Em Minas, Justiça Federal obriga Incra a finalizar processo de reconhecimento de quilombo

Decisão foi obtida pelo MPF numa ação civil pública que foi ajuizada em 2009 devido à inércia da autarquia no procedimento de regularização fundiária da comunidade Mato do Tição

Ministério Público Federal em Minas Gerais

A Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC), órgão do Ministério Público Federal (MPF), obteve sentença que obriga o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a finalizar procedimento de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pela comunidade quilombola Mato do Tição.

O quilombo Mato do Tição ocupa uma área de cerca de três hectares, distante cerca de quatro quilômetros da sede do município de Jaboticatubas, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. No território, vivem 28 famílias, com cerca de 100 pessoas, que descendem de um mesmo tronco ancestral, os Siqueira. 

O quilombo teve início quando, após a abolição da escravatura, três ex-escravos, Constança, Pedro e Rita, receberam do proprietário da Fazenda de Baixo uma porção de terras onde passaram a habitar e onde proliferou o núcleo familiar. Há cerca de 50 anos, porém, fazendeiros começaram a invadir o local, reduzindo a área original do território. 

O Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (Cedefes) informa que já foi reconhecido usucapião em favor dos Siqueira em relação ao que sobrou da área, mas desde 2004, a comunidade aguarda a regularização fundiária de suas terras pelo Incra, órgão responsável, na esfera federal, pela titulação dos territórios quilombolas (Decreto 4.887, de 20 de novembro de 2003). 

Morosidade e ineficiência – Na sentença, o Juízo da 13ª Vara Federal de Belo Horizonte surpreende-se com o fato de o Incra nunca ter dado qualquer andamento ao processo administrativo para reconhecimento do quilombo, nem mesmo após o MPF ingressar em juízo para exigir do órgão o cumprimento das suas obrigações legais. 

Na ação, proposta em outubro de 2009, o Ministério Público Federal pedia que a Justiça interviesse exatamente porque o Incra não dera seguimento ao procedimento administrativo após sua instauração em 2004.

Pois a situação não mudou nos 10 anos seguintes ao ajuizamento da ação: o caso continuou literalmente parado, sem que fosse tomada qualquer medida para elaboração do Relatório Técnico de Identificação, Reconhecimento, Delimitação, Demarcação e Titulação (RTID) do território quilombola, que, por sua vez, depende da realização de prévios estudos antropológicos.

As justificativas do Incra também não mudaram ao longo dos anos, sempre baseadas na falta de recursos financeiros e humanos. Ocorre que, já na época do ajuizamento da ação, o MPF lembrou que o próprio Decreto 4.887/2003 autoriza a autarquia a realizar convênios, acordos, contratos ou outros instrumentos semelhantes para a realização de tais estudos.

Mas, embora a ação judicial tenha sido suspensa por inúmeras vezes ao longo dos últimos nove anos para que o Incra tomasse as providências que lhe competiam, o processo administrativo da comunidade Mata do Tição encontra-se paralisado até hoje (agosto de 2019), estando inclusive, como ressalta a decisão, “na mesma fase da época do ajuizamento da presente ação civil pública”.

Para o Juízo Federal, a demora de 15 anos não se sustenta em nenhuma justificativa, seja a de se tratar de processo moroso ou complexo, seja a da falta de recursos financeiros, demonstrando somente “ineficiência e injustificada morosidade administrativa na concretização de direitos fundamentais”. 

A sentença determinou que o Incra finalize o RTID da Comunidade Mato do Tição no prazo máximo de seis meses, sob pena de multa diária de R$ 1 mil em caso de descumprimento da ordem judicial.

Íntegra da decisão
(ACP nº 0017633-56.2010.4.01.3800)

Fonte: Google Maps

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