Por Beni Carvalho/ CPT Bahia
A mineração foi definida pelo Ministério das Minas e Energia como setor essencial durante a pandemia do novo coronavírus e, assim, as suas operações foram classificadas como indispensáveis neste momento. De forma indiscriminada e unilateral, o Governo Federal atendendo às reivindicações do capital mineral e sua cadeia produtiva põe em risco milhões de pessoas em todo o Brasil, desde trabalhadores/as do setor às comunidades localizadas em territórios minerados. É o caso, por exemplo, da comunidade Curral Velho, localizada no município baiano de Caetité. No local, os/as moradores/as não conseguem cumprir o isolamento social pois são obrigados a saírem de suas casas durante explosões e detonações.
Na Bahia, a mineração segue funcionando a todo vapor, atentando contra a vida do povo. Uma das situações mais emblemáticas envolve a construção da Ferrovia de Integração Oeste Leste (Fiol). A obra abarca um trecho de 1.527 quilômetros, com variações diversas quanto à sua condição. Assim como existem trechos praticamente finalizados, há muitos sem qualquer procedimento iniciado. A obra, que já se aproxima de uma década, iniciou em 2011 com financiamento público e não tem previsões de conclusão. A FIOL pretende ligar Figueirópolis, no Tocantins, a Ilhéus, na Bahia, onde será construído o Porto Sul, principal destino dos produtos ligados ao setor do agronegócio e, em especial, o minério do Projeto da Bahia Mineração, localizado em Caetité.
Apesar das incertezas sobre a sua conclusão e a presença de diversos trechos sem serviço ou inacabados, uma parte do trecho do Lote 5, em Caetité, segue operando, contrariando as orientações da Organização Mundial de Saúde (OMS) para este momento de pandemia e provocando transtornos para os trabalhadores/as e moradores/as no entorno.
As obras de uma parte do Lote 5 não pararam, mantendo diversos trabalhadores em situação de risco neste momento. Como agravante, temos a situação da comunidade de Curral Velho, que está sendo cortada ao meio pela construção do trecho da ferrovia. A comunidade desde 2014 vem fazendo diversas denúncias contra os abusos e violações cometidos contra a população pelos consórcios e a Valec Engenharia, Construções e Ferrovias S/A. A principal queixa da comunidade é o uso de explosivos e a realização de detonações que provocam danificações diversas nas casas e instalações dos moradores.
Segundo o morador Alex de Brito Oliveira, em vídeo no canal do Youtube MMC Brasil Noticias, um dos impactos mais profundos é a interferência na prática da agricultura, principal fonte de renda da comunidade, porque a obra conduz paralisação e alteração da produção. Além disso, a rotina da comunidade foi transformada profundamente. Sendo que nos primeiros momentos, as explosões eram feitas sem avisos prévios e garantia de segurança à comunidade.
O agravamento da situação conduziu a comunidade a fazer denúncias ao Ministério Público Federal (MPF) desde o ano de 2014. Entre as medidas imposta pelo MPF ao consórcio responsável pelo trecho da obra em 2015, estavam a necessidade de avisos prévios, molhagem das estradas e garantias mínimas de seguranças. No entanto, permaneceu o transtorno contra a comunidade, como por exemplo, retirar as famílias das suas casas, sujeitando em especial os mais velhos a deslocamentos e perturbações de todos os tipos para um local distante da zona de realização das explosões. Interferindo no direito de ir e vir da comunidade, assim como modificando todas as relações cotidianas.
Mais recentemente, uma decisão judicial, de ação de interdito proibitório, deferida pelo juiz federal Felipe Aquino Pessoa de Oliveira de Guanambi (BA), do dia 19 de dezembro de 2019, garantiu a continuidade da obra pelo atual Consórcio Fiol Lote 5, formado pelas empresas BTEC Construções S.A (antiga Pavotec) e LCM Construções e Comércio, mesmo que as famílias sigam até o momento sem nenhum direito garantido no que tange às reivindicações desde 2014. A decisão também impõe ação de criminalização às famílias que tentarem manifestar contra a continuidade da obra.
É diante este contexto adverso que se encontra a comunidade de Curral Velho, que em meio a um momento de pandemia, na qual a principal medida para garantir a vida, o isolamento social, não pode ser cumprida integralmente pela comunidade. O Consórcio Fiol e a VALEC não cumprem as orientações dos órgãos de Saúde e colocam as famílias em risco, quando as retiram de suas casas, ou seja, rompendo o isolamento social e provocando aglomerações para garantir que a empresa faça detonações e continue o seu serviço. É comum até o uso de força policial para garantia da operação do trecho, coagindo a comunidade de denunciar e se mobilizar contra as violações do projeto.
Os fatos explicitam as contradições e violências produzidas pela mineração, indistintamente seja qual for a parte da sua cadeia produtiva. A comunidade de Curral Velho que há muito tempo vem tendo seus direitos dilapidados, tem como agravante neste momento, um ataque sobre direto a vida, quando prevalece os interesses da mineração. Neste caso, a continuidade da Fiol impede o cumprimento por parte dos trabalhadores/as e da comunidade a respeito da medida fundamental de garantia da vida, o isolamento social.
Edição: Comunicação CPT Bahia
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Foto: Divulgação