Governo passa à transição a última taxa do desmate na Amazônia, mas não divulga na COP-27

Com relatório pronto, governo Bolsonaro esconde pela segunda vez em dois anos a taxa anual do desmatamento na Amazônia

Por Rubens Valente, Agência Pública

Pela segunda vez em dois anos, o governo de Jair Bolsonaro esconde a taxa anual do desmatamento na Amazônia. A Agência Pública apurou que o relatório está pronto e, em resposta a um pedido por escrito do vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, já foi entregue pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) à equipe de transição do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O INPE já repassou o mesmo documento ao seu órgão superior, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações.

A Pública também apurou que a taxa, um segredo guardado a sete chaves até o momento, deverá indicar uma leve redução em relação ao ano passado. Se confirmada, trata-se de uma má notícia para o governo Bolsonaro, pois indicaria que o desmatamento seguiu em um alto patamar durante todos .os quatros anos da gestão bolsonarista.

A taxa saiu de 7,5 mil quilômetros quadrados destruídos em 2018 (já maior que a de 2017) para 10,1 mil em 2019, 10,8 mil em 2020 e 13,2 mil em 2021 (a taxa sempre compreende o período de agosto do ano anterior a julho do ano corrente). O número de 2021 foi o mais alto desde 2008, quando o país já registrava uma drástica redução na taxa como resultado de uma série de políticas públicas e reforço da ação dos órgãos de fiscalização e controle na Amazônia realizados pelos dois governos de Lula (2003-2010).

Uma possível leve redução em 2021, se de fato confirmada, pouco mudará a certeza da destruição registrada pelo Brasil nos últimos quatro anos. Isso talvez explique a decisão do governo de retardar a divulgação do número para não coincidir com a COP-27, a conferência mundial do clima que se realiza no Egito com a presença de Lula.

É a segunda vez que o governo Bolsonaro retarda a divulgação do número mesmo já tendo o resultado à sua disposição. A taxa de 2021 (relativa ao período de agosto de 2020 a julho de 2021) foi divulgada há quase um ano, em 18 de novembro, mas somente seis dias depois do fim da COP-26, realizada naquele ano na Escócia. A nota oficial remetida pelo INPE ao então ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, com os dados do desmatamento foi datada de 27 de outubro de 2021, quatro dias antes do início daquela COP e 21 dias antes da divulgação feita pelo governo.

Em 2021, a divulgação só ocorreu depois de denúncias feitas publicamente pelo SindCT (Sindicato Nacional dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial). Em carta aberta, a entidade afirmou que era “pura mentira” que o relatório anual do desmatamento ainda não estivesse pronto. Nesta semana, novamente o SindCT afirmou, em nota pública, que “mais uma vez, o governo recebeu as informações e insistiu no erro de tentar escondê-las, como se, ao não divulgar os dados, fosse possível encobrir a destruição que as imagens de satélite escancaram para o mundo todo”.

A taxa anual de desmatamento é apurada pelo INPE por meio do PRODES (Projeto de Monitoramento do Desmatamento da Amazônia Legal por Satélite). A divulgação ocorre em duas etapas: estimativa e consolidada. Antes de Bolsonaro tomar posse na Presidência, em 2019, a estimativa costumava sair antes ou durante as COPs, num gesto de transparência do Brasil. Isso permitia que a taxa fosse discutida abertamente ainda durante a conferência do clima. A diferença entre a estimativa e a consolidada costuma ser mínima e nunca passou de 4%, segundo técnicos do INPE.

Para chegar à taxa, os técnicos do INPE analisam imagens de satélite escolhidas por uma série de critérios, incluindo os municípios considerados prioritários no tema do desmatamento.

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