A demora tem provocado graves conflitos fundiários, violência e especulação imobiliária
O Ministério Público Federal (MPF) pediu à Justiça que determine ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e à Fundação Cultural Palmares (FCP) que concluam, no prazo máximo de dois anos, todos os processos de regularização fundiária quilombola atualmente pendentes no Amapá. Mais de 20 comunidades esperam a titulação de suas terras, algumas há mais de 15 anos. A ação judicial foi protocolada na última segunda-feira (8), após várias tentativas do MPF em solucionar a demanda de forma extrajudicial.
A ação é decorrente de processo em andamento no MPF que tem o objetivo acompanhar a transferência de terras públicas federais, pretendidas por comunidade quilombolas, ao Estado do Amapá. Decreto presidencial que trata da transferência das terras, editado em abril de 2016, estipulou prazo de 20 meses, encerrado no mês passado, para que o Incra concluísse os relatórios antropológicos nos processos de regularização fundiária das terras quilombolas de 29 comunidades espalhadas pelo Estado.
Em julho de 2017, o MPF apurou que apenas três das 29 comunidades elencadas no Decreto tiveram suas áreas regularizadas e seus títulos expedidos pelo Incra. Comunidades como Lagoa dos Índios e Rosa, em Macapá, esperam há 15 anos pela titulação de suas terras. Para o MPF, “a insegurança causada pela mora estatal em garantir os direitos territoriais das comunidades quilombolas, como se vê, resulta em graves conflitos fundiários, violência e especulação mobiliária”. A instituição enfatiza ainda o risco de desmantelamento dessas comunidades tradicionais, “já que não há como estas sobreviverem sem a terra que ocupam tradicionalmente, cuja necessidade é elementar à sua reprodução física, social, econômica e cultural”.
Se analisado de forma literal, ao fim do prazo dos 20 meses estipulado no Decreto, a competência de titulação das terras passaria ao Estado do Amapá, por meio do Instituto de Meio Ambiente e Ordenamento Territorial (Imap). Diante deste cenário, o MPF convocou, em junho de 2017, representantes do Governo do Estado do Amapá, do Imap, do Incra, da FCP, da Secretaria Extraordinária de Políticas Afrodescendentes (Seafro), da Secretaria Estadual de Cultura (Secult) e da Defensoria Pública do Estado do Amapá para apresentarem soluções conjuntas para regularizarão das terras quilombolas.
Plano de Trabalho
Após a reunião, Incra e Imap apresentaram o documento Plano de Trabalho – Regularização de Território Quilombola, datado de julho de 2017, abordando, além de outros itens, a atual situação dos processos no Incra e um cronograma de implementação das atividades. O relatório apresentou omissões que podem comprometer ainda mais o andamento dos processos de titulação, como a falta de medidas necessárias para solucionar a escassez de recursos humanos e operacionais no Imap, e a não participação da Seafro e da Secult no processo, conforme determina a legislação.
Para o MPF, é inquestionável que o Imap não está apto, no momento, a assumir sozinho o processo de regularização fundiária quilombola no Estado do Amapá, por falta de condições estruturais e de pessoal. Assim, faz-se necessário o auxílio técnico do Incra e da FCP, inclusive com a celebração de Termo de Cooperação Técnica entre Incra e Imap, como já discutido em tratativas extrajudiciais, sob pena de a política de regularização fundiária quilombola ser mantida na íntegra pelos entes públicos federais.
A estruturação permanente dos entes públicos estaduais responsáveis pela efetivação da propriedade coletiva quilombola é também um dos pedidos da ação. Incluindo a realização de concurso público para provimento de vagas para suprir a carência de pessoal especializado (antropólogos, engenheiros agrônomos, agrimensor, etc) e a compra de equipamentos necessários à realização do trabalho.
A ação judicial pede ainda que a União garanta o orçamento necessário para a execução das etapas do processo de regularização fundiária. Os valores serão definidos a partir de plano de trabalho elaborado pelo Incra, que contemple todas as despesas para a conclusão dos processos no prazo máximo de dois anos. Durante a execução, deverão ser priorizados os processos mais antigos em trâmite no órgão. No caso de repasse dos processos existentes no Incra ao Estado do Amapá, o Governo do Estado deverá ser o responsável pela garantia do orçamento e, ao lado do Imap, pelo respeito ao prazo fixado para conclusão dos procedimentos.
Assessoria de Comunicação Social
Ministério Público Federal no Amapá
–
Mãos quilombolas. Foto de João Zinclar