante patrimônio cultural imaterial, que já foi palco de inúmeras manifestações culturais, e será preservada.
Outros Imóveis – Os prédios do Colégio e da Capela Nossa Senhora do Bom Conselho, originalmente foi um asilo de órfãs, como destacado no alto de sua fachada – com a inscrição (1877-1935) –, que imaginam terem sido órfãs de combatentes da Guerra do Paraguai (1864-1870). Os prédios estão recebendo intervenções pontuais de recuperação e preservação estrutural.
As Casas Gêmeas possuem realidades opostas. Enquanto uma foi preservada ao longo do tempo, mantendo características e formação originais, a outra foi desocupada em situação preocupante de descaracterização. No entanto, as intervenções realizadas já garantem segurança suficiente para que possa ser recuperada conforme sua arquitetura original, possuindo sua “irmã gêmea” como referência em preservação histórica.
Ao final, MPF e PFDC inspecionaram uma pequena casa no Flexal com traços históricos, mas com relatos impressionantes de situação de abandono e de risco de desabamento, cujas intervenções estruturantes puderam recuperar sua segurança, mantendo, dentro do possível, suas características arquitetônicas e históricas. Acredita-se que esta casa tenha sido construída por algum trabalhador da ferrovia, pois se destaca pelas características mais robustas em detalhes e enfeites, destoando das casas vizinhas. Mais recentemente, surgiram relatos de que no imóvel pode ter funcionado uma Casa de Terreiro, memória que precisa ser recuperada e preservada.
Fortalecimento institucional – A visita do procurador federal dos Direitos do Cidadão busca também o fortalecimento institucional da atuação das “colegas de Maceió”, como mencionou Vilhena. “Sempre que venho a Maceió acompanhar a atuação no Caso Braskem sinto-me muito satisfeito com tudo o que vejo e aprendo. A dedicação dessas procuradoras é exemplar e tudo o que foi conquistado impressiona”, comentou o subprocurador-geral.
O interesse da PFDC pelo acordo socioambiental reforça a compreensão que o MPF possui, em concordância com a Organização das Nações Unidas (ONU), de que o meio ambiente limpo, saudável e sustentável é um direito humano. “Quando a gente faz essa conexão com os direitos humanos, a gente vê como o meio ambiente, sadio e equilibrado, é fundamental para todo ser humano, desta e das futuras gerações”, comentou Vilhena.
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Foto: Marco Antonio/Secom Maceió